• Carregando...
Pais e filhos
A ideologia de gênero tira o direito dos pais de buscarem o melhor para seus filhos| Foto: BigStock

Ahmed é um imigrante paquistanês, um muçulmano fiel e, até recentemente, um consultor financeiro do setor de alta tecnologia de Seattle. Mas, quando ele me procurou por telefone em outubro de 2020, era apenas mais um pai assustado. Dias antes, ele e sua esposa internaram seu filho de 16 anos no Hospital Infantil de Seattle por causa de uma ameaça ​​grave de suicídio. Agora, Ahmed temia que os jalecos brancos que gentilmente haviam cuidado de seu filho se recusassem a devolvê-lo.

“Eles nos enviaram um e-mail, sabe,‘você deveria levar sua ‘filha’ para a clínica de gênero’”, ele me contou.

A princípio, Ahmed (mudei o nome dos personagens neste ensaio para proteger a identidade das crianças) imaginou que fosse engano. Ele deixou um filho, Syed, no hospital, em estado de terrível angústia. Agora, o e-mail que ele recebeu dos especialistas em saúde mental usava um novo nome para o menino e afirmava que ele era “filha” de Ahmed. “Eles estavam tentando criar um cliente para sua clínica de gênero… E pareciam querer nos empurrar nessa direção a qualquer custo”, disse ele, quando conversamos novamente em maio, relembrando o horror de outubro passado. “Recebemos ligações de conselheiros e terapeutas do estabelecimento, que nos falavam sobre como era importante para ele mudar de gênero, e que esta seria a única maneira de ele sair do estado depressivo suicida.”

Syed foi um "aluno nota dez" e — de acordo com seus pais e com o terapeuta da família — bastante brilhante. Ele também está no espectro do autismo, é um jovem que se esquece de fazer contato visual e precisa ser lembrado de por quanto tempo se deve apertar as mãos, tomar banho ou escovar os dentes. O ensino médio foi uma tarefa árdua para ele, como geralmente é para crianças nesse espectro que descobrem que as demandas sociais da adolescência ultrapassam sua capacidade de atendê-las. “Ele tentou convidar algumas garotas para sair. Não deu certo e ele ficou frustrado e com raiva, esse tipo de coisa. Essas questões de desenvolvimento, coisas de meninos e meninas ficam meio difíceis para crianças autistas. E é aí que a puberdade pode ser muito, muito difícil com os hormônios à flor da pele e tudo mais".

Quando vieram as medidas de isolamento social, o garoto, que já travava suas próprias batalhas e estava confuso com questões que os adolescentes neurotípicos* consideram óbvias (como faço para demonstrar que gosto de uma garota? Como faço para ser incluído por outras crianças?), começou a passar dias e noites inteiras na internet. “Ele é uma criança autista, então meio que perdeu a noção do tempo. E ele ficava muito tempo acordado. Ficava apenas na internet, no Twitter, Tumblr, seja lá o que for… E ele ficava no quarto, sabe, dormindo uma ou duas horas por dia. Isso pode ser realmente devastador. Ele estava muito confuso. Estava vendo coisas, tinha alucinações visuais. E não sabíamos por quê”.

Não há uma resposta definitiva sobre o motivo pelo qual muitos adolescentes neurodiversos* se identificam como transgêneros, mas mais de um cientista apontou as altas taxas de coincidência. Como vários especialistas em autismo me explicaram, aqueles no espectro tendem a se fixar em uma ideia, e quando uma ideia contagiosa é apresentada — como a noção de que eles podem ser uma "menina no corpo de um menino" —, eles são particularmente suscetíveis a isso.

Como a psiquiatra infantil e especialista em disforia de gênero, Susan Bradley, me disse: “As mensagens que essas crianças absorvem [de influenciadores trans] quando estão online é: ‘somos as únicas pessoas que entendem você. Seus amigos e seus pais não te entendem de verdade’. E pode ser a primeira vez em suas vidas que alguém lhes diz: 'nós te entendemos. Nós te conhecemos. Você está bem. Você é como nós'. E isso é poderoso”.

