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Viúva sem sal: Marvel aposta na quantidade e se esquece da qualidade

"Viúva Negra", a mais recente produção da Marvel, traz mensagens feministas, uma trama sem sentido e tentativas frustradas de humor. (Foto: Divulgação)

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Quando Robin Williams estava na série “Mork & Mindy, suas improvisações eram tão constantes que os roteiristas desistiram de escrever suas falas e passaram a deixar páginas em branco no roteiro, com os dizeres “aqui Monk fala o que quer”.

Tenho certeza de que o roteiro de “Viúva-Negra”tinha umas trinta páginas em branco, apenas com os dizeres “aqui vão efeitos especiais sem sentido algum”. O filme tem perseguição. Tem explosões. Tem lutas. Carros explorem, capotam, caem pelas escadas e pessoas saem deles sem um arranhão. O filme tem uma cena de fuga da prisão com um helicóptero tão cheia de um vômito digital que suja tudo ao redor e que em nenhum momento chega a atrair a atenção do espectador. Se um filme tem que ser considerado o pior do Universo Marvel, “Viúva Negra” é um grande concorrente, embora seja difícil superar Vingadores: Era de Ultron” e “Thor: O Mundo Sombrio”.

O estranho é que, em vez de ser uma verdadeira história da origem da Viúva Negra (que morreu em “Vingadores: Ultimato”), o filme cava para si um lugar entre os dois filmes anteriores como se tivéssemos o dever de nos lembrarmos do que estava acontecendo na história em 2016. Não que isso importe; o filme não tem relação direta com qualquer coisa da saga e, portanto, é descartável, embora as cenas pós-créditos façam referência às novas obras da MCU TV que nunca vi. (É pedir demais, depois de 23 filmes, que tenhamos assistido a todos os episódios dos três novos programas da MCU TV. Acompanhar o universo Marvel está cada vez mais parecido com ter um segundo emprego).

A trama de “Viúva Negra” sugere que a série “The Americans” e “Missão: Impossível” tiveram um filho chamado “007 contra o Foguete da Morte”. A Natasha de Scarlett Johansson cresceu ao lado da sua irmãzinha falsa numa família falsa de Ohio composta por quatro agentes russos infiltrados com a missão de ficar de olho num laboratório da S.H.I.E.L.D. A mãe (Rachel Weisz), o pai (David Harbour) e a irmã de Natasha (interpretada como adulta por Florence Pugh) falam inglês perfeito no começo, mas depois começam a falar com um sotaque russo ridículo sem que haja qualquer motivo para isso, a não ser a vontade dos atores de se divertirem.

O filme é dirigido por uma mulher, a australiana Cate Shortland. Assim, como já aconteceu com “Aves de Rapina” e “Mulher-Maravilha 1984”, os críticos elogiarão “Viúva Negra” sabendo como isso os afetará (e eles têm excelentes motivos para temerem perder