Neste sábado (06/05), em diversas capitais brasileiras e mundiais foram realizadas as famosas (ou infames) Marchas da Maconha. É a oportunidade anual para jovens — e alguns não tão jovens assim — fumarem na frente dos policiais com o beneplácito do Supremo Tribunal Federal, que autorizou a realização das marchas em 2011. Desde então, todo ano milhares de camisetas do Bob Marley com cheiro de naftalina saem do fundo dos armários para dar um passeio cheio de ares de contestação. O mote é a defesa de uma “erva natural que não pode lhe prejudicar”, embora as melhores pesquisas médicas digam outra coisa.
Abaixo, algumas impressões da marcha realizada este sábado em Curitiba.
1 - Menores estão liberadíssimos para fumar maconha
Qualquer restaurante, bar ou casa noturna pode ser multada num valor que varia de R$ 2.000 até impressionantes R$ 1,5 milhão se descumprir a lei 12.546, que proíbe o fumo em ambientes fechados. Na Marcha da Maconha de Curitiba, no entanto, a coisa mais comum foi ver menores de 18 anos — que pela mesma lei também estão corretamente proibidos de fumar ou consumir qualquer derivado de tabaco — com cigarros de maconha. A reportagem da Gazeta do Povo testemunhou uma roda de seis jovens fumando em um “bong”, um artefato geralmente de vidro ou cerâmica usado para inalar a fumaça da maconha. Dos seis, três tinham 16 anos — os outros três tinham 18, 19 (era a namorada de um deles) e 20 era o mais velho. A certa altura, eles começam a cantar a música Folha de Bananeira, do músico gaúcho Armandinho:
Fuma, fuma, fuma folha de bananeira
Fuma na boa só de brincadeira
Fuma, fuma, fuma folha de bananeira
Fuma na boa só de brincadeira
Seu guarda "cê" não pode me prender
É só um fumo que eu acabo de "acendê"
Se chegou tarde, o que posso fazer
Sou de menor e "cê" "num" pode me bater
2 - Os organizadores não podem fazer nada para impedir menores de fumar maconha, que é mais segura que açúcar, segundo esses mesmos organizadores
De acordo com Pedro da Nóbrega Bearzoti, escalado pelos organizadores da Marcha para falar com a imprensa, a principal providência é avisar, no “flyer” distribuído convocando todos, que menores de idade precisam de uma autorização judicial dos pais para participar. “Quando fazemos panfletagem, dizemos para a galera que é menor de idade não ir. A gente obviamente não faz panfletagem em saída de colégio, mesmo sabendo que existem muito usuários no ensino médio”, diz Bearzoti.
“A gente diz para as pessoas não usarem porque as comprovações científicas são a de que a maconha é uma droga extremamente segura, mas que ela ainda pode, levemente, menos que o açúcar, inclusive, afetar o desenvolvimento do cérebro se usada antes — aí existe uma divergência — de 18 ou 21 anos”, afirma Pedro. “Mas infelizmente aqui, na hora, na casa de milhares de pessoas, é um evento na rua e a gente não tem como conferir a identidade de todo mundo. Então, sim, a gente sabe que tem, a gente lamenta, a gente tenta fazer o máximo possível para evitar, ainda assim alguns dão um jeito, é estatístico.”
Na página da Marcha da Maconha, no Facebook, não havia nenhum aviso para os menores de 18 anos.
3 -Todo usuário é, antes de tudo, um aspirante a médico
“A maconha é, antes de tudo, um remédio”, explicava, com ares de doutor Drauzio, o ANTROPÓLOGO Sérgio Vidal, que era requisitado a todo momento por participantes da Marcha para tirar selfies. Ele representa uma associação medicinal que cadastra pacientes e os auxilia a fazer os medicamentos por conta própria. Ele montou uma barraca em frente ao McDonald’s para vender um livro de sua autoria chamado “Cannabis Medicinal - Introdução ao Cultivo Indoor”. Ao lado do livro, uma folha de maconha recortada na cartolina com os dizeres “Fora Temer” e folhetos sobre uma festa de música eletrônica em Rio Negrinho (SC).