Perguntei a Bradley se apresentar a ideologia de gênero para crianças que tendem a ter ideias fixas é como apresentar cocaína para pessoas suscetíveis ao vício. Ela concordou: “Tem o mesmo poder de amenizar toda a alienação, tristeza e angústia contra as quais essas crianças têm lutado”.

Por causa das medidas contra a Covid-19, Ahmed não pôde ficar no hospital com seu filho em outubro. Syed, em um estado de privação de sono e confusão, furioso com os pais que o internaram e em consulta com a equipe do hospital e uma assistente social, decidiu que seu problema era de gênero.

A idade em que menores de idade no estado de Washington podem receber cuidados de saúde mental e de afirmação de gênero sem a permissão dos pais é 13 anos. Em outras palavras, os e-mails que Ahmed recebeu do hospital foram efetivamente uma cortesia; o hospital não exigiu a permissão de Ahmed para iniciar seu filho no caminho da transição médica.

Mas, ao contrário de alguns outros pais com quem eu conversaria mais tarde, a cabeça fria de Ahmed prevaleceu. Ciente de que poderia estar caindo em uma armadilha, Ahmed procurou um advogado e um amigo psiquiatra em quem ele confiava. O psiquiatra deu-lhe um conselho que ele acredita ter salvado seu filho, dizendo, nas palavras de Ahmed: “Você tem que ter muito, muito cuidado, porque se você parecer um pouco transfóbico ou algo do tipo, eles vão ligar para os Serviços de Proteção à Criança e ficar com a guarda de seu filho”. O advogado disse a Ahmed o mesmo: “O que você tem que fazer é concordar com eles e levar seu filho para casa. Quando os conselheiros de gênero aconselharem você a ‘afirmar’ [o gênero escolhido pela criança], aceite. Basta dizer 'aham, aham, ok, vamos levá-lo para casa e procuraremos uma clínica de gênero'”.

Ahmed garantiu ao Hospital Infantil de Seattle que levaria o filho para uma clínica de gênero e daria início à transição. Em vez disso, pegou o garoto, largou o emprego e mudou-se com sua família de quatro pessoas para longe de Washington.

A reação de Ahmed foi extrema? Quando o ouvi pela primeira vez, em outubro de 2020, me perguntei se ele não tinha exagerado. Mas, à medida que um número crescente de pais começou a me contatar com histórias semelhantes, e eu investiguei as leis estaduais de Washington, Oregon e Califórnia, cheguei a uma conclusão diferente. Tomada individualmente, nenhuma lei em qualquer estado retira completamente os direitos dos pais sobre os cuidados e tratamento de saúde mental de seus adolescentes menores com distúrbios. Mas reunidas, as leis da Califórnia, Oregon e Washington colocam adolescentes com distúrbios de apenas 13 anos no banco do motorista quando se trata de sua própria saúde mental — incluindo tratamentos de "afirmação de gênero" — e torna os pais impotentes para impedi-los.

Estes, por exemplo, são os poderes concedidos a uma criança de 13 anos pelo estado de Washington. Pessoas de 13 anos ou mais têm o direito de se internar para tratamento de saúde mental em regime de internação e ambulatório sem o consentimento dos pais. As seguradoras de saúde são proibidas de divulgar aos pais segurados informações médicas confidenciais de filhos menores, como aquelas relacionadas a "disforia de gênero [e] cuidados de afirmação de gênero". Menores de 13 a 18 anos podem esconder registros de saúde mental dos pais devido a condições "sensíveis", que incluem tanto "disforia de gênero" quanto "tratamentos de afirmação de gênero". As seguradoras em Washington devem cobrir uma ampla gama de “tratamentos de afirmação de gênero”, desde a redução da traqueia para mudança da voz até mastectomias duplas.

