Durante uma geração, o Texas foi um porto seguro para o Partido Republicano. Os democratas esperavam mudar isso neste ano, mas, a despeito da fixação da imprensa pelo novo Texas Democrata, o estado não vai “azular”, como muitos progressistas acreditam — ainda que um futuro roxo pareça plausível.
O presidente Donald Trump ganhou facilmente de Joe Biden no estado, mas desta vez sua vantagem foi de apenas sete pontos percentuais. Em 2016, a vantagem dele foi de nove pontos. Mudanças demográficas parecem explicar parte do fenômeno, já que o Texas está se tornando mais urbano — mais de 85% da população vive em cidades — e também tem atraído mais minorias. Regiões urbanas como Dallas-Fort Worth e Houston, diz o demógrafo Wendell Cox, se tornaram incrivelmente atraentes para estrangeiros, cujos números dobraram em relação à média nacional.
Mas a diversidade tem se mostrando ainda mais diversa do que os analistas imaginam. Os hispânicos hoje são maioria em relação à população branca, e a população não-branca, que inclui muitos afro-americanos, é superior aos 57%. Ainda assim, as minorias texanas tendem a ser menos rigidamente democratas do que as da Califórnia e Nova York. Na verdade, os eleitores hispânicos no Texas votaram mais em Trump do que se esperava, dando a ele incríveis 40% dos votos, até mesmo em bastiões democratas como o Vale do Rio Grande.
O Condado de Zapata, no Texas, que não era republicano havia mais de um século, tem 93,3% da população formada por hispânicos, e lá Trump teve 52,3% dos votos. No condado de Kenedy, com 76,7% de hispânicos, Trump teve 65,5% dos votos; e no condado de Cameron, com 88,1% de hispânicos, Trump teve 44,4% dos votos. No condado de Starr, um dos mais pobres do estado e com 95% da população se declarando hispânica, Hillary Clinton venceu em 2016 por 60 pontos percentuais; Trump reduziu essa margem em 2020 para apenas 5 pontos. A quantidade de eleitores nos locais de votação indicava que muitos do condado saíram de casa apenas para votar no presidente.
Essa mudança entre os latinos chega em boa hora para o Partido Republicano, cujos líderes enfrentam perdas nos subúrbios ainda majoritariamente brancos e de eleitores bem-educados que foram os responsáveis pelo crescimento do Texas. Em 2016, Clinton venceu por uma margem pequena em Houston e Dallas; neste ano, Biden venceu Trump no condado de Harris County, o maior do Texas, por 13 pontos. Populações cada vez maiores de gente bem-educada nos subúrbios, imigrantes e minorias étnicas representam uma ameaça aos projetos republicanos. Somente a mudança no voto dos latinos parece ter salvado o dia.
O Texas considera o estado praticamente uma nação e tem muito interesse pela política local. Durante uma geração, a Câmara estadual e o governo foram dominados pelos republicanos, divididos entre moderados como George W. Bush e personalidades mais conservadoras. Os democratas esperavam mudar isso sistematicamente; em 2018, eles conquistaram 12 assentos a mais na Câmara, o que significa que ficaram a nove assentos de assumirem o controle do legislativo pela primeira vez em duas décadas.
Até aqui, os democratas, com financiamento de fora do estado, estão conquistando mais lugares na Câmara estadual. Muitos desses distritos, de acordo com o analista Kevin Shuvalov, ficam em subúrbios ricos e cada vez mais diversificados nas regiões de Dallas e Houston, as que mais crescem no estado. Na era pós-segregação, os democratas texanos bem-sucedidos foram os mais centristas, como Henry Cisneros, de San Antonio, e Bob Lanier e Bill White, de Houston. “Os democratas do Texas são diferentes dos da Califórnia”, sugere Carroll Robinson, presidente estadual da Coalisão Texana de Democratas Negros. “Este continuará sendo um estado competitivo nas próximas eleições. Nenhum extremista vencerá”.
Da mesma forma, republicanos bem-sucedidos como os governadores Greg Abbott ou George W. Bush ganharam com folga atraindo o eleitor latino – conquistando mais de 40% dos votos deles – e também vencendo nos subúrbios. Eles conquistaram o voto de mais afro-americanos do que Trump, sem abdicar dos republicanos conservadores. “Eles conseguiram se apegar à ideia de um governo moderado e pragmático”, observa Cullum Clark, ex-banqueiro que hoje trabalha para o George Bush Center.
Mas hoje os dois partidos estão menos moderados. No Partido Republicano, alguns conservadores assumem posturas extremistas quanto a armas ou questões sociais que possivelmente alienam os moderados dos subúrbios. Pior ainda, alguns republicanos têm dado declarações explicitamente racistas, algo que dificilmente atrai as minorias. A mesma tendência é vista entre os democratas. Joe Biden venceu as primárias democratas no Texas com um terço dos votos, dependendo sobretudo dos afro-americanos e dos mais idosos. Esses democratas tradicionais tendem a se tornar mais moderados —pró-crescimento econômico, pró-energia e pró-desenvolvimento — e às vezes apoiam republicanos. Hoje um grupo novo de democratas está surgindo — na maioria jovens e latinos – e ele apoiou majoritariamente Bernie Sanders nas primárias de abril. Eles são os “democratas urbanos”, como os chama Clark, e parecem mais dispostos a aceitar as políticas progressistas, até mesmo no setor de energia, do que seus semelhantes em Nova York e na Califórnia. De acordo com as pesquisas, 56% dos democratas texanos veem o socialismo com bons olhos.
Mas o Texas ainda é o Texas, e talvez o estado não esteja preparado para a ascensão das bandeiras dos antifas. Só a proibição do fracking hidráulico, algo que os progressistas adoram, custaria até 1 milhão de empregos no Texas. Tentativas de desestimular lares com apenas uma família, como já acontece na Califórnia e no Oregon, seriam igualmente impopulares, já que a garantia à propriedade privada é um dos grandes atrativos do estado. Essa questão é fundamental sobretudo entre os latinos, que tendem a exercer profissões braçais que poderiam ser afetadas por uma maior regulamentação. São eles os que mais sonham com uma casa própria.
Essas medidas já estão sendo implementadas em Austin, que parece querer copiar San Francisco, e na eleição de políticos que se inspiram em Alexandria Ocasio-Cortez, como a juíza Lina Hidalgo. Mesmo que o Texas se aproxime do centro, os democratas podem destruir suas chances no futuro se aproximando demais da esquerda — a não ser, claro, que os republicanos tentem vencê-los indo demais para a direção contrária.
Charles Blain é presidente do Urban Reform Institute.
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