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Por que os psiquiatras não podem impedir os assassinatos em massa

Mesmo que eliminássemos todos os males psiquiátricos da população, o índice de criminalidade cairia apenas quatro por cento | Pixabay
Mesmo que eliminássemos todos os males psiquiátricos da população, o índice de criminalidade cairia apenas quatro por cento (Foto: Pixabay)

Uma das consequências do massacre de Las Vegas é que o governo, mais uma vez, está promovendo a ideia politicamente eficiente de que um serviço de saúde mental melhor acabaria com tais atrocidades. Paul D. Ryan, o presidente do Congresso, chegou a afirmar, na semana passada, que "a reforma da saúde mental é ingrediente básico para que possamos evitar e impedir que essas coisas voltem a ocorrer como no passado".

O público parece compartilhar dessa mesma ideia: uma pesquisa de 2015 descobriu que 63 por cento dos norte-americanos achavam que um serviço deficiente de saúde mental, e não de controle de armas, era responsável por tais massacres.

É verdade que muitos dos responsáveis por essas chacinas têm problemas mentais, geralmente um transtorno grave de personalidade ou uma doença psicótica, mas tal fato, na prática, não tem nada a ver com um possível impedimento do ato em si.

Por quê? Primeiro que a grande maioria desses assassinos evita o sistema de saúde. Sua intenção é matar gente e não procurar ajuda, e geralmente não se consideram psiquiatricamente doentes. Dos responsáveis pelas 92 chacinas documentadas entre 1982 e 2017, somente quinze por cento tinham tido algum contato anterior com profissionais da área.

É óbvio que qualquer avaliação ou tratamento por que esse pequeno número dos autores passou não os impediu de cometer atrocidades. E mesmo que todos tivessem sido atendidos, é pouco provável que os crimes pudessem ter sido evitados porque, de forma geral, é muito difícil, se não impossível, prever quem adotará um comportamento violento.

Stephen Paddock, o atirador de Las Vegas, é um bom exemplo disso. Com 64 anos, jogador inveterado e bem de vida, sem ficha criminal, ele tinha pouco em comum com o típico assassino em massa, que tende a ser o jovem revoltado, cheio de ressentimento, com um histórico de explosões violentas. Uma busca minuciosa em sua vida para explicar o motivo de tamanha barbárie até agora deu em nada. Seu irmão, Eric, comentou que Stephen era "o menos violento da família durante a infância". Não tenho dúvida de que, se Stephen Paddock tivesse visto um psiquiatra, não teria levantando nenhuma suspeita de perigo.

Em outras palavras, grande parte dos responsáveis por massacres é composta de homens brancos, paranoicos, revoltados e donos de armas, mas, por outro lado, é fato também que uma parcela mínima desse grupo demográfico comete esse tipo de crime.

Além disso, os doentes mentais contribuem muito pouco para a violência generalizada do país. Mesmo que eliminássemos todos os males psiquiátricos da população, o índice de criminalidade cairia apenas quatro por cento. (A "contribuição" dos assassinos em massa é ainda menor: em 2015, eles corresponderam por apenas 0,35 por cento dos homicídios com armas.)

A realidade preocupante é que a imensa maioria dos crimes violentos é cometida por gente saudável, portadora de armas, tomada pelas emoções do dia a dia – e é exatamente nisso que os políticos não querem que o país pense.

De qualquer forma, mesmo que não seja possível prever a violência humana, há muito que podemos fazer para modificar ou conter sua expressão. Por exemplo, pense no sucesso do uso de barreiras físicas simples para a prevenção do suicídio. Uma meta-análise de 2015 mostrou que a instalação de redes de segurança sob "pontos críticos", como a ponte Golden Gate, em San Francisco, é altamente eficiente na redução dos riscos – e fez o índice de suicídios cair de uma média de 5,8/ano para 2,4. Curioso é que, na maioria dos casos, não houve aumento no número de mortes em outros locais de risco, ou seja, eliminar um meio de autocídio não resultou na substituição de alternativas.

O mesmo parece valer para o homicídio: países que limitam o acesso a armas de fogo registram uma fração dos índices de mortes por esse meio nos EUA. A Austrália, por exemplo, que proibiu o porte depois de um massacre ocorrido em 1996, viu o número de homicídios cair pela metade e estacionar. Em 2012, o número de mortes por arma de fogo nos EUA foi de 29,7/milhão; na Austrália, 1,4/milhão.

Ao contrário do que muitos defensores de armas alegam, quem perde o porte de arma não encontra um meio alternativo de ferir a si mesmos e aos outros. Nos países em que há um controle razoável, por exemplo, não há uma epidemia compensatória de ataques à faca.

Então vamos parar de fingir que podemos identificar os assassinos em massa de antemão. O que podemos fazer em relação a eles – e o resto da população – é acabar com o acesso às armas que transformam seus impulsos em chacinas.

*Richard A. Friedman é professor de Psiquiatria Clínica, diretor da Psicofarmacologia Clínica da Faculdade de Medicina Weill Cornell e contribui com a coluna de opinião.

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"O que os vincula e que eleva sua probabilidade de matar dessa maneira em especial não é qualquer conjunto particular de crenças, mas um histórico de comportamento antissocial, às vezes violento."

Publicado por Ideias em Segunda, 2 de outubro de 2017

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