Junte tudo isso e um aluno da sétima série pode ter o direito de embarcar nos "tratamentos de afirmação de gênero" — que pode incluir qualquer coisa, desde um provedor com novo nome e os pronomes da criança enquanto ela se prepara para receber um curso de hormônios — sem a permissão dos pais, contra a vontade de seus pais, coberto pelo seguro de seus pais, e com os pais mantidos no escuro por companhias de seguros e provedores de serviços médicos.

Para que não reste dúvidas de que não se trata de algum elixir maluco poluindo apenas as águas subterrâneas do estado de Washington, em 2015, o Oregon aprovou uma lei que permite que menores de 15 anos obtenham bloqueadores da puberdade, hormônios do sexo oposto e cirurgias às custas dos contribuintes — tudo sem o consentimento dos pais. Em 2018, a Califórnia aprovou um projeto de lei semelhante para todas as crianças em orfanatos, com 12 anos ou mais. O senado estadual da Califórnia está agora considerando uma emenda à Lei de Confidencialidade de Informações Médicas que impediria as seguradoras de saúde de divulgar informações médicas aos pais sobre seus dependentes, sob pena de responsabilidade criminal.

Uma mãe de Washington com quem falei, Nicole, tem uma filha de 16 anos que lutou contra um transtorno alimentar e outros problemas de saúde mental depois de ser abusada por um colega na escola primária. Pouco antes de seu 13º aniversário, a filha decidiu que era transgênero. “Ela odiava seu corpo, era uma coisa real”, disse Nicole. "Queríamos encontrar ajuda para ela." Mas Nicole não estava convencida de que sua filha tinha disforia de gênero, já que ela nunca havia mostrado nenhum sinal de desconforto com seu sexo biológico. “Ela já havia passado por todo um programa de aconselhamento com transtorno alimentar e nada disso veio à tona”.

Nos anos seguintes, a saúde mental da filha de Nicole piorou e a menina começou a se ferir. Depois que a filha tentou o suicídio em 2019, Nicole a levou para o pronto-socorro do Highline Hospital (hoje, St. Anne Hospital) em Burien, Washington. Nicole explicou à assistente social do hospital que, embora a filha insistisse que seu problema era o gênero, ela havia sofrido uma série de problemas de saúde mental por muitos anos. Nicole disse que ela e seu marido não foram convencidos pelo auto diagnóstico de disforia de gênero e não "afirmaram" a identidade trans de sua filha. “A assistente social foi muito legal com a gente”, disse Nicole. “Ela não deu nenhum sinal de que não estava acreditando no que estávamos dizendo nem nada do tipo”.

Mas um enfermeiro que atendia a filha de Nicole, que havia passado pela mesma coisa com sua própria filha, teve pena de Nicole e de seu marido. Quando a assistente social saiu da sala, disse Nicole, ele avisou que o casal estava a caminho de “emancipar” sua filha. A lei de Washington não permite que um menor faça uma petição de emancipação até os 16 anos. Mas, de acordo com vários pais com quem conversei, sob o pretexto de "aconselhar os jovens transgêneros sobre seus direitos", assistentes sociais às vezes dão essa dica para crianças de 14 anos, para que ela saiba que a libertação está apenas a dois anos de distância.

Nicole e seu marido não esperaram. Eles imediatamente a levaram para casa. Isso provavelmente foi uma coisa boa. Sua filha tinha pleno direito de ir para um abrigo onde, se ela quisesse, poderia ser “afirmada” como transexual e iniciar um caminho de transição médica. E, como se constatou, uma vez que um adolescente problemático com mais de 13 anos decide ficar em um abrigo em Washington, pode ser terrivelmente difícil retirá-los de lá. Em vez disso, mais de um ano depois, Nicole relata que sua filha está muito melhor, bem como o relacionamento entre elas. A menina abandonou a ideia de ser transgênero e está diminuindo os antidepressivos.

