As palavras que escolhemos usar revelam o mundo mental que habitamos. Quando o líder derrotado do Partido Trabalhista britânico, Jeremy Corbyn, disse que ele e seu partido eram líderes da resistência — e não da oposição —a Boris Johnson, ele revelou quão frágil é o compromisso (se é que esse compromisso existe) dele e de seu partido com a democracia parlamentar. Resiste-se à ditadura; opõe-se ao governo legítimo. Corbyn, portanto, é como o presidente turco Recep Tayyip Erdoğan, que certa vez disse que a democracia é como um trem: você sai dela assim que chega ao destino. É um meio para se alcançar um fim — no caso de Corbyn, a justiça social nos moldes socialistas; ou seja, uma ditadura boa, e não má. Porque, uma vez que a justiça social é alcançada, para que precisaríamos de políticos, exceto, talvez, um grupinho de iluminados?
Corbyn deixou claro que a “resistência” não se daria apenas no Parlamento, e sim também nas ruas. Ele está supostamente se referindo a greves, manifestações e desobediência civil. Para Corbyn e para outros parecidos com ele, não se trata de uma questão de tentar convencer o povo a votar nele, ou em alguém parecido com ele, nas próximas eleições; ao contrário, ele se vê no papel de tentar tornar o país ingovernável. Ele quer a revolução e, como disse Lênin, quanto pior, melhor.
Corbyn também insiste que ele e seu partido representam o que ele chama de “os muitos, não os poucos”, ao contrário de seus oponentes do Partido Conservador, que ainda assim conseguiram mais votos na eleição geral. Além da estupidez evidente, o que explicaria a insistência nessa ideia?
A primeira explicação possível é que os eleitores traíram seus próprios interesses ao deixarem de votar em Corbyn. Ele defende os “muitos”, mas não conta com o apoio deles. Os eleitores na verdade sofrem da velha doença marxista da falsa consciência de classe — eles foram enganados pela imprensa dos plutocratas, assim como o eleitorado norte-americano (supostamente) foi enganado pela manipulação russa. Se essa é a interpretação correta da visão de mundo de Corbyn, ela sugere desprezo pela escolha do eleitorado — a crença de que os eleitores são incapazes de defender seus interesses e que, assim, precisam ser redimidos por uma vanguarda revolucionária esclarecida.
A segunda explicação possível é a de que “muitos”, em comparação com “poucos”, tem um sentido técnico, assim como “popular” em “República Popular”. Assim como o “popular”, neste contexto, não representa a população como um todo, e sim apenas uma parte dela que controla e aceita o regime, o termo “muitos”, no sentido estrito do termo, se refere apenas aqueles que apoiam e votam em Corbyn e seu partido. Os milhões que não votaram nele são apenas bajuladores da classe dominante e, portanto, os desejos deles não devem ser levados em conta. Os votos deles não significam nada.
Corbyn não está errado ao dizer que tem muitos apoiadores. Em qualquer grupo de tamanho considerável, você vai encontrar uma boa quantidade de pessoas capazes de apoiar qualquer coisa. O assustador nele e nos da sua laia não são apenas suas políticas perigosas, e sim o aparente desdém e a incapacidade de aceitar os resultados das eleições como meio de formar governos. Para o bom funcionamento da democracia parlamentar é preciso que a oposição aceite que perdeu e que precisa esperar as próximas eleições para tentar ganhar; uma oposição que realmente aja como oposição – não como resistência.
Theodore Dalrymple é editor colaborador do City Journal, ocupa a cadeira Dietrich Weismann no Instituto Manhattan e é autor de vários livros.
© 2020 City Journal. Publicado com permissão. Original em inglês
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