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violência

Rapaz afegão mata ex-namorada e põe em xeque política de migração da Alemanha

A morte de uma adolescente alemã em Kandel, na Alemanha, aumentou a raiva daqueles que se opõem à política de imigração da Alemanha, principalmente porque o suspeito é um migrante afegão  | DMITRY KOSTYUKOV/NYT
A morte de uma adolescente alemã em Kandel, na Alemanha, aumentou a raiva daqueles que se opõem à política de imigração da Alemanha, principalmente porque o suspeito é um migrante afegão  (Foto: DMITRY KOSTYUKOV/NYT)

Aconteceu entre as prateleiras bem organizadas de xampus e comida orgânica para bebês: um adolescente se aproximou de sua ex-namorada na farmácia local, puxou uma faca de cozinha com uma lâmina de 20 cm e a apunhalou no coração.  

A tragédia, ocorrida em 27 de dezembro, traumatizou esta pacata cidadezinha de cerca de 10 mil habitantes, não só porque o suspeito e a vítima tinham apenas 15 anos e frequentavam a escola local, mas também porque o rapaz é imigrante afegão e a garota, alemã.  

Desde que a Alemanha abriu suas portas para mais de um milhão de migrantes, há dois anos, episódios como o ataque no mercado de Natal de Berlim e os estupros e abusos na noite de Ano Novo em Colônia, ganharam grande destaque e insuflaram as inseguranças alemãs.  

Mas o caso dos dois adolescentes, Abdul D. e Mia V., gerou uma grande comoção porque o crime aconteceu em um cenário calmo e provincial e as duas pessoas envolvidas eram jovens. O caso se tornou notícia nacional, foi debatido durante as refeições, em talk shows e redes sociais e reforçou os temores de que a Alemanha está se tornando cada vez menos segura.  

Porém, percepção é uma coisa e estatística, outra. Os relatos aumentaram nos últimos dois anos, mas, no geral, o número de crimes violentos vem caindo há uma década neste que continua a ser um dos países mais seguros da Europa.  

Medo nacional

No entanto, os episódios envolvendo migrantes ou asilados são agora a nova causa da ansiedade nacional.  

Algo mudou na Alemanha. Até pouco tempo atrás, o desafio de custo e de logística da integração dos novos migrantes ainda dominavam o debate público; hoje em dia, a crescente insatisfação com a política de migração da chanceler Angela Merkel chegou a um novo patamar.  

"Estou com medo," disse Jana Weigel, assistente de dentista de 24 anos de idade, enquanto acendia uma vela em frente à farmácia DM, onde ocorreu o assassinato.  

Cada vez mais há solicitações de exames médicos obrigatórios para determinar a idade de migrantes que afirmam ser menores ou deportações mais rápidas para aqueles que, como o suspeito, tiveram negado o pedido de asilo.  

Um acordo preliminar da coalizão entre os conservadores de Merkel e os sociais-democratas, mais liberais, inclui o limite de 220 mil refugiados por ano e restringe o número de membros da família que poderão se juntar a um refugiado no país.  

Mesmo em Kandel, cidade orgulhosamente tolerante e com tendências a votar na esquerda, o clima na rua está mais pesado. Muitos habitantes levaram o assassinato para o lado pessoal. Antes de Mia terminar com Abdul, ele havia sido bem recebido pela família da garota, salientou Weigel, assim como aconteceu com centenas de milhares de refugiados que receberam as boas-vindas na Alemanha.

"É o caso de pensar quantos outros vão trair nossa hospitalidade", disse ela.  

Pesquisa

Metade desse aumento se deve ao fato de que crimes com migrantes têm o dobro da probabilidade de ser divulgados, disseram os autores do estudo. Muitas dos acusados são jovens com menos de 30 anos, grupo da população com uma probabilidade maior de cometer crimes, mesmo entre os alemães.  

Menos divulgada foi a outra importante constatação do relatório: no total, os crimes violentos, incluindo assassinato e estupro, permanecem bem abaixo de seu pico de 2007. O número de jovens delinquentes caiu pela metade desde então.  

"O paradoxo é que a Alemanha ainda é um país muito seguro, muito mais seguro do que até poucos anos atrás, mas a percepção é o oposto: as pessoas se sentem menos seguras. E quando um assassinato como esse ocorre, a sensação é confirmada", disse Christian Pfeiffer, criminologista e coautor do relatório, encomendado pelo governo e divulgado recentemente.  