De bermuda, tênis com meias decoradas com desenhos da folha maconha e uma camiseta regata com mais folhas de maconha, o antropólogo Vidal falou à Gazeta do Povo sobre como a maconha não é apenas um medicamento, e sim um “sistema de medicamentos”. “São os efeitos colaterais, fome, sono e prazer, que ajudam as pessoas. Em algumas pessoas, ela abaixa a pressão, e isso é bom. Algumas pessoas a buscam como automedicação para o estresse. Em poucas pessoas gera paranoia.”
4 - Os maconheiros são grandes frasistas
A reportagem da Gazeta do Povo conversou com vários participantes e colheu suas ideias. Eis algumas:
“Na verdade sou contra a liberação da maconha porque o governo vai querer ganhar em cima disso. O cigarro de “cincão” que eu gasto vai virar uma porcaria na farmácia”
“Acho ridículo a Polícia Militar ir dar palestra falando que a maconha leva a vícios piores. As pessoas que se viciam são as que não têm psicológico forte. Por que elas não vão a uma médico bem-sucedido e se curam. Esse pessoal suja muito a nossa cara”
“Acho que deveriam proibir o álcool e o cigarro. Nunca vi ninguém chegar a casa e bater na mulher depois de fumar maconha.”
“Minha mãe quer me internar porque eu fumo maconha, mas nunca vendi nada em casa [para comprar um cigarro da droga]. Amo fumar um verde.”
“Duvido que você não fuma um”, jovem afirmando ao repórter. O repórter não fuma.
5 - A maconha é o remédio mais poderoso do mundo
Um dos principais objetivos da Marcha, segundo Pedro Bearzoti, é “o acesso para quem precisa da maconha como remédio, para as mais de 100 doenças diferentes que ela trata, seja na forma in natura, seja na forma essencial.”
Apesar das propaladas características medicinais da maconha, e de ser mais inofensiva que açúcar, segundo Bearzoti, pesquisas recentes, muito recentes, põem por terra toda essa eficácia e reforçam os danos e perigos da planta.
Pesquisa publicada no fim de abril no periódico Human Molecular Genetics por integrantes da faculdade de medicina de Tel Aviv, em Israel, confirma o que já é conhecido faz tempo: o uso da cannabis durante a adolescência é um gatilho para a esquizofrenia. Um outro estudo da faculdade de Psicologia Experimental de Bristol, na Inglaterra, vai além: pessoas com predisposição à esquizofrenia têm maior tendência a experimentar cannabis.
Mesmo um uso considerado consagrado para a cannabis, o alívio para a ansiedade e depressão, está em xeque. Estudo da Universidade Estadual de Colorado, nos Estados Unidos, publicado no periódico PeerJ, com 178 usuários, mostrou que a longo prazo seu uso vai perdendo efeito. “Existe uma ideia disseminada de que a cannabis diminui a ansiedade”, diz Jeremy Andrzejewski, coautor do estudo, “embora nenhuma pesquisa tenha confirmado isto de fato.”
6 - A legalização vai acabar com o tráfico e com a criminalidade
Um dos objetivos da Marcha é “o fim do desperdício inútil de vidas humanas na guerra às drogas, seja de policiais, seja de criminosos que poderiam estar fazendo algo produtivo pela sociedade no futuro, seja dos inocentes pegos no fogo cruzado.”
Bem, uma forma simples disso acontecer seria parando de consumir a droga. Isto acabaria com o tráfico. Também vamos supor que os criminosos que são traficantes atualmente vão se dedicar a fazer “algo produtivo pela sociedade” assim que a for aprovada a legalização. Impossível não dar certo.
Lembrando que uma boa pesquisa que acaba de ser publicada pelo Centro Médico e pela faculdade de Saúde Pública da Universidade Columbia, dos EUA, concluiu que o uso ilícito de maconha e desordens públicas relacionadas ao uso da droga cresceram em um índice maior nos estados americanos que legalizaram o uso medicinal da cannabis. O estudo foi publicado no respeitado periódico médico JAMA, da Associação Americana de Medicina.
7 -Plantar maconha em casa também vai acabar com o tráfico
Um dos argumentos mais utilizados foi o de que, com a hipotética legalização, será possível matar o tráfico de inanição. Os próprios usuários poderão plantar em casa. Isso da geração que não conseguia manter seus tamagotchis vivos.
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