Lula e Maduro se encontraram em Brasília em maio de 2023: apoio a ditaduras.| Foto: Marcelo Camargo/Agência Brasil
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O primeiro parágrafo do Estatuto do Partido dos Trabalhadores (PT) afirma que a sigla defende a "democracia" e a "pluralidade". Mas nem sempre fica claro o que o partido quer dizer com isso. Não faltam exemplos recentes de ocasiões em que o PT expressou apoio a ditaduras de esquerda mundo afora.

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O último dele veio na segunda-feira (29), quando o partido divulgou uma nota parabenizando o ditador Nicolás Maduro por obter o terceiro mandato apesar dos indícios de fraude nas eleições na Venezuela e do caráter autoritário do regime chavista.

“O PT saúda o povo venezuelano pelo processo eleitoral ocorrido no domingo, dia 28 de julho de 2024, em uma jornada pacífica, democrática e soberana”, diz o comunicado do partido.

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Desde a sua fundação, em 1981, o Partido dos Trabalhadores tem expressado sua simpatia por regimes autoritários de esquerda — embora o nível de entusiasmo varie com o tempo. Conheça melhor seis exemplos.

1. Rússia

Quando o ditador russo Vladimir Putin obteve o quarto mandato no comando da Rússia em eleições de fachada, no ano passado, ele ganhou os parabéns do PT.

“Com uma participação impressionante de mais de 87 milhões de eleitores, representando 77% do eleitorado do país, esse feito histórico ressalta a importância do voto voluntário na Rússia”, afirmou a nota divulgada pelo partido, que ignorou as muitas evidências de manipulação no processo eleitoral. Pior: a declaração simpática a Putin se deu depois da agressão russa à Ucrânia.

2. China

Movidos por um pragmatismo e em busca de benefícios econômicos, muitos grupos políticos ao redor do mundo evitam condenar diretamente o autoritarismo do regime chinês. Mas o PT é diferente: a sigla apoia justamente o que o regime chinês tem de pior.

“O que eu vejo aqui, inclusive na organização do partido e da sociedade, é uma democracia e uma participação nos extratos mais baixos da sociedade aos mais altos no desenvolvimento do país", disse a presidente do PT, Gleisi Hoffmann, em uma visita à China neste ano.

A líder petista estava no país para formalizar um convênio entre o Partido Comunista da China e o PT.

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3. Cuba

A parceria entre o PT e o regime comunista de Cuba é antiga. Lula e Fidel Castro fundaram, juntos, o Foro de São Paulo. A organização, criada em 1990, agrega partidos e movimentos de esquerda da América Latina.

A simpatia também se refletiu no governo Dilma, que criou o Mais Médicos — programa que, a pretexto de trazer médicos cubanos para o Brasil, enviava 80% do salário desses profissionais diretamente à ditadura cubana.

Mas a aliança não é apenas um resquício histórico. Há apenas quatro meses, o PT firmou um intercâmbio de cooperação e troca de experiências com o Partido Comunista de Cuba.

Desde 1959, a ilha vive sob o controle do regime comunista, que persegue dissidentes e impede o surgimento de partidos de oposição.

4. Coreia do Norte

Em 2013, o PCdoB divulgou uma carta de apoio explícito ao regime mais autoritário do mundo. O texto, que foi enviado ao embaixador da Coreia do Norte no Brasil, assegurava "total, irrestrito e absoluto apoio e solidariedade à luta do povo coreano" contra o "imperialismo" americano.

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A carta tinha a assinatura de outros partidos de esquerda — inclusive o PT, aliado histórico co PCdoB. Com a repercussão do caso, o então presidente do PT, Rui Falcão, disse que não havia autorizado a adesão do partido ao manifesto.

Mas, no mesmo ano, outra voz petista afagou o regime norte-coreano. O deputado Sibá Machado (PT-AC), que chegou a ser líder do PT na Cãmara dos Deputados, afirmou que Cuba merece elogios por suas relações com a Coreia do Norte e o Irã.

“Nós somos favoráveis, é a posição do nosso partido, ao governo cubano. É um governo – e um partido – que tem procurado uma relação diplomática com todos os países do mundo, inclusive o Irã, inclusive com a Coreia do Norte, chamando para o caminho da paz e da solidariedade. Agora, todos os regimes e sistemas de governo e economia do mundo têm seus prós e seus contras”, disse Sibá.

5. Nicarágua

Em 2021, o ditador da Nicarágua, Daniel Ortega, estendeu seu mandato em uma eleição amplamente condenada como fraudulenta. Sete candidatos de oposição foram presos durante o processo eleitoral. Mas, para o PT, tudo correu bem.

O partido publicou um comunicado saudando as eleições democráticas e afirmando que o resultado revela “o apoio da população a um projeto político que tem como principal objetivo a construção de um país socialmente justo e igualitário”. Mais tarde, a presidente da sigla, Gleisi Hoffmann, recuou e retirou a nota do ar. 

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O próprio Lula, entretanto, já deu declarações públicas em favor do ex-guerrilheiro Ortega, que está no poder desde 2007. No ano passado, o governo brasileiro se recusou a assinar uma carta denunciando as violações de direitos humanos na Nicarágua. Cinquenta e cinco países endossaram o documento. Dentre eles, estão a Colômbia e o Chile, que são governados por partidos de esquerda.

6. Venezuela

O regime de Hugo Chávez, antecessor de Nicolás Maduro, teve no governo Lula um aliado para todas as horas. Em 2005, o petista chegou a dizer que a Venezuela tinha "excesso de democracia".

A proximidade entre o PT e a ditadura venezuelana continuou na gestão de Dilma Rousseff e no atual mandato de Lula. No ano passado, o petista disse que a Venezuela "tem mais eleições que o Brasil".

Lula chegou a dizer que existe “democracia até de mais” na Venezuela. Desta vez, entretanto, o governo parece ter adotado uma postura mais cautelosa, e pediu que o regime venezuelano dê transparência às atas de votação.

O que é uma ditadura

A justificativa dos apoiadores de ditaduras é a noção de que a democracia é um termo flexível, que pode incluir da China à Suíça.

Mas os estudiosos do assunto concordam que, para ser uma democracia, um país precisa ter eleições livres (nas quais a oposição pode participar em pé de igualdade) e respeito aos direitos individuais.

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Há décadas os cientistas políticos desenvolveram indicadores objetivos que medem o grau de democratização do país. Um desses rankings é o da Freedom House, uma organização não-partidária com sede em Washington. Na classificação mais recente, a Venezuela aparece com apenas 15 pontos de 0 a 100. Na sub-categoria “Direitos Políticos”, o país recebeu nota 1, em uma escala de 0 a 40.

Na mesma publicação, de 0 a 100, Nicarágua (16 pontos), Cuba (12), Rússia (13), China (9), Coreia do Norte (3) são classificados como países “não-livres”.

Outro ranking amplamente utilizado por cientistas políticos, o do Instituto V-Dem, é produzido por pesquisadores da Universidade de Gotenburgo, na Suécia. Na versão mais recente do índice, Rússia, Venezuela, Nicarágua receberam a classificação de "autocracia eleitoral" — um regime autoritário que utiliza eleições como uma fachada. China, Cuba e Coreia do Norte aparecem como "autocracias fechadas", em que nem mesmo há a intenção de simular eleições competitivas.

Infográficos Gazeta do Povo[Clique para ampliar]