Portadora de transtornos psicológicos, a filha de 14 anos de Julie nunca se identificou como transexual. Mas o relato de Julie sobre sua luta com assistentes sociais e abrigos para jovens de Washington — cujos detalhes são corroborados por dois relatórios policiais diferentes — lança uma luz crítica sobre a abordagem do estado para adolescentes em risco com idade igual ou superior a 13 anos. Julie pediu especificamente para relatar em público sua experiência — o que demonstra o quão indignada ela está com o que aconteceu. Eu escondi seu sobrenome apenas para proteger sua filha menor, Kayla.

Há anos, Kayla sofria de graves oscilações de humor, ansiedade e depressão, decorrentes de traumas de infância nas mãos de um pai por quem foi abusada sexualmente. Embora uma ordem judicial tenha mantido o ex-marido de Julie longe de sua filha por vários anos, a depressão da menina começou a aumentar nos últimos meses, e ela desenvolveu sinais preocupantes de instabilidade mental; de acordo com Julie, o atual terapeuta de Kayla descreveu os sintomas como "transtorno de personalidade borderline".

Em 17 de março de 2021, Julie deixou sua filha no grupo de jovens da igreja. Por volta das 20 horas, recebeu um telefonema do pastor informando que Kayla havia ameaçado se matar por overdose de remédios. Kayla não tinha nenhum comprimido com ela, de acordo com o relatório policial arquivado naquele dia, mas havia expressado sua intenção de comprá-los. Quando Julie foi para a igreja, sua filha fugiu. O pastor levou Kayla direto para a sala de emergência do Hospital Infantil de Seattle, onde ela foi internada.

Por causa da pandemia, Julie não teve permissão para entrar no quarto do hospital com Kayla, mas em algum momento durante a estadia de sua filha, Julie acredita que uma assistente social do hospital sugeriu a Kayla que se ela não quisesse ir para casa, ela teria o direito de permanecer em um abrigo para jovens. Depois de uma noite no hospital, Kayla ligou para o pastor e pediu para ser levada ao Youth Care Hope Center, um abrigo para a proteção de crianças de 12 a 17 anos que viviam sem teto, abuso ou conflito familiar extremo.

Quando o hospital ligou para Julie para dizer que Kayla estava pedindo para ficar em um abrigo para pessoas sem-teto, Julie ficou horrorizada. “Eu disse: 'bom, isso é absurdo. Ela tem uma casa, uma família que a ama. Nós claramente não fizemos nada de errado. Ela não precisa ir para um abrigo’. E o [membro da equipe do hospital] disse: 'ela tem 14 anos, portanto pode fazer essa escolha por si mesma'”.

O membro da equipe estava certo ao dizer que Kayla tinha o direito de se internar para tratamento hospitalar (embora estivesse errado ao dizer que esse centro de atendimento juvenil em particular era qualificado). Uma vez que Kayla chegou lá, tirá-la foi um pesadelo.

A menos que Kayla saísse voluntariamente do abrigo, Julie não poderia ver sua filha nem levá-la para casa. E é muito claro que a filha de Julie não queria voltar para a casa da mãe. Entre as várias desavenças entre mãe e filha, Kayla estava furiosa com sua mãe pelas regras que Julie havia estabelecido para o uso da internet. Havia garotos com quem Kayla mantinha relacionamentos online, o que preocupava Julie, que temia que algumas dessas amizades fossem com homens adultos se passando por adolescentes. Ela tentou cortar o canal de comunicação entre eles e Kayla.

De acordo com o relatório do policial de Seattle Nathan Bauer, a assistente social do abrigo, Micaela Leavell, estava ciente de que Julie não queria sua filha nas instalações. Mas Leavell disse ao policial que "sentiu que era melhor" se a menina permanecesse no abrigo porque a filha "se sente 'insegura' na casa da mãe". O policial Bauer observou que Leavell "não conseguia elaborar quaisquer preocupações específicas" mencionadas pela menina, além da afirmação de que “se machucaria se fosse devolvida". Se a filha de Julie tinha motivos concretos para "se sentir insegura" na casa de sua mãe, ela parece nunca ter fornecido esses motivos a nenhum dos vários serviços de saúde mental ou assistentes sociais que a atenderam.

