Nos últimos anos houve um crescimento meteórico da cultura “woke”. Ao contrário de outras modinhas importadas, o nome não pegou aqui no Brasil, mas sua essência sim. E o que é a cultura woke? É aquele engajamento de fancaria, uma disputa interminável pelo posto de maior justiceiro social do pedaço. É o sujeito que escreve “todxs” em vez de “todos”, que amanhece “cancelando” alguma personalidade que falou algo diferente da cartilha do politicamente correto, que milita incansavelmente nas redes sociais. Certamente você conhece o tipo.
Esse comportamento foi rapidamente adotado pelas pessoas que mais vivem de aparência no mundo: atores e atrizes de Hollywood. Não é de hoje que a categoria se utiliza do vasto espaço que detém na imprensa para divulgar discursos fajutos, quando não absolutamente ridículos e descolados da realidade.
Não sou da opinião de que a classe artística não deva se pronunciar sobre política ou qualquer assunto que porventura deseje abordar. Se eles são levados a sério ou não depende de quem recebe a mensagem. Se um ator se investe de uma falsa autoridade para falar das mudanças climáticas ou política externa, por exemplo, é opção de quem o escuta dar crédito ou não a ele.
É fato, também, que muitos deles, ao fazer tais discursos engajados, se colocam numa posição de superioridade moral, como se estivessem ensinando a nós, reles mortais, como deveríamos viver. Em sua maioria milionários, agem como uma elite escolhida para iluminar o caminho da humanidade. Não é só em Hollywood, evidentemente, que esse comportamento ganhou força (alô, Caetano Veloso, Gregório Duvivier e cia). Mas foi em Hollywood, neste domingo, durante a premiação do Globo de Ouro, que foram obrigados a ouvir o mais duro discurso destruindo a hipocrisia reinante.
O comediante inglês Ricky Gervais (o cara que inventou a genial série ‘The Office’) apresentou a premiação pela quinta vez e fez um monólogo de abertura destruidor. Aqui vai um trecho:
“A Apple entrou no jogo da TV [por streaming] com The Morning Show, um soberbo drama sobre a importância da dignidade e de fazer o que é certo, feito por uma empresa que explora trabalhadores na China. Bem, vocês dizem que são conscientes, mas as empresas para as quais vocês trabalham são inacreditáveis. Apple, Amazon, Disney. Se o Estado Islâmico criasse um serviço de streaming, vocês ligariam para o seu agente, não?
Portanto, se você ganhar um prêmio hoje à noite, não o use como plataforma para fazer um discurso político. Você não está em posição de dar uma palestra ao público sobre qualquer coisa. Você não sabe nada sobre o mundo real. A maioria de vocês passou menos tempo na escola do que a Greta Thunberg.”
A despeito do aviso prévio de Gervais, a atriz Michelle Williams, vencedora do prêmio de melhor atriz de minissérie, usou seu tempo para, mesmo grávida, dizer que não teria chegado tão longe na carreira se não tivesse abortado.
“Eu não teria sido capaz de fazer isso sem empregar o direito de uma mulher de escolher, de escolher quando ter meus filhos e com quem”, afirmou, enquanto outra atriz ferrenha defensora do aborto, Busy Phillips, era filmada na plateia forçando um choro tão falso que não faria feio no Framboesa de Ouro.
O momento hipocrisia, no entanto, só serviu para reforçar o que Gervais disse na abertura do prêmio. Subir ao palco para defender a morte de bebês mostra como a classe artística não têm estofo moral para estabelecer como o resto da população deve viver. Atores falam em direitos humanos, mas não têm coragem de apontar o dedo para a ditadura comunista de Xi Jinping por medo de perder o financiamento das empresas chinesas e a crescente bilheteria.
Uma das primeiras mulheres a denunciar a podridão dos bastidores de Hollywood e dar início ao movimento #MeToo, a atriz Rose McGowan, estuprada por Harvey Weinstein, foi ao twitter no sábado para pedir desculpas ao Irã pela morte do general Qasen Suleimani. Sim, uma difusora do #MeToo pediu desculpas a um país onde mulheres são apedrejadas por motivos torpes.
Este não é, de maneira alguma, um texto contra atores e atrizes. A maioria deles é muito bom no que faz. Alguns dos melhores momentos das nossas vidas se passam no cinema. Mas nem por isso eu acho que o cara que usa fantasia de super-herói e cueca para fora da calça tenha algo de útil para me dizer sobre o modo como devo levar minha vida.
Já passou da hora de todxs cancelarem o discurso ‘woke’.
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