• Carregando...
Parte da exposição Queermuseu, que foi reaberta no Rio de Janeiro um ano após grande polêmica em sua primeira edição, em Porto Alegre | Divulgação
Parte da exposição Queermuseu, que foi reaberta no Rio de Janeiro um ano após grande polêmica em sua primeira edição, em Porto Alegre| Foto: Divulgação

Em sua segunda edição, a exposição "Queermuseu – Cartografias da Diferença na Arte Brasileira" continua a apresentar as obras que mais causaram indignação em sua primeira edição, que vilipendiavam símbolos cristãos, e, contrariamente à recomendação do Ministério Público, continua a receber crianças como visitantes.

A mostra foi reaberta no Rio de Janeiro em 18 de agosto. No ano passado, ela foi promovida pelo Santander Cultural em Porto Alegre e cancelada após indignação popular diante do conteúdo de algumas das obras expostas. A controversa exposição deu início a um extenso debate sobre o que é arte, classificação etária, liberdade de expressão, legitimidade de boicotes, entre outros. 

O objetivo da exposição, alega a organização, seria chamar a atenção para as dificuldades sofridas pela comunidade LGBT. Mas a mostra adotou um tom provocativo e desrespeitoso contra símbolos do cristianismo e da Igreja Católica. O Queermuseu sofreu críticas pela natureza de algumas das suas obras e pela falta de classificação etária para visitação. 

Editorial: O Queermuseu e a liberdade artística

Entre os trabalhos expostos, estavam imagens com conteúdo pornográfico e obras que insultam a religião cristã – o que não é apenas desrespeitoso, mas também é considerado crime. Os trabalhos desobedecem o artigo 208 do Código Penal, que proíbe “escarnecer de alguém publicamente, por motivo de crença ou função religiosa; impedir ou perturbar cerimônia ou prática de culto religioso; vilipendiar publicamente ato ou objeto de culto religioso”. 

Também causou controvérsia a forma de financiamento da exposição, realizada por um banco multinacional, e mesmo assim viabilizada por meio da Lei de Incentivo à Cultura, captando R$ 800 mil. 

Um ano depois, a exposição volta com 214 obras de 82 artistas, incluindo as que insultam símbolos religiosos. 

Classificação indicativa 

A primeira edição da mostra ignorou a classificação etária, apesar de seu conteúdo explícito. Essa decisão desrespeitou o Estatuto da Criança e do Adolescente, que prevê que crianças não sejam expostas a conteúdo obsceno ou pornográfico, conforme definido no seguinte parágrafo: “Os responsáveis pelas diversões e espetáculos públicos deverão afixar, em lugar visível e de fácil acesso, à entrada do local de exibição, informação destacada sobre a natureza do espetáculo e a faixa etária especificada no certificado de classificação.” 

Além disso, o próprio projeto da exposição previa a visitação de crianças e a confecção de materiais explicativos a serem distribuídos a alunos e professores, como mostrou reportagem da Gazeta do Povo

Em setembro de 2017, dois procuradores de Justiça Criminal do Ministério Público do Rio Grande do Sul fizeram uma visita informal à mostra e divulgaram uma nota afirmando que a exposição “tinha o nítido propósito de erotizar o público alvo e induzi-lo a tolerar condutas como orgias, zoofilia e vilipêndio a símbolos religiosos”. 

Leia mais:  "Erotização de crianças era objetivo” da ‘Queermuseu’, dizem procuradores gaúchos

Um fato agravante para os procuradores era o de que as próprias escolas definiam a faixa etária dos alunos visitantes, e que os pais provavelmente não teriam ciência do conteúdo erótico a que seus filhos foram submetidos. 

O Ministério Público havia recomendado ao Santander Cultural que “em futuras exposições, seja criado espaço onde não se permita o livre acesso de crianças e adolescentes desacompanhados de pais ou responsáveis legais, no caso de mostras que contenham obras com cenas de sexo explícito ou pornográfica, assim como definido pelo artigo 241-E, do Estatuto da Criança e do Adolescente.” 

