Uma corte trabalhista na Inglaterra determinou que o veganismo ético – a recusa de consumir qualquer produto de origem animal – equivale a uma religião ou crença filosófica e, portanto, está sujeito às leis antidiscriminação.
O vegano Jordi Casamitjana processou seu patrão, uma instituição de caridade chamada Liga Contra Esportes Cruéis, dizendo que a organização o demitiu por conduta inadequada: ele revelou que a instituição tinha fundos de pensão investidos em empresas que realizavam testes em animais.
O tribunal ainda vai decidir se Casamitjana foi mesmo demitido por conta de suas crenças. A princípio, me parece improvável que isso tenha acontecido, mesmo que as crenças dele o tenham levado a agir como agiu. Mas a própria ideia de um tribunal se sentir capaz de dividir as crenças entre aquelas que são realmente filosóficas e não antagônicas à sociedade — critério estabelecido por lei a fim de lhes garantir proteção especial — e as que não se enquadram nisso é preocupante.
Isso equivale a licenciar virtualmente ou a dar certificados para crenças, algo semelhante a um selo de “boa dona-de-casa” que gera privilégios jurídicos. Isso é algo que confere aos tribunais o direito e o dever de decidir que crenças são compatíveis ou não com a democracia. Isso é uma receita para um debate interminável, para a felicidade dos advogados, sem dúvida, mas comprometendo a paz da sociedade.
Se o tribunal decidir que a conduta de Casamitjana, por ter sido motivada por crenças juridicamente protegidas da discriminação, foi, portanto, legal, isso pode dar origem ao caos. Um caixa de supermercado que se recusar a manusear um produto proibido por sua religião não pode ser demitido por causa disso. Se uma empresa demitir um funcionário dizendo que a demissão se justifica porque a disponibilidade em manusear produtos é uma condição necessária da função, pode-se argumentar que essa condição era inerentemente discriminatória. Uma igreja não poderia demitir um pastor que se dissesse ateu porque o ateísmo faz parte de uma crença filosófica compatível com a democracia.
Talvez seja vergonhoso o fato de uma instituição de caridade que se opõe à esportes que são cruéis com animais investir em empresas que realizam testes em animais (embora, claro, os esportes e os testes de laboratório sejam atividades diferentes, com justificativas diferentes). Mas também é vergonhoso que um homem envolvimento da divulgação de informações prejudiciais sobre a empresa que o contratou exija que possa continuar trabalhando para a empresa usando proteções jurídicas extremamente duvidosas como instrumento de coerção. Isso é que é querer o bolo – sem glúten, claro — só para si, e comê-lo!
Theodore Dalrymple é editor colaborador do City Journal, ocupa a cadeira Dietrich Weismann no Instituto Manhattan e é autor de vários livros.
© 2020 City Journal. Publicado com permissão. Original em inglês
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