O encontro entre o presidente Jair Bolsonaro e o presidente paraguaio Mario Abdo Benítez foi marcado por polêmica quando, ao discursar, o brasileiro chamou o ex-ditador Alfredo Stroessner de "estadista".
O contexto do elogio se deu pelo apoio do paraguaio na construção da Usina de Itaipu, porém em um momento em que o Brasil se destaca junto ao Grupo de Lima por endossar pedidos pela redemocratização da Venezuela, a fala gerou alvoroço. Isso porque Stroessner foi uma das figuras mais controversas entre todos os ditadores sul-americanos.
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Militar da ala considerada mais atrasada do Partido Colorado, ele ascendeu ao poder após ajudar a derrubar Federico Chavez por meio de um Golpe de Estado em 1954 e vencer a eleição realizada em seguida — sendo o único candidato.
No Palacio de los López até 1989, sua administração foi marcada por um constante Estado de sítio e pela aparência de democracia: havia oposição, parlamento e eleições, mas o regime exercia o controle por meio da censura, prisão, exílio ou assassinato dos principais opositores. Ademais, as eleições eram fraudadas — Stroessner obteve mais de 90% das intenções de votos em todas as 8 eleições que disputou.
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O regime estimulava o envolvimento das forças armadas no contrabando de cocaína, eletrônicos e carros de luxo roubados. Tratava-se de uma ferramenta de sustentação de seu poder.
Houve forte presença do culto à personalidade do general ao longo do regime, com seu retrato constando em todas as partições públicas — mesmo as ocupadas por opositores. Além disso, a segunda maior cidade do país levava seu nome em homenagem, Puerto Stroessner (posteriormente renomeada como Ciudad del Este). Por fim, ser filiado a seu partido era um requisito para ter acesso a empregos e serviços básicos, como atendimento médico.
A repressão do governo foi tamanha que entre 4 mil e 5 mil civis foram assassinados, além de provocar o exílio de centenas de milhares de paraguaios. Pelo menos 18.772 pessoas foram vítimas de torturas físicas, sexuais e psicológicas durante o regime.
A despeito das violações aos direitos humanos, a percepção popular paraguaia ainda é muito favorável a ele, lembrado como um período de crescimento econômico e segurança pública. Pesquisa de 2009, por exemplo, mostrou que 41% dos paraguaios achavam que o país estaria melhor se Stroessner ainda estivesse no poder.
Tráfico de crianças e pedofilia
Embora houvesse relatos sobre o regular tráfico humano e de meninas sendo estupradas violentamente por Stroessner e seus ministros, além de uma reportagem do Washington Post denunciando a prática desde o final dos anos 1970, nenhuma investigação oficial ocorreu até julho de 2016.
Naquele ano, o regime passou a ser examinado pelo governo paraguaio a partir do Departamento de Memória Histórica e Reparação, vinculado ao Ministério da Justiça. Traçando um paralelo com o Brasil, os trabalhos lembram a Comissão Nacional da Verdade instituída no primeiro mandato de Dilma Rousseff.
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Descobriu-se que por meio de aliados, o regime sequestrava crianças e mantinha um harém de escravas sexuais no bairro de Sajonia, em Assunção. Por lá, havia meninas de todas as idades a partir de 8 anos, com a maioria entre 10 e 15 anos.
Em trecho do documentário “Calle de Silencio (2017) do diretor Jose Elizeche, uma moradora próxima da casa onde ocorriam os encontros relata a naturalidade como a prática era realizada:
“De noite, às 10, (11 horas), Stroessner vinha sozinho dirigindo um carro velho, grande, vinha sozinho, sem nenhum guarda. Ele dirigia sozinho e entrava na rua. Passava por lá, manobrava, estacionava, cumprimentava, como se fosse nada. Às 3 da manhã ia embora, como se fosse nada.”
A prática chegou a ser denunciada a época, mas quando policiais descobriram que o local era de propriedade de um coronel do exército, o órgão deliberadamente omitiu-se.
Os trabalhos dos investigadores demonstraram que o ditador exigia o constante fornecimento de virgens para seu uso. Estima-se que Stroessner estuprava em média quatro meninas por mês, tendo ao longo de três décadas e meia violado mais de 1.600 crianças.
Fortuna, exílio no Brasil e morte
Alfredo Stroessner foi derrubado por outro golpe militar, em 1989, articulado por seu aliado político Andrés Rodriguez. Logo depois, o general obteve exílio político no Brasil, que ignorou os pedidos de extradição de Stroessner para que fosse julgado no Paraguai por acusações de homicídio.
Viveu com seu filho em uma mansão com oito quartos, piscina e elevador privativo, avaliada em R$ 10 milhões, localizada na restrita Península dos Ministros, a área mais nobre do Lago Sul, em Brasília. Morreu em Brasília em 2006, aos 96 anos, deixando um patrimônio, avaliado em R$ 3 bilhões, objeto de processos judiciais no Paraguai, suspeita de ter sido obtida de forma ilegal.
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