Diversas celebridades protestaram em apoio ao ator Fábio Assunção, cuja dependência química e estado de embriaguez registrado em diversas oportunidades se tornaram motivo de piadas neste carnaval. Assim, inúmeros foliões tem usado máscaras com o rosto do ator, simbolizando um comportamento festeiro típico da época.
Entre os artistas e personalidades que se manifestaram constam Clarice Falcão, Klebber Toledo, Marcelo Serrado, Mariana Rios, Paulo Vilhena, Tata Werneck e Walter Casagrande. Eles recriminaram aqueles que estão usando os adereços. Entre os trechos levantados por eles, constam frases como “chega de rirmos da dor alheia", “desrespeito”, “falta de compaixão”, “crueldade”, e “dependência química não é piada, é um problema sério".
Ninguém nega que o uso de entorpecentes e o vício em álcool são temas graves. Desde 1967, a Organização Mundial da Saúde considera o alcoolismo uma doença, recomendando, inclusive, que as autoridades tratem o assunto como questão de saúde pública.
O ponto que se coloca aqui é que celebridades e a postura politicamente correta não representam as pessoas de fato, aquelas que estão se divertindo com as máscaras de Assunção.
O ator americano Groucho Marx resumia o humor com uma fórmula simples: tragédia + tempo = comédia. Isso porque é comum que acontecimentos trágicos se tornem engraçados quando analisados tempos depois. O segredo — e o papel do comediante — é adiantar-se: tornar a tragédia imediatamente risível. Paralelo a isso, em “O Rouxinol e a Rosa”, o escritor britânico Oscar Wilde destacou a importância do humor ao tratar de questões difíceis e complexas que cercam a vida de todos.
As justificativas mais comuns para as tentativas de restrição à liberdade de expressão se baseiam em “evitar discursos de ódio” e “com certos assuntos sérios não se brinca”. Contudo, vale lembrar que a abolição da escravatura já foi enquadrada como discurso de ódio. Falar em voto feminino era quase proibido. Parece impensável que esses temas já tenham sido objetos de tabu um dia, mas por muito tempo nem sequer poderiam ser abordados. Ao possibilitar liberdade de expressão e arte sobre todos os temas, esses assuntos não são banalizados, pelo contrário: dá-se o ensejo de falar sobre eles e conhecê-los.
Outro ponto é que a melindra dos artistas contrasta com o fato de que ao rir de algo você se torna superior a esse algo. Se você ri da dor, é porque ela não te atinge mais. Quando você ri de um defeito seu, é porque você é superior a ele. Quem quer silenciar determinados assuntos esconde, por detrás das alegadas boas intenções, uma veia autoritária — e o humor brinca, inclusive, com os autoritários.
Nada disso significa que não devemos nos compadecer por Fábio Assunção, seu drama e luta diária a fim de manter-se sóbrio. Apenas que o repúdio dos artistas, querendo coibir a prática, é descabido. Afinal, qualquer piada sempre pode ofender alguém. A comédia sempre possui um alvo. As celebridades se equivocam ao querer limitarem o objeto de piada, que é uma forma de arte. Como bem resumiu Paulo Polzonoff Jr., o ser humano ri de tudo. No Iraque, comediantes arriscam a vida para fazer piadas com as decapitações do ISIS; na Libéria comediantes tiram sarro de quem pegou Ebola.
A arte trabalha com tudo. O ator, por exemplo, já foi objeto de música interpretada por Gabriel Bartz e Bruno Magnata, denominada “Modo Fábio Assunção” cuja letra aborda sobre o desejo de virar a noite inteira festejando e aproveitando a vida.
O humor existe porque o mundo é recheado de conflitos e diferenças; e é bom que seja assim, pois nada é mais tedioso que uma vida previsível. Como todo bom brasileiro, aproveitarei a folia no modo Fábio Assunção, e meus pêsames a quem preferir ficar em casa politizando isso.