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A Agência de Segurança Sanitária do Reino Unido (UKHSA, na sigla em inglês) anunciou na semana passada que não oferecerá mais vacinas contra Covid-19 para as crianças menores de 12 anos, ao menos que elas estejam em grupo de risco.
A decisão parece ter irritado o jornal The Guardian, que entrevistou vários médicos que criticaram a medida.
“Quando sabemos que há uma vacina segura e eficaz disponível, isso parece injustificável para mim”, disse ao jornal a professora Christina Pagel, da University College em Londres, apontando que as mortes pela vacina de Covid-19 são raras.
Por que razão precisamente não estão oferecendo vacinas contra Covid para crianças foi algo que o Guardian não soube dizer — fora a admissão de que às vezes causam morte — talvez porque o livreto verde explicativo da UKHSA dão dá muitos detalhes.
Pode-se presumir que a decisão vem do fato de que as crianças pequenas são de longe as menos prováveis de ficarem seriamente doentes com a Covid, junto a dados do governo que mostram que a miocardite é um efeito colateral sério (mas raro), em particular entre os jovens do sexo masculino. [N. do T.: Confira a cobertura da Gazeta do Povo de um estudo da Tailândia com metodologia rigorosa que sugeriu que a miocardite pode atingir até 3% dos adolescentes do sexo masculino inoculados com a segunda dose da vacina de mRNA.]
Seja como for, a decisão da UKHSA alinha a Inglaterra a vários outros países europeus — incluindo a Suécia, Finlândia, Noruega e Dinamarca — que não oferecem ou recomendam vacinas de mRNA para crianças pequenas sadias.
Nos Estados Unidos, por outro lado, algumas cidades estão indo em outra direção.
Em Washington D.C., a prefeita Muriel Bowser está envolvida em uma batalha a respeito da ordem que ela deu para todos os alunos serem vacinados contra Covid-19 para terem aulas presenciais nas escolas, uma política que pode ter implicações sérias, dado que cerca de 40% dos adolescentes negros não estão vacinados.
“Entre os impactos dessa política, certamente aumentará as diferenças raciais na educação, dado que a taxa de vacinação para os alunos negros dos 12 aos 17 anos está abaixo de 60%”, disse Janaiha Bennett, diretora executiva da Fundação da Liderança Jovem, na Newsweek. “E isso seria um desastre absoluto”, comentou.
Washington D.C. é um dos poucos lugares do país que exigem a vacinação contra o coronavírus para ter aulas em escolas do primário (não acontece o mesmo nas universidades), mas há outros exemplos.
Nova Orleans, em fevereiro, adicionou as vacinas contra Covid à sua lista de inoculações obrigatórias para crianças a partir dos cinco anos, informa o Washington Post, enquanto a cidade de Nova York exige que os alunos estejam vacinados se quiserem praticar esportes ou participar de outras atividades extracurriculares.
‘Quem decidirá?’
É estranho. Por um lado, temos países europeus que se recusam a dar vacinas de Covid para crianças pequenas, mesmo que os pais queiram vaciná-las. Por outro lado, temos cidades americanas forçando as crianças a tomar uma vacina que os pais podem rejeitar enfaticamente como um pré-requisito para ir à escola (ou praticar esportes).
O denominador comum, aqui, não é difícil de enxergar: em ambas as situações, as autoridades do governo é que decidem o que é melhor para a criança. Há paralelos interessantes a esse respeito.
Em maio, contei a respeito da falta de leite em pó para bebês e notei que o New York Times classificou o produto como um dos mais regulados dos Estados Unidos. Os EUA não estão sozinhos nisso. Países europeus também têm mercados altamente regulados de leite para bebês. O resultado meio cômico é que quase todas as marcas de leite para bebês são reprovadas nos padrões europeus, e praticamente todas as marcas da União Europeia são reprovadas nos padrões americanos.
Quem faz o melhor leite em pó para bebês, a União Europeia ou os Estados Unidos? Como eu disse na ocasião, essa é a pergunta errada.
“A pergunta mais básica não o que é melhor, mas quem decidirá o que é melhor”, lembra-nos o economista Thomas Sowell.
O mesmo pode ser dito a respeito das vacinas. A questão não é se as crianças ou os adultos devem receber as vacinas contra Covid, a questão é quem vai decidir. Em todo lugar que se olhe, os governos e os burocratas estão tentando fazer essa decisão pelos outros. Alguns estão dizendo que não podem dar vacinas de mRNA para crianças; outros estão dizendo que as crianças têm que tomar as vacinas de mRNA.
Já é ruim quando os governos estão decidindo que tipo de leite em pó para bebês devemos comprar, mas pode-se dizer que é pior quando os governos estão decidindo que deve ou não pode tomar uma vacina que tem o poder de salvar vidas e de ceifar vidas. O fundamento do consentimento informado é que as pessoas tenham informações e depois possam escolher ou rejeitar o tratamento. É uma das bases da ética médica, mas parece que foi jogada para escanteio durante a pandemia.
Por quê?
Sem dúvida, uma razão para isso é que a pandemia criou um clima de medo, que por sua vez pode criar uma demanda pela coerção. Mas suspeito que o recuo da escolha também venha de um recuo cultural mais amplo do capitalismo, um sistema que faz dos consumidores soberanos, em vez dos burocratas.
“Os verdadeiros chefes, no sistema capitalista da economia de mercado, são os consumidores”, escreveu o economista Ludwig von Mises em seu livro Burocracia. “Ao comprar ou se abster de comprar, eles decidem quem deve ter posse do capital e cuidar das fábricas. Eles determinam o que deve ser produzido, e em qual quantidade e qualidade. Suas atitudes resultam em lucro ou em perda para o empreendedor”.
Por décadas, os americanos abraçaram lenta e silenciosamente, e talvez de forma inadvertida, outro sistema. Nesse sistema, as autoridades do governo decidem qual manteiga é “segura”. Qual leite pode ser comprado e consumido. Que tipo de carro é bom para o meio-ambiente e, portanto, disponível para compra.
Em vez de adotarem um sistema baseado na escolha individual e na troca mútua, os americanos tacitamente adotaram um sistema que permite que os burocratas decidam por eles — inclusive quem pode ou não pode (ou deve) tomar uma vacina com poderes de mudar vidas. (É digno de nota que tínhamos vacinas desde o começo da pandemia de Covid, mas a FDA [Administração de Alimentos e Drogas] proibiu ensaios clínicos que poderiam ter demonstrado a sua segurança e eficácia em poucas semanas.)
Ao redor do globo as pessoas continuam a entrar em bate-bocas sobre a segurança e eficácia das vacinas. Deveriam buscar responder a uma questão diferente: quem deve decidir?
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Jon Miltimore é editor administrativo de FEE.org. Seus textos e reportagens já figuraram em publicações como Time, The Wall Street Journal, CNN, Forbes, Fox News e Star Tribune. Escreve para a Newsweek, The Washington Times, MSN.com, The Washington Examiner, The Daily Caller, The Federalist e Epoch Times.