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Várias pesquisas relacionam o uso intensivo de redes sociais a uma maior probabilidade de sofrer problemas de saúde mental, o que é um fator de risco para a solidão
Várias pesquisas relacionam o uso intensivo de redes sociais a uma maior probabilidade de sofrer problemas de saúde mental, o que é um fator de risco para a solidão| Foto: Imagem de Plukje por Pixabay

A solidão é uma epidemia silenciosa em nossas sociedades, como demonstram numerosos estudos. Na Espanha, segundo dados do Barômetro 2024 do Observatório Estatal da Solidão Não Desejada, uma em cada cinco pessoas sofre com isso, e sete em cada dez dizem ter passado por isso em algum momento de suas vidas. Se olharmos para os grupos etários, percebe-se uma curva considerável que coloca os jovens e os idosos como os grupos mais afetados.

O pico está na faixa etária de 18 a 24 anos (34,6%); a partir daí, o percentual diminui até a faixa de 65 a 74 anos (14,5%) e volta a subir a partir dos 75 anos (20%). Por outro lado, como confirmam alguns estudos, os millennials e a geração Z (entre 16 e 39 anos) não se saem mal apenas na comparação "estática" (quem se sente mais solitário atualmente), mas também na "dinâmica", que compara a solidão vivida na mesma fase da vida por gerações diferentes. Por exemplo, entre os baby boomers americanos e seus pais – a chamada "geração silenciosa" – os que dizem ter passado uma juventude solitária são menos da metade em comparação com os jovens de hoje; embora essa memória possa estar contaminada pela passagem do tempo e pela sensibilidade social ao fenômeno.

De qualquer forma, o fato de que as gerações atuais de jovens se sintam mais solitárias pode parecer paradoxal, já que nasceram e cresceram na chamada era da comunicação. No entanto, várias pesquisas relacionam o uso intensivo de redes sociais a uma maior probabilidade de sofrer problemas de saúde mental, o que é um fator de risco para a solidão.

Levando em consideração a variável sexo, as mulheres se sentem mais solitárias (21%) do que os homens (18%), especialmente a partir dos 55 anos, onde a diferença entre elas e eles chega a sete pontos percentuais, enquanto é mínima na fase da juventude.

O fato de que essa diferença se acentue à medida que a velhice se aproxima pode estar relacionado à maior expectativa de vida das mulheres e, portanto, ao maior número de viúvas em comparação com viúvos. No entanto, nem todos os estudos concordam com a importância desse fator. Outros sugerem que o impacto emocional das mesmas circunstâncias "objetivas" é diferente para cada sexo, e que as mulheres têm mais facilidade para reconhecer que se sentem solitárias.

O fator família

Chama a atenção que, ao analisar a probabilidade de sentir-se sozinho, a pesquisa mencionada não leve em consideração o estado civil ou o número de filhos. Um parâmetro chamado "lar" é considerado, referindo-se a se as pessoas vivem sozinhas ou acompanhadas, mas sem especificar o tipo de companhia (parceiro, filhos, colegas de casa, etc.). De qualquer forma, o relatório conclui que as pessoas que vivem sozinhas têm maior risco de solidão não desejada.

Parece lógico que isso aconteça. No entanto, um estudo de 2022 realizado em 30 países mostra alguns nuances nessa relação entre viver sozinho e sofrer de solidão. A pesquisa (que se concentra em pessoas com mais de 65 anos) revela que, de fato, os casados são os menos solitários, seguidos dos solteiros por escolha, enquanto os viúvos, divorciados e separados têm maior risco de solidão não desejada. O estudo sugere que os solteiros voluntários desenvolvem uma ampla rede social fora do ambiente familiar, o que os torna menos vulneráveis à solidão não desejada, enquanto os casados fazem isso em menor grau, o que os prejudica em caso de divórcio, separação ou viuvez.

Além do estado civil atual, outras pesquisas mostraram que existe uma correlação entre a sensação de solidão na infância e a probabilidade de experimentá-la também na vida adulta, e que entre os fatores que mais influenciam a solidão infantil estão vários relacionados à estrutura familiar. Especificamente, um relatório do Survey Center on American Life (SCAL), publicado em fevereiro de 2022, destacou dois fatores: ser filho único e ter sido criado em um lar monoparental.

Menos filhos, mais solidão?

O barômetro e outros estudos são exaustivos ao apresentar os dados de prevalência de solidão não desejada de acordo com a idade e o sexo, e ao analisar algumas circunstâncias que podem agravá-la, como pertencer a grupos especialmente vulneráveis (pessoas com deficiência ou doenças mentais, desempregados ou com menor nível educacional, estrangeiros...). No entanto, como mencionamos, o fator filhos não é considerado.

A escritora e acadêmica americana Mary Eberstadt, por outro lado, chamou a atenção para esse fator. Em um artigo publicado no jornal espanhol ABC ("A opção da natalidade"), ela explicou que “a atitude dominante de laissez-faire em relação ao casamento e aos filhos colide com a realidade. Por que tantas pessoas idosas estão tão sozinhas? Não é o desaparecimento dos filhos a causa mais evidente de sua solidão?”

Eberstadt não é a única a apontar a conexão entre a solidão e a falta de filhos. Ross Douthat, conhecido colunista do New York Times, escreveu no final de 2020 um artigo para a revista Plough intitulado “Por que ter mais filhos”. Nele, enumerava algumas consequências negativas das baixas taxas de natalidade em países ocidentais, incluindo várias relacionadas com a erosão dos laços sociais: “O enfraquecimento dos laços sociais em um mundo com cada vez menos irmãos, tios, primos; a fragilidade de uma sociedade onde os laços intergeracionais podem ser rompidos por uma simples disputa ou morte; a infelicidade dos jovens em uma sociedade que avança em direção à gerontocracia; o crescente isolamento dos idosos”.

Não são apenas observações sociológicas de alguns comentadores que relacionam as experiências familiares, e em particular o número de filhos, com a epidemia de solidão. Alguns estudos corroboram essas intuições com dados. Por exemplo, um publicado por Thijs van den Broek e Marco Tosi na revista Social Indicators Research (“Quanto mais, melhor? O efeito causal da alta fertilidade na solidão na terceira idade na Europa Oriental”, volume 149, 2020) analisou o efeito desse fator em mais de 25.000 pais e mães entre 50 e 80 anos de oito países do Leste da Europa e concluiu que ter filhos funciona como um "protetor" contra a solidão na vida adulta, especialmente para as mulheres. E adicionava: “As evidências aqui apresentadas sugerem que a tendência para famílias com menos filhos observada em vários países do leste da Europa pode expor as novas gerações, e em particular as mulheres da região, a um maior sentimento de solidão”.

Dada as baixas taxas de natalidade nos países ocidentais e a crescente proporção de mulheres jovens nessas mesmas nações que rejeitam a ideia de ter filhos, a projeção feita pelos autores para o leste europeu parece ainda mais provável quando aplicada a países como Espanha, Portugal ou Grécia.

Amizades, nível educacional e comunidade religiosa

Além dos fatores relacionados à família, existem outros que, segundo a pesquisa, também estão ligados à maior ou menor prevalência da solidão não desejada.

De fato, alguns estudos – por exemplo, o Barômetro – destacam o efeito das relações de amizade sobre os laços familiares.

Por isso, é um mau presságio que, em vários países desenvolvidos, o número de amizades próximas esteja diminuindo. De acordo com o estudo do SCAL mencionado anteriormente, nos Estados Unidos o percentual de pessoas que dizem não ter nenhum relacionamento desse tipo aumentou significativamente desde 1990, enquanto o de quem afirma ter seis ou mais também caiu de forma significativa.

Em ambos os casos, a tendência é especialmente negativa para as pessoas com menor nível educacional, e a diferença em relação àqueles com diploma universitário, que mal existia em 1990, aumentou desde então.

Esse mesmo fenômeno é observado ao comparar outros fatores de sociabilidade. Por exemplo, aqueles que concluíram apenas o ensino obrigatório participam com muito menos frequência em atividades e grupos de vizinhança, fazem menos trabalho voluntário e até utilizam menos espaços públicos como parques ou bibliotecas. Isso pode estar relacionado a um certo estilo de vida, mas o estudo também aponta que essas pessoas costumam viver em bairros com menor presença desse tipo de instalações, ou onde as vias públicas são mais perigosas (o que explicaria por que também são menos propensas a passear pelas ruas). Assim, parece existir uma relação entre nível sociocultural – geralmente acompanhado pelo econômico – e vida social. Por outro lado, as pessoas casadas e com filhos, especialmente se têm diploma universitário, são as que acumulam maior "riqueza comunitária".

Outro tipo de comunidade que também funciona como escudo contra a solidão é a religiosa. De acordo com o estudo do SCAL, a pertença a uma confissão religiosa mitiga o impacto do fator sociocultural na prevalência da solidão. Isso ocorre porque, embora seu efeito seja positivo para todos os tipos de pessoas, ele é especialmente benéfico para aquelas com menor nível educacional.

Todos esses dados mostram que a epidemia de solidão que afeta algumas sociedades avançadas não é de forma alguma "cega": ela leva em consideração idade, sexo, estado civil e religiosidade. Se quisermos progredir na "imunidade de grupo", seria útil tirar conclusões a partir destes dados.

Copyright 2024 Aceprensa. Publicado com permissão. Original em espanhol: Soledad: Una epidemia que sí entiende de edad, sexo, estado civil y religión

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