Várias vezes ao dia, nos dias seguintes, Julie ligava para o abrigo Youth Care para falar com sua filha. Todas as vezes, foi informada que sua filha não queria falar com ela. Neste ponto, Julie ainda estava certa de que as assistentes sociais do abrigo queriam o melhor para a menina.

Mas Julie ficou com o celular da filha. Ela viu as mensagens entrando e saindo, aparentemente enviadas pela filha a partir de um computador no abrigo. E viu que a garota havia enviado a seguinte mensagem a um pastor de jovens: “Ei! Tenho quase certeza de que encontrei um advogado que me ajudará a permanecer no programa [abrigo], já que meu assistente social/gerente de caso sugeriu que eu encontrasse um o mais rápido possível, porque ele está preocupado que minha mãe tente me levar embora".

Julie percebeu que sua filha parecia estar procurando uma emancipação legal, com a ajuda de um advogado providenciado pelo abrigo. Julie mais tarde soube que o abrigo havia encontrado um advogado para sua filha e estava trabalhando para registrar uma petição de Criança em Necessidade de Serviços. Isso teria feito do abrigo o guardião legal de Kayla, para todos os fins práticos.

De fato, vários pais de adolescentes identificados como transexuais me disseram que os assistentes sociais que cuidaram de suas filhas durante uma crise de saúde mental ou tentativa de suicídio começaram a orientar suas filhas sobre “emancipação”, sob o pretexto de “aconselhá-las sobre seus direitos”. Muitos destes assistentes encorajam adolescentes psicologicamente vulneráveis ​​— que provavelmente aceitarão a sugestão — a acreditar que as regras, decisões e objeções de seus pais a seu comportamento constituíam "abuso", disseram os pais.

O relatório do oficial Bauer, a respeito do caso de Julie e sua filha Kayla, tende a corroborar isso. O gerente de caso de Kayla, Oscar, afirmou voluntariamente à polícia que a equipe do Youth Care “fornece às crianças informações sobre recursos e cursos de ação, como emancipação, quando solicitados pelos clientes”. (Mandei um e-mail para Oscar para descobrir o quanto um adolescente precisa “pedir” até que uma assistente social sugira a emancipação, mas nunca recebi uma resposta.) A orientação publicada pelo Departamento de Crianças, Jovens e Famílias do Estado de Washington informa à equipe de administração infantil que eles não estão autorizados a divulgar as identidades LGBTQ + de uma criança aos pais; ensina a usar formulários que "distingam claramente o nome e gênero legais e do gênero e do nome escolhidos", presumivelmente para evitar deslizes no entendimento secreto que estabeleceram com os pais de uma criança; e exige que os funcionários encaminhem crianças ou jovens que desejam participar de “serviços relacionados a LGBTQ +”, incluindo “profissionais de saúde comportamental e médicos que afirmam sua identidade”. Para que você não pense que a "afirmação" por um provedor médico envolve apenas o uso de nome e pronomes, a orientação define "afirmação de gênero" como "procedimentos médicos que mudam [sic] o corpo de uma pessoa para se adequar à sua identidade de gênero".

No final, seria necessária uma equipe de oito policiais para remover a filha de Julie à força do abrigo. Naquela época, Julie já tinha um plano para cuidar de Kayla — no Arizona, onde a menina agora reside em um centro de tratamento para pacientes com suicídio e depressão. Mas a primeira coisa a fazer era extrair a filha de Washington.

Se você está familiarizado com o modelo tradicional de abrigos para jovens, pode presumir que eles estão cheios de crianças abandonadas ou abusadas pelos pais. Mas conforme a definição de "abuso" se expandiu para significar tudo, desde ferir fisicamente uma criança até não "afirmar" a identidade de gênero recém-proclamada, os abrigos para jovens parecem ter seu escopo ampliado para abrigar até mesmo crianças de famílias estáveis ​​e amorosas que querem seus filhos de volta desesperadamente.