O Queermuseu iria passar pelo Museu de Arte do Rio de Janeiro (MAR), mas foi vetado pela Prefeitura da cidade, que corretamente decidiu não despender dinheiro do contribuinte com a mostra, rejeitada pela maioria da população. Então, a remontagem foi feita na Escola de Artes Visuais do Parque Lage, agora com recursos privados levantados via financiamento coletivo pela internet. 

Editorial: Livres para rejeitar

Antes da abertura da segunda edição, uma decisão da 1ª Vara da Infância e da Juventude proibiu o acesso de menores de 14 anos no local, alegando que a mostra apresentava nudez e conteúdo sexual. Ainda, jovens de 14 e 15 anos só teriam acesso se acompanhados dos responsáveis. O juiz estabeleceu multa de R$ 50 mil por dia em caso de descumprimento da decisão. No entanto, o museu conseguiu reverter a decisão da classificação proibitiva, que passou a ser uma classificação indicativa para maiores de 14 anos. 

Mesmo assim, a exposição tem recebido crianças, segundo Fabio Szwarcwald, diretor Escola de Artes Visuais do Parque Lage. “O objetivo é exatamente mostrar que não há essa questão que foi colocada, de uma exposição de arte que incentiva a pedofilia, a zoofilia ou de ter feito vilipêndio religioso. É uma exposição para ser visitada pelas crianças para que elas tenham realmente uma percepção cultural e artística muito interessante sobre esse tema”, disse Szwarcwald à Gazeta do Povo

Apesar do que diz Szwarcwald, entre as obras mais criticadas estavam uma pintura da artista carioca Adriana Varejão, “Cena de Interior II”, de 1994, que retrata cenas de sexo, incluindo com um animal; as obras da série “Criança Viada”, de Bia Leite; a obra Et Verbum, de Antônio Obá, que consiste em uma caixa de madeira com hóstias inscritas com nomes de órgãos sexuais e outras palavras; e a pintura “Cruzando Jesus Cristo com Deusa Schiva”, de Fernando Baril. 

Todas essas permanecem na segunda edição da exposição. 

Leia também: MP cita nazismo e esquece insulto contra religião em pedido de reabertura do Queermuseu 

Szwarcwald ainda conta que a organização não considerou a retirada das obras mais controversas da exposição. “Se eu tirasse essas obras da exposição, estaria fazendo uma censura – exatamente tudo o que a gente luta contra. É fundamental que a exposição venha com todas essas obras que foram mais polêmicas. Elas foram polêmicas em função de uma ignorância”, afirma. 

A organização do evento informou que as seguintes informações estão afixadas na entrada do local da exposição: 

“Esta exposição contém obras de arte com representações de nudez, sexo e simbologia religiosa. Recomendamos levar isso em consideração antes de entrar na sala da exposição.” 

“O conteúdo desta exposição não é recomendado para menores de 14 anos desacompanhados dos seus pais ou responsáveis.” 

O advogado do Parque Lage, Damien Guedes, afirmou em uma entrevista em agosto que estava à frente de 12 outros processos contra a mostra que vão desde inquéritos criminais, civis e até um processo no Ministério da Justiça. 

Recursos públicos 

Um dos pontos criticados durante a edição da mostra em Porto Alegre foi o uso de recursos públicos. As leis de incentivo são um instrumento legítimo para o apoio à cultura. 

O Banco Santander havia captado um total de R$ 800 mil por meio de renúncia fiscal para a exposição em Porto Alegre. Após as críticas e o fechamento da mostra, o banco informou que iria devolver o dinheiro para os cofres públicos. 

Leia também: Seis coisas sobre a exposição no Santander Cultural

A segunda edição foi financiada por uma campanha de financiamento coletivo que arrecadou mais de R$ 1 milhão em doações. 

A mostra se encerra em 16 de setembro. Até esta quarta-feira (12), a mostra tinha recebido cerca de 32 mil pessoas, e a expectativa da organização é de que o público total alcance 37 mil pessoas ao final da exposição.

0 COMENTÁRIO(S)
Deixe sua opinião
Use este espaço apenas para a comunicação de erros

Máximo de 700 caracteres [0]