“Der heimliche Aufmarsch” [A mobilização secreta] é uma antiga música revolucionária socialista da República de Weimar. Ela convoca os operários e camponeses a se armarem, se levantarem e destruírem o sistema.
Constituição socialista
Trinta anos mais tarde, uma versão modificada da música foi relançada na Alemanha Oriental. Ela foi rebatizada de “Der offene Aufmarsch” [A mobilização explícita] para expressar o fato de que não havia mais nenhuma necessidade de manter segredo. Os operários e camponeses já tinha se levantado (com uma ajudinha de seus camaradas soviéticos) e a classe trabalhadora como um todo agora estava coletivamente no comando. Essa, ao menos, era a narrativa oficial, codificada na constituição da Alemanha Oriental.
A República Democrática Alemã é um estado socialista de operários e camponeses. É a organização política dos trabalhadores nas cidades e no campo, sob a liderança da classe trabalhadora.
Você não precisa ser socialista para “entender” visceralmente o apelo de canções como “Der heimliche Aufmarsch”. Ela “pega”, ela mexe com você, ela está cheia de uma fúria virtuosa.
Na versão da Alemanha Oriental, contudo, boa parte dessa energia desaparece. A versão original é revolucionária; a nova versão é fundamentalmente conservadora. Ninguém mais implora para que os operários e camponeses se rebelem, e sim que se submetam, cumpram seus deveres e defendam o status quo.
Na antiga versão, ouve-se:
Então das ruínas
Da velha ordem surgirá
A República Mundial Socialista
Enquanto na nova se ouve simplesmente:
Hoje, o socialismo é uma potência mundial
Mas por que estou falando disso?
Experiências socialistas
Isso tudo tem a ver com algumas das reações ao meu livro Socialism: The Failed Idea That Never Dies [Socialismo: a ideia fracassada que nunca morre, em tradução livre, sem edição em português]. O livro mostra como os intelectuais do Ocidente desenvolveram o hábito de elogiar as experiências socialistas enquanto elas estavam no auge, só para reprová-las mais tarde, dizendo que essas experiências nunca foram “socialistas de verdade”. Uma das reações mais comuns que tenho recebido é assim:
Mas você pode dizer exatamente a mesma coisa sobre o capitalismo! Por acaso seu próximo livro vai se chamar “Capitalismo: a ideia fracassada que nunca morre”?
Isso me lembra um pouco das brigas de parquinho, quando as crianças, ainda sem ter desenvolvido completamente as habilidades verbais, geralmente respondem às provocações retrucando: “Não, você é que é!”
Isso, claro, só funciona quando se trata do roto falando do esfarrapado, isto é, quando seu oponente é na verdade culpado da mesma coisa da qual o acusa. Mas este não é o caso aqui. É impossível dizer o mesmo sobre o capitalismo. Mostre-me exemplos de liberais defensores do livre mercado agindo da mesma forma que os intelectuais socialistas que menciono no livro. Cite um país que os defensores do livre mercado usaram como exemplo e que agora desprezam como se ele não fosse “o capitalismo de verdade”.
Você não vai conseguir. Porque isso não acontece.
A história econômica dos países
Bem ao contrário. Recentemente, reli umas passagens do livro Livre para Escolher, de Milton Friedman, publicado em 1980. Em termos de lugares que Friedman menciona como exemplos positivos, fiquei impressionado com a quantidade de mudanças. Friedman era muito otimista quanto à economia de Hong Kong e, um pouco menos, quanto aos demais “Tigres Asiáticos” com Taiwan e Singapura. Ele descrevia a Suíça como “um bastião do capitalismo”.
Ele demonstrava um otimismo cauteloso quando à então Primeira Ministra do Reino Unido, Margaret Thatcher, que mudaria o país para melhor. Ele não menciona o Chile no livro, talvez sabendo que qualquer afirmação positiva sobre a economia chilena seria interpretada como um apoio à ditadura Pinochet. Mas sabemos, por coisas que ele disse ao redor do mundo na época, que ele também era otimista quanto ao futuro da economia do Chile.
Isso foi há quatro décadas. Se você perguntar a um defensor do livre mercado de hoje o nome de uma economia capitalista de sucesso, que exemplos ele lhe daria? Ora, mais ou menos os mesmos que Friedman citou em 1980. A Suíça provavelmente seria citada. Com certeza Hong Kong e Singapura também, e Taiwan talvez aparecesse discretamente na lista. A pessoa talvez mencionasse o sucesso relativo do Chile. Ela talvez desconfie um pouco da situação do Reino Unido hoje em dia, mas certamente consideraria o Reino Unido pós-Thatcher muito melhor do que o Reino Unido pré-Thatcher. E provavelmente mencionaria que a Nova Zelândia está se recuperando depois das reformas liberais dos anos 1980.
Em resumo, os defensores do livre mercado são coerentes a ponto de serem chatos. Se existe um modelo econômico que elogiamos há quarenta anos, é grande a chance de ainda o estarmos elogiando hoje em dia e, se existe um modelo econômico que estamos elogiando hoje, é grande a chance de ainda o estarmos elogiando daqui a quarenta anos. Isso é o contrário da esperança utópica socialista que descrevo no livro.
Os socialistas buscam novidades. Eles têm de agir assim porque as experiências socialistas nunca envelhecem bem. É muito fácil se tornar socialista. Mas, se você pretende continuar assim por muito tempo, precisa ter a capacidade de abandonar e se esquecer seletivamente das experiências socialistas depois que elas azedam, e partir tranquilamente para a próxima. Você precisa ser capaz de tirar as esperanças que depositou no mais recente fracasso socialista e depositá-las no próximo.
Crenças abstratas e vagas
Os socialistas adoram descrever seus projetos usando termos abstratos e difusos. Por isso é que os movimentos socialistas mais populares são sempre aqueles que estão em ascensão, mas ainda não no poder, ou aqueles que chegaram ao poder recentemente, mas que não puderam agir ainda, então tudo ainda está em andamento. O pior é quando os socialistas têm de responder a perguntas mundanas, quando eles têm de explicar, em termos mais tangíveis, como um sistema baseado em seus ideais tão elevados daria certo na prática.
Os regimes socialistas atualmente existentes, claro, têm de fazer isso em algum momento, mas, como isso não é possível, eles nunca mantêm o entusiasmo por muito tempo. O supramencionado contraste entre “Der heimliche Aufmarsch” e “Der offene Aufmarsch" é um bom exemplo. O regime da Alemanha Oriental evidentemente tentou, sem sucesso, extrair, engarrafar e armazenar a energia contida nas antigas canções revolucionárias.
Mas o socialismo precisa da emoção da novidade, da empolgação da destruição, do furor de derrubar uma ordem estabelecida e erguer outra no lugar. Isso deixa de funcionar depois que o socialismo se torna a ordem estabelecida, depois que fica claro que a nova ordem não cumpriu as expectativas e depois que você percebe que nada vai melhorar.
Os liberais não têm esse problema. Os modelos econômicos que defendemos geralmente cumprem o que prometem ou, no mínimo, ficam na média. Por isso podemos elogiar os mesmos modelos por décadas. E não estamos à procura de empolgação, novidade ou da adrenalina das ideias políticas.
©2019 Foundation for Economic Education. Publicado com permissão. Original em inglês
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