Em 2012, as agências que responderam a uma pesquisa do Williams Institute na UCLA Law relataram que cerca de 40% dos jovens desabrigados que atendiam se identificavam como LGBTQ. A partir dessa estatística, muitos inferem que os adolescentes LGBTQ são frequentemente expulsos de suas casas por pais fanáticos. Longe disso.

Perguntei a Alexa Goodenow, uma trabalhadora da linha direta de crise Safe Place for Youth, que conecta jovens em risco a uma rede de abrigos de Seattle, quais desafios os jovens LGBTQ + enfrentam que os levam a um abrigo. “Eu diria que uma das coisas mais comuns que vemos é apenas a desconexão cultural entre eles e seu sistema de apoio”, disse ela. “Então, hipoteticamente falando, talvez haja jovens que agora estão se identificando como não-binários ou se assumindo como gays, lésbicas e bissexuais e, talvez, algumas famílias não apoiem isso. Essa situação acontece porque na área de Seattle há uma grande mistura de origens. Então, talvez os pontos de vista do jovem não se alinham com o apoio em casa”.

Ser adolescente nem sempre é fácil. Mas a remoção de filhos menores de idade da casa dos pais não costumava acontecer por uma questão de "desconexão cultural" entre pais e filhos — ou por causa de pontos de vista do jovem que não "alinham bem com o apoio em casa". O objetivo era fornecer um ponto de apoio para crianças que, de outra forma, sofreriam danos físicos ou tormentos psicológicos.

Hoje, um adolescente pode declarar uma identidade LGBTQ+ que não tem apoio em casa e alegar que essa falta de suporte coloca sua saúde mental em risco. “Entre os nossos jovens que estão em situação de rua, mais de 90% deles citam o conflito familiar como a causa da falta de moradia”, disse Suzanne Sullivan, Chief Advancement Officer da Youth Care, que me confirmou que quase 30% dos jovens em seu abrigo se identificam como LGBTQ +. “Vemos muitos jovens com diferentes identidades sexuais ou identidades de gênero que não recebem apoio em casa. Na Youth Care, acreditamos que todo jovem merece viver sua vida ao máximo e isso inclui o gênero e a identidade sexual. Estamos afirmando isso em todos os nossos centros e não achamos o contrário aceitável", disse ela. O Youth Care acolhe adolescentes e jovens de 12 a 24 anos.

Para serviços infantis em estados que consideram "cuidados afirmativos de gênero" como a única maneira humana de tratar uma adolescente com problemas que de repente decidiu que é transgênero, o poder que o governo lhes concede para minar e até mesmo remover os pais que se opõem a esses tratamentos é alarmante. Perguntei a Sullivan se os adolescentes que vêm para o Youth Care estão sofrendo abusos em casa. “Há muitos jovens, então cada história é única e diferente. E existem diferentes formas de maus-tratos, negligência e abandono. Em alguns casos, as crianças são expulsas. Em alguns casos, eles vão embora”.

Em um estado que concede a menores de 13 anos o controle sobre seu tratamento de saúde mental — em uma sociedade que cada vez mais define "abuso" como qualquer um dos vários limites que um pai pode colocar no gênero ou na exploração sexual de um menor — é fácil o suficiente para um adolescente problemático decidir que os pais são “ruins para minha saúde mental”. Uma ameaça crível de suicídio parece suficiente para garantir a uma criança o direito indefinido de ficar em um abrigo para jovens, onde ela pode sair com outros adolescentes e se livrar de uma supervisão significativa. (Falei com um pai fora de Washington, cujo filho doente de 15 anos fumava maconha e acabou desenvolvendo um problema com álcool em um abrigo para jovens, de acordo com uma avaliação psiquiátrica à qual tive acesso. No caso de Julie, Kayla faltou à escola virtual muitas vezes estava no abrigo Youth Care).

Depois que Sullivan se recusou a responder a mais perguntas por telefone, enviei um e-mail pedindo que comentasse a alegação dos pais de que “uma vez que seus filhos escolhem ficar em um dos abrigos, se tiverem mais de 13 anos, é difícil extraí-los”. Sullivan — que muitas vezes, durante nossa ligação, me convidou a enviar um e-mail com perguntas — respondeu dizendo que não tinha comentários.

