Cena de “Rust”, com Alec Baldwin: tragédia nos bastidores chocou a indústria do cinema.| Foto: Divulgação/Calvary Media
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A professora de Harvard Amy C. Edmondson é considerada uma especialista em "segurança psicológica". Famosa nos EUA por suas palestras e artigos, ela ajuda empresas e instituições a previnir erros, reduzir riscos e tirar lições dos fracassos.

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No livro O Jeito Certo de Errar: Como as Falhas nos Ensinam a Prosperar (editora Intrínseca), Amy defende a ideia de que existem três tipos de falhas: básicas, complexas e inteligentes.

Para explicar cada uma delas, e mostrar como é possível aplicar esse conhecimento no dia a dia, a autora usa exemplos da História, do mundo corporativo e até da cultura pop — como no trecho a seguir, em que cita o trágico episódio ocorrido nos bastidores do filme "Rust" e que envolveu o ator Alec Baldwin.

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O reflexo de culpar alguém, de atribuir a culpa a um único indivíduo ou causa, é quase universal. Infelizmente, isso reduz a segurança psicológica necessária para praticar a ciência de falhar bem.

Os CEOs são demitidos quando uma empresa apresenta um desempenho fraco. Os cônjuges se culpam quando um deles se atrasa para buscar o fi ho na creche. As crianças costumam apontar o dedo para outra pessoa ou local para escapar da culpa.

É fácil e natural procurar causas e culpados únicos, mas, no caso de falhas complexas, esse instinto não é apenas inútil como também impreciso. E isso dificulta falar de forma aberta e lógica sobre o que de fato aconteceu e como ter um desempenho melhor da próxima vez.

Mais tarde, falarei sobre abordagens para reduzir a falha complexa, mas, por enquanto, quero enfatizar que um ambiente psicologicamente seguro, em que as pessoas saibam que não serão culpadas por erros ou resultados decepcionantes, é a base que permite a organizações e famílias experimentarem menos o jeito errado de falhar e mais o jeito certo.

Mas e a responsabilidade? Essa é a pergunta que executivos de setores dos mais variados, como hospitais e bancos de investimento, me fazem. Os indivíduos devem enfrentar as consequências das falhas para evitar uma cultura frouxa em excesso?

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Se as pessoas não recebem a culpa por suas falhas, como elas podem buscar motivos para melhorar? Essa preocupação é baseada em uma falsa dicotomia.

Na verdade, uma cultura que cria um espaço seguro para se admitir a falha pode (e em ambientes de alto risco deve) coexistir com padrões de alto desempenho. Uma cultura de culpa serve, em especial, para garantir que as pessoas não discutam sobre os problemas a tempo de corrigi-los, o que é óbvio que não ajuda no desempenho.

É por isso que os relatos sem punição são tão valiosos. Como veremos, o relato rápido e espontâneo de anomalias é vital para um alto desempenho em qualquer contexto dinâmico.

Embora as falhas básicas às vezes sejam devastadoras, as falhas complexas são os verdadeiros monstros que pairam sobre nossa vida, nossas instituições e sociedades. Ainda que as falhas básicas apresentem problemas razoavelmente solucionáveis com causas únicas, as complexas têm um arquétipo diferente.

Elas predominam em ambientes como salas de emergência de hospitais e cadeias globais de suprimento porque vários fatores e pessoas interagem de maneiras um tanto imprevisíveis.

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Sistemas climáticos cada vez mais voláteis são outro terreno fértil para falhas complexas. Após anos de estudo acerca das falhas complexas nas áreas aeroespacial, de saúde e de negócios, reuni um conjunto de exemplos notavelmente diferentes que, no entanto, compartilham características comuns.

Acima de tudo, eles apresentam mais de uma causa. Falhas complexas acontecem em ambientes habituais, o que as distingue das inteligentes. Apesar de serem familiares, essas configurações apresentam um grau de complexidade em que vários fatores podem interagir de maneiras inesperadas.

