Um dos pontos nevrálgicos da contemporaneidade é a velocidade e o poder da tecnologia. Nosso conhecimento e vício em aparelhinhos será maior do que nossa capacidade de controle e canalização da tecnologia? Esse tema está na essência da popular franquia de ficção científica O Exterminador do Futuro e ecoa por toda a cultura contemporânea desde aquele fatídico agosto de 1945, quando o mundo se deparou com a devastação de Hiroshima e Nagasaki.
Depois de sobreviver ao pesadelo da Primeira Guerra Mundial, J.R.R. Tolkien entendeu bem o problema da tecnologia e a ameaça das máquinas. Numa carta extensa para Milton Waldman, que ele esperava que publicasse O Senhor dos Anéis, Tolkien explica o uso de máquina em seu épico, associando-o ao maquinário. Longe de ser um ignorante, Tolkien expõe com clareza a diferença entre a mágica dos elfos e a de Mordor.
Ele observa que os hobbits não entendem a diferença entre os poderes mágicos exercidos pelos elfos e os usados por Sauron: “a rainha elfa, Galadriel, é obrigada a discutir com os hobbits porque eles confundiam o uso da palavra “mágica”, usando-a tanto para o inimigo quanto para os elfos”. Tolkien diz que a falta de uma palavra precisa (outra que não “mágica) para o que os elfos faziam indica que há uma confusão semelhante em nossas mentes e mitologias.
Ele, então, se põe a explicar a diferença. “A mágica dos elfos é arte criada a partir de suas muitas limitações humanas: um produto e visão mais natural, rápida e completa na sua correspondência perfeita. E seu objeto é arte, não o Poder, subcriação, não domínio nem reforma tirânica da Criação”.
A distinção de Tolkien elucida os dilemas que encaramos à medida que a tecnologia se acumula e explode em nossas caras. Em resumo, a mágica de Mordor é o maquinário da morte. É a busca do poder por si só e que insiste em ver o mundo apenas como matéria-prima a ser explorada, distorcida e destruída. Na versão cinematográfica de Peter Jackson para a obra-prima de Tolkien, vemos esse maquinário de mágica assassina em ação quando Saruman destrói a Floresta de Fangorn — derrubando-a para alimentar as máquinas bélicas. Os reinos dos elfos, por outro lado, são oásis de harmonia, beleza e paz criados pela mágica élfica.
Em seu livro sobre milagres, C.S. Lewis fez uma distinção semelhante — não entre mágica élfica e máquinas, mas entre mágica e milagres. A mágica é sempre uma tentativa honrosa de distorcer ou controlar a natureza em nome da vontade do mago. O pensamento de Lewis é ilustrado no volume “O Sobrinho do Mago”, incluído nas “Crônicas de Nárnia”. O tio de Digory, Andrew, é um “mago menor” que usa mágica para manipular crianças e causar problemas que, alerta Aslan, podem levar à aniquilação total. Milagres, diz Lewis, nunca distorcem ou destroem a natureza. Ao contrário, eles curam restauram e complementar a ordem natural. Assim, um milagre de cura corrige um erro ou uma doença. Os milagres de Deus trazem abundância e paz. Uma tempestade é acalmada ou se multiplica pães e peixes. Os milagres são “mágica élfica” porque são artísticos e criativos, e não manipuladores e opressores.
A distinção esclarece nossa relação contínua com a tecnologia na contemporaneidade. Será que usamos nossos instrumentos cada vez mais sofisticados e expandiremos o conhecimento de uma forma élfica, criativa e artística, de modo a trazer luz, beleza e verdade ao mundo, ou usamos a tecnologia para manipular, ganhar dinheiro e conquistar mais poder?
Por fim, a distinção de Tolkien nos permite entendermos melhor o movimento ecológico. Muitos conservadores parecem instintivamente opostos aos objetivos dos “verdes”. Claro que colocar a preservação do mundo natural no topo das prioridades políticas é um erro. Mas há uma crítica importante ao uso do maquinário contemporâneo usado na destruição do mundo natural apenas por lucro e poder. Onde termina a nossa paixão pela tecnologia e onde começa a nossa responsabilidade pela preservação do mundo natural? Devemos continuar, como Saruman, a destruir Fangorn ou, como os elfos, devemos usar nossa mágica tecnológica para criar mundos de beleza, luz e liberdade, como Rivendell?
Fr. Dwight Longenecker é colaborador do Imaginative Conservative.
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