Não é difícil ver por que um adolescente rebelde lutando com problemas de saúde mental pode não querer voltar para casa, mesmo para uma família amorosa. Veja a Lambert House, um “lugar seguro para jovens lésbicas, gays, bissexuais, transgêneros e questionadores (LGBTQ) de 11 a 22 anos”, de acordo com seu site. As atividades incluem Minecraft, concurso de poesia, exibição de arte, sessões de cinema e grupo de “Meninos Que Gostam de Meninos”. Pode parecer um conjunto divertido de atividades sociais para estudantes universitários. É um pouco mais preocupante considerar que, com base no calendário de atividades, muitos dos eventos parecem facilitar a socialização entre jovens de 22 anos e adolescentes a partir dos 11 anos. Liguei várias vezes para a Lambert House para pedir esclarecimentos, mas nunca tive retorno.

No entanto, conversei com Vernadette Broyles, presidente e fundadora da Child and Parental Rights Campaign. Advogado formado em Harvard, Broyles representa pais que lutam pela custódia dos filhos, serviços de proteção à criança e casos escolares.

Perguntei a Broyles à queima-roupa: ela via o mesmo padrão que eu havia notado — ou seja, pais amorosos trazendo uma adolescente suicida trans identificada para o abrigo, que a envolve em uma rede de serviços infantis que não a deixará ir embora? “Sim, esse é um dos padrões”, disse ela. “Estamos vendo padrões nacionais… Um é a erosão muito deliberada e sistêmica dos direitos dos pais”. Broyles acredita que essa erosão deixa as meninas, especialmente, "desproporcionalmente vulneráveis".

De acordo com os pais com quem conversei, é difícil argumentar contra isso. Uma mãe teve o Serviço de Proteção à Criança acionado por seu próprio terapeuta, depois que ela explicou na terapia que optou por não "afirmar" sua filha adolescente que se identificava como trans. Nesse caso, disse a mãe, a assistente social aceitou a explicação da mãe de que isso não constituía abuso. Ela se considera sortuda.

Que conselho Broyles dá aos pais se o Serviço de Proteção à Criança aparecer na porta deles? “Sem um mandado ou ordem judicial, não fale com eles. Não permita que seu filho converse com eles. Não deixe que entrevistem seu filho de jeito nenhum, com ou sem você. Não deixe que entrem em sua casa nem no seu carro. Se estiver no hospital ou no consultório médico, não os deixe entrar. Não os deixe entrar sem um mandado ou ordem judicial, independentemente do que digam. Porque, uma vez dentro, eles tomarão tudo o que você ou seu filho disser e potencialmente usarão contra você. O resto você já sabe: há a possibilidade de eles levarem a um tribunal, a um juiz, e obter uma ordem judicial para tomar a guarda seu filho. Isso é perfeitamente possível”.

Acompanhando a família de Ahmed, conversei com o terapeuta de Syed, um especialista em autismo, para descobrir como ele tem se saído desde que se mudou com seus pais e irmã para fora de Washington. Ela confirmou o que o pai de Syed me disse: Syed não é mais suicida, nem acredita que seja transgênero. Como um menino autista de 17 anos, ele mostra um desenvolvimento intelectual surpreendentemente avançado e, nas esferas sociais, pode parecer bastante infantil: ele está fazendo um trabalho avançado em filosofia, ela me diz — e também permanece fascinado pelos pôneis de brinquedo de sua irmã.

Isso é mais do que bom para sua mãe e seu pai.

*Abigail Shrier é escritora, mora em Los Angeles, e é autora de Irreversible Damage: The Transgender Craze Seducing Our Daughters.

©2021 City Journal. Publicado com permissão. Original em inglês
0 COMENTÁRIO(S)
Deixe sua opinião
Use este espaço apenas para a comunicação de erros

Máximo de 700 caracteres [0]