Em geral, falhas complexas são precedidas por sinais de alerta sutis. Por fim, muitas vezes incluem pelo menos um fator externo que parece incontrolável.

Falhas complexas muitas vezes acontecem por excesso de confiança

Ao contrário das falhas inteligentes, que ocorrem em um território novo — como escolher ingredientes que nunca foram combinados para inovar na cozinha, namorar na intenção de encontrar um parceiro para a vida ou conduzir experimentos acústicos que resultam em um microfone de eletreto que muda a história —, as falhas complexas ocorrem em ambientes onde é possível encontrar muita experiência e conhecimento prévios.

Um evento social, uma viagem de férias ou um semestre na escola são exemplos de situações familiares em que todos nós podemos ter experimentado uma ou duas falhas complexas. Acidentes, tragédias e desastres que aparecem nos noticiários diários são, em sua maioria, falhas complexas em ambientes razoavelmente familiares.

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Considere o filme "Rust", ambientado no Novo México, em que a cineasta Halyna Hutchins morreu ao ser atingida por um disparo de arma de fogo em 21 de outubro de 2021.

O rancho Bonanza Creek já havia sido usado por outros cineastas, e a equipe, que já trabalhava por lá havia alguns dias, conhecia um pouco o local. Todos na produção estavam familiarizados em certa dimensão com as precauções e os processos necessários que a indústria cinematográfica havia estabelecido para rodar um filme que usasse armas de fogo.

No entanto, o ator e produtor Alec Baldwin portava uma arma que disparou por acidente a bala fatal. O diretor Joel Souza, que estava parado ao lado de Hutchins, sofreu um ferimento no ombro. Foi uma trágica falha complexa.

Na investigação que se seguiu ficou evidente que os procedimentos de segurança estabelecidos para o manuseio de armas de fogo no set não haviam sido seguidos com muito rigor.

A armeira Hannah Gutierrez-Reed, de 24 anos, encarregada de supervisionar a segurança e o uso de armas no set, disse aos investigadores que, mais cedo, no dia do acidente, ela seguiu o protocolo e verificou se a munição destinada para a fi magem das cenas naquele dia incluía apenas “balas fictícias”, e não verdadeiras.

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No entanto, o diretor=assistente David Halls, a última pessoa a inspecionar a arma por questões de segurança antes de entregá-la a Baldwin e anunciar que estava “fria”, ou seja, sem munição, disse aos investigadores que havia cometido um erro ao não verificar todas as etapas naquele dia — uma grande violação do protocolo de segurança.

Além do mais, para começar, não estava evidente como a munição verdadeira, em geral proibida em um set de filmagem, foi parar no local. Para piorar, uma semana antes, o “disparo acidental” ocorreu duas vezes sem levar a uma inspeção mais minuciosa das práticas de segurança no set de filmagem.

É essa familiaridade que torna as falhas complexas tão perniciosas. Em situações com as quais estamos familiarizados, nos sentimos mais no controle do que de fato estamos, como ao dirigir de volta para casa (situação conhecida), apesar de ter consumido bebida alcoólica em uma festa, o que facilita ter uma falsa sensação de confiança.

Tenho certeza de que você consegue pensar em exemplos da sua vida em que isso tenha acontecido. Talvez tenha ficado confiante demais na sua capacidade de liderar um projeto em equipe, já que fi era isso muitas vezes antes, e se viu cercado de desaf os inesperados cuja difi culdade você subestimou.

Talvez você ou alguém que conheça se sentisse em alguma escala imune à Covid-19 devido a precauções que pareciam adequadas, mas depois acabou infectado. De forma mais geral, quando pensar “Consigo fazer isso de olhos fechados”, cuidado! O excesso de confiança é um precursor da falha complexa, assim como da falha básica.

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Infográficos Gazeta do Povo[Clique para ampliar]