Pergunte a qualquer um dos alemães presentes a um memorial informal da menina que foi morta, um verdadeiro mar de velas e mensagens e fotos dela com amigos, e vai ouvir uma lista de crimes cometidos por migrantes: uma alemã que foi estuprada por um sudanês na cidade vizinha de Speyer, alguns dias antes; outra que foi violentada e estrangulada por um afegão em Freiburg, pouco mais de um ano atrás.  

Weigel, quem tem uma filha de dois anos de idade, já não sai de casa à noite. No mês passado, um ataque terrorista foi frustrado por pouco em um rinque de patinação em Karlsruhe, que fica a meia hora de carro daqui. "Parece que perdemos o controle. O Estado perdeu a mão", disse Weigel.  

Kandel, na porção sudoeste do país, é uma cidade ordeira, com casas medievais bem restauradas e lojas que fecham para o almoço. Também é o lar de 125 refugiados, a maioria da Síria ou do Afeganistão.  

Antes de Mia ser morta, nunca houve problema, garante o prefeito de Kandel, Günther Tielebörger. Ele representa os sociais-democratas, há muito tempo o partido mais forte da cidade. O de extrema-direita, Alternativa para a Alemanha, ou AfD, recebeu menos de 10 por cento dos votos na última eleição. "Os alemães se sentem negligenciados", disse Tielebörger. "Precisamos acordar; caso contrário, a esquerda vai perder votos para a direita."  

Um dos ex-colegas de Tielebörger no governo local é Heiko Wildberg, que já foi membro do Partido Verde, liberal e pró-imigrantes. Wildberg é agora legislador pelo AfD em Berlim. Para ele, a morte de Mia foi um "momento de mudança".  

"Não se trata de Berlim ou de Colônia; é uma cidade pequena alemã. Esse assassinato mostra que a realidade da crise dos imigrantes chegou ao interior."  

O AfD agiu rápido, organizando uma marcha silenciosa por Kandel, dois dias depois do ocorrido. O Partido Nacional da Alemanha, mais extremista, fez o mesmo.  

Enquanto isso, o escritório de benefícios locais em Kandel teve que bloquear suas portas porque seus funcionários estavam sendo ameaçados. Mensagens anônimas os chamavam de cúmplices.  

Alguns acusam as autoridades de não ter feito o suficiente para proteger Mia. Abdul a perseguia on-line e pessoalmente, e bateu em um dos colegas da garota em um ataque de ciúmes.  

Em 15 de dezembro, os pais dela o haviam denunciado à polícia. Doze dias depois, enquanto a garota fazia compras com os amigos, ele a esfaqueou várias vezes com uma faca que havia comprado em um supermercado ao lado. Ela acabou morrendo por causa dos ferimentos.  

Depois que o pai disse ao tabloide alemão Bild que o ex-namorado "definitivamente não tinha 15 anos", recomeçaram os pedidos de exames médicos para verificar as declarações de refugiados que dizem ser menores.  

A comissão de ética do órgão que representa os médicos da Alemanha disse que esses testes – que incluem raios-x de ossos da mão, do ombro e da mandíbula, além de exames genitais – violam a "integridade física" e podem ter uma imprecisão de até dois anos. Porém, esses pedidos se tornaram um grito de guerra político.  

Incentivo

Existe um incentivo para os migrantes menores de 18 anos. Os benefícios do governo, o acesso a oportunidades de trabalho e as aulas de alemão são melhores para quem é menor. Em Saarland, mais de um terço dos migrantes que foram examinados aparenta ter mais de 18 anos.  

A maioria dos migrantes menores desacompanhados está se integrando bem, de acordo com Anne Spiegel, ministra de Integração no estado da Renânia-Palatinado, que inclui Kandel. "Eles frequentam a escola, estão aprendendo alemão e se matriculando em cursos técnicos", disse ela.  

E autoridades como Tielebörger dizem que as transgressões cometidas por um migrante recebem uma atenção desproporcional, dando a impressão oposta.  

Houve outro homicídio chocante em Kandel nas últimas semanas, ressaltou ele: um homem matou a mulher e dois filhos. Esse caso não virou notícia nacional.  

"Se o rapaz fosse alemão, não estaríamos tendo essa conversa", disse ele. 

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