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Os Jedi: jihadistas de um burocrático califado intergaláctico com sabres de luz em punho? | Divulgação
Os Jedi: jihadistas de um burocrático califado intergaláctico com sabres de luz em punho?| Foto: Divulgação

No ano passado, antes do lançamento de Rogue One, o chefe executivo da Disney Bob Iger fez uma enfática declaração quando perguntado sobre a mensagem do filme: “Honestamente, esse é um filme que o mundo deve gostar. Não é um filme, de nenhuma forma, político”, disse ao Hollywood Reporter falando sobre o que era, naquele momento, a última adição da extensa saga de ficção científica. “Não há, de nenhuma forma, uma declaração política no filme”. 

Iger estava, na época, reagindo à polêmica sobre os tuítes (rapidamente deletados) de dois dos roteiristas do filme. Chris Weitz havia mencionado que o Império Galáctico da série representava “uma organização supremacista branca”. Este sofria a “oposição”, conforme comentário de seu colega Gary Whitta, “de um grupo multicultural liderado por mulheres”. Apenas semanas após a eleição do presidente Donald Trump e a culminação de uma áspera campanha política racialmente carregada, o filme foi saudado por alguns como “anti-Trump” – e sujeito aos boicotes de membros furiosos da alt-right, um círculo de nacionalistas brancos que estavam incomodados com o suposto posicionamento politicamente liberal (liberal nos Estados Unidos tem um sentido diferente do que no Brasil, pendendo mais para esquerdista - Nota do Editor) do filme. 

Parece ter menos burburinho conforme o novo filme da franquia, “Os Últimos Jedi”, foi lançado ao redor do mundo neste fim de semana. (Você não encontrará spoilers abaixo.) Mas isso não significa que não há nenhuma política em Star Wars. Exatamente o contrário; autores de ficção científica e fantasia frequentemente enchem suas histórias com parábolas para os tempos contemporâneos. E uma legião de aficionados por Star Wars têm refletido profundamente – talvez profundamente demais – sobre esse universo ficcional por décadas, associando os heróis com sabres de luz e esferas capazes de destruir planetas a todos os tipos de significado. 

O Hollywood Reporter tuitou “Sexta foi uma noite de @StarWars no #Kimmel, e @JimmyKimmel decidiu usar uma analogia de Darth Vader para ilustrar o relacionamento entre Trump e seu ex-conselheiro de segurança nacional, Michael Flynn”. 

É uma evidência para a franquia que tanto aqueles politicamente liberais ou conservadores tiram metáforas da história. Neste ano, Craig Shirley, biógrafo de Ronald Reagan, escreveu uma coluna para o Washington Post sobre como o primeiro filme da franquia Star Wars apresentou o “conto definitivo da moralidade conservadora”. Shirley argumentou que o filme, lançado há 40 anos, valorizava “um jovem grupo de rebeldes independentes que lutavam contra um império opressivo e coletivista para obterem a liberdade da galáxia”. 

Palmas para quem adivinhar a quem Shirley pensa que os vilões da história se referem: “O Império Galáctico militarizado era liderado com punhos de aço por um Politburo e por um imperador”, ele explicou, apontando para a União Soviética. “Suas táticas principais para a unidade e estabilidade eram a escravidão, o medo, a morte e a destruição, principalmente com sua arma capaz de destruir planetas. Seus uniformes com armadura branca mascarada destruíam qualquer senso de identidade; um soldado era simplesmente um número”. 

Em contraste, a “Força” – o poder cósmico dominado pelos Jedi, um tipo de tribo monástica de cavaleiros galácticos – “é uma sugestão do Judaísmo e Cristianismo como agentes unificadores pelo bem”, enquanto os rebeldes ajudados por eles são os renegados anti-soviéticos. “Eles eram uma pequena e motivada força que aprendeu que poderia derrotar uma grande mas desmotivada força”, escreveu Shirley, que então misturou horrivelmente metáforas históricas. “Era George Washington contra o Império Britânico.” 

George Lucas, o homem que inventou tudo, na verdade tinha algo um tanto diferente em mente. A grande narrativa política de Star Wars era enraizada na história antiga: Como uma república, assolada pela complacência, ingenuidade e algumas guerras definha frente à tirania. Lucas era orientado não pela União Soviética, mas por algo muito mais próximo. “Na verdade, era sobre a Guerra do Vietnã e aquele era o período em que [o Presidente Richard] Nixon estava tentando concorrer por um [segundo] mantado, o que me fez pensar historicamente sobre como democracias viram ditaduras?” disse Lucas ao Chicago Tribune em 2005. “Porque as democracias não são tomadas; elas são entregues.” 

Lucas filmou boa parte de sua muito criticada trilogia “prequel” de Star Wars durante a época da invasão americana ao Iraque em 2003. Em um episódio, ele ainda fez com que o futuro Darth Vader declarasse “se você não está conosco, você é meu inimigo”, ecoando a retórica do “conosco ou contra nós” do presidente George W. Bush. Parecia que Lucas estava alinhando o impulso imperial na política americana com os terríveis Sith, as figuras anti-Jedi de sua história. 

“Eu sei que é a frase que George Bush disse, mas muitas outras pessoas que lideraram países a disseram antes dele”, disse Ian McDiarmid, o ator que foi o Chanceler Palpatine no filme, a figura que se transforma no cruel Imperador. “Aquela é realmente uma ótima frase Sith”. 

Lucas foi ainda mais longe com o New York Times:

“George Bush é Darth Vader. [O vice-presidente Dick] Cheney é o Imperador”, disse. 

Curiosamente, nos últimos anos, uma enorme quantidade de críticos de direita tem incorporado a causa dos vilões nos filmes de Star Wars. Eles veem as ações violentas do Império – a exemplo da completa destruição de um planeta para aterrorizar a rebelião – como meios necessários de executar uma guerra justa contra insurgentes. Enquanto isso, a República é uma intolerável União Europeia no espaço, uma confederação de uma elite presunçosa pouco menos desprezível do que o Império militarista. 

“Os Jedi – conforme representados nos filmes e nos muitos livros do universo expandido – são basicamente jihadistas de um burocrático califado intergaláctico com sabres de luz em punho”, escreveu David French há dois anos na revista de direita National Review. “A República Galáctica é o Hotel California (em referência à canção da banda Eagles sobre um hotel onde as pessoas entravam e nunca mais lhes era permitido sair) da governança interestelar. Você pode fazer o check out, mas nunca pode sair – pelo menos não se quiser manter sua cabeça sobre os ombros”. 

A nova trilogia, incluindo o filme lançado neste fim de semana, também gira em torno de assuntos políticos contemporâneos: Como grandes momentos de esperança são passageiros, como antigas ordens são difíceis de serem desalojadas, como regimes poderosos podem ser facilmente transformados em uma espécie de fascismo paranoico. Mas também traz o conflito entre o papel do poder e os Jedi, uma enigmática ordem cujo destino, após uma série de erros e diversas batalhas, está em jogo. 

Dan Drezner, um veterano filósofo de Star Wars e professor que escreve para o Post, é um dos muitos fãs que perceberam como os aparentes heróis da saga e sua ideologia parecem cada vez mais falíveis. Se uma geração (ou duas) tem esperado pelo inevitável retorno dos Jedi ao poder – virando o arco moral da galáxia de volta ao seu tipo de justiça – talvez nós estejamos aprendendo as lições erradas.

Ishaan Tharoor escreve sobre relações internacionais para o Washington Post. Anteriormente, foi editor sênior e correspondente na revista Time em Hong Kong e mais tarde em Nova York.

Tradução de Maíra Santos
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