A Suécia de repente virou um saco de pancada nas redes sociais. Mas o que os suecos fizeram para enfurecer os tuiteiros?
A Suécia, ao contrário de seus vizinhos europeus e da maioria dos estados norte-americanos, se recusa a assumir uma postura combativa em relação à pandemia de coronavírus. Em vez de instituir quarentenas em massa e aumentar o policiamento, a Suécia tem reagido com leveza.
As pessoas nesse país de 10 milhões de habitantes ainda visitam bibliotecas e piscinas públicas. Pode-se ver as pessoas bebendo cerveja nos restaurantes, embora as aglomerações estejam restritas a no máximo 50 pessoas. As crianças ainda levantam cedo para irem à escola pela manhã, ainda que jovens com mais de 16 anos sejam estimulados a estudarem em casa. O governo também pediu para as pessoas lavarem as mãos frequentemente, estimulou o trabalho remoto e pediu que as pessoas se isolassem se se sentirem mal ou se tiverem mais de 70 anos.
Em essência, em vez de paralisar a economia, os líderes suecos pediram aos cidadãos que limitassem a disseminação da Covid-19 de outra forma: agindo com responsabilidade.
“Há uns poucos momentos na vida em que você deve fazer sacrifícios não só para o seu bem, mas também para o bem das pessoas ao seu redor, para os outros seres humanos e para seu país. A hora é agora”, disse o primeiro ministro Stefan Lofven.
Desnecessário dizer que a abordagem sueca ao coronavírus tem gerado um bocado de controvérsia. Afinal, a economia mundial foi paralisada pelas ordens de quarentena e dezenas de milhões de pessoas já perderam o emprego. Quem esses suecos pensam que são para acharem que têm uma saída melhor?
O que nos traz de volta ao Twitter. Recentemente, influenciadores começaram a dizer que a Suécia está tendo o que merece.
“A Suécia assumiu uma postura liberal em relação à Covid-19 enquanto seus vizinhos eliminaram a vida pública e fecharam as fronteiras”, observou um estudioso do Manhattan Institute no Twitter. “Parece que estamos finalmente vendo os resultados disso”.
O guru dos dados Nate Silver, fundador e editor-chefe do influente site de estatísticas FiveThirtyEight, também disse que a Suécia estava “pagando o preço” por sua postura liberal em relação ao coronavírus.
A aposta da Suécia naturalmente gerará discórdias. As pessoas podem até dizer que valorizam o inconformismo, mas Voltaire provavelmente tinha razão quando disse que o mundo não o valoriza.
“Nossa espécie”, escreveu o filósofo francês”, também é composta por aqueles que andam pelo caminho já trilhado e que sempre lançam pedras contra os que mostram um caminho novo”.
Mas os dados realmente embasam a conclusão de que os líderes suecos estão matando seu povo ao deixarem de impor quarentenas? Até agora, não há uma resposta para isso.
Qualquer discussão séria sobre a Covid-19 deve vir com um alerta de que todos os dados até agora são incompletos, fluidos e profundamente deficientes. Dito isso, os padeiros usam os ingredientes de que dispõem. E, no momento, os dados mostram que a Suécia tem uma das melhores taxas entre infectados e mortes da Europa.
Primeiro, não faz muito sentido comparar as mortes agregadas na Suécia com as da Dinamarca e Noruega, já que a Suécia tem quase o dobro da população desses dois países. Se analisarmos os dados per capita*, veremos que a Suécia atualmente tem uma taxa de 35 mortos por 1 milhão de habitantes.
Essa taxa é, de fato, maior do que a da Dinamarca e Noruega, com 24/milhão e 11/milhão, respectivamente – entre as melhores da Europa. Mas os dados também mostram que a taxa de mortalidade na Suécia é muito melhor do que a de muitos de seus vizinhos europeus, incluindo a França (100/milhão), Suíça (68/milhão), Espanha (234/milhão), Itália (243/milhão), Bélgica (99/milhão), Holanda (87/milhão), Reino Unido (53/milhão) e Luxemburgo (50/milhão).
Em seu tuíte, Silver comparava a Suécia (e o Reino Unido e a Holanda) aos Estados Unidos, que tem uma das taxas de mortalidade mais baixas do mundo (21/milhão). Ele convenientemente excluir países como a Bélgica, a França e a Espanha e, claro, a Itália — que têm algumas das piores taxas de mortalidade do mundo e estão entre os primeiros países a imporem quarentena.
Não estou sugerindo, aqui, que há uma relação de causalidade entre as quarentenas e as altas taxas de mortalidade nesses países.
Estou apenas dizendo que não há provas o bastante para se izer que a abordagem liberal da Suécia é um fracasso.
Provavelmente só saberemos os resultados da experiência sueca — estimulando a responsabilidade social em vez de impor ameaças e a força estatal — daqui a semanas ou meses. É possível que o experimento seja um desastre total e custe muitas vidas. É possível, talvez até provável, que, se as mortes continuarem aumentando, os líderes políticos suecos percam a fé nessa postura e instituam uma postura mais dura.
Mas quanto mais a vida na Suécia permanece normal — crianças nas escolas, adultos nos bares e a economia a toda, enquanto as pessoas tomam precauções — sem uma explosão no número de mortos semelhante à vista na Itália e Espanha, mais deveríamos nos sentir inspirados.
Se tal cenário vier a passar, ele também deveria dar início a uma reflexão. Por que o mundo correu para empregar a força e a ameaça para determinar medidas de quarentena?
Existe uma tendência a se acreditar que o livre mercado e a cooperação funcionam, a não ser quando situações mais difíceis ou complexas exigem meios mais assertivos.
O grande Leonard Read percebeu o erro desse raciocínio.
Quanto mais complexa a economia, a sociedade ou a situação, observou Read, “mais deveríamos confiar nos processos milagrosos e adaptativos dos homens que agem em liberdade”.
*Todos os dados são do dia 3 de abril.
Jonathan Miltimore é editor do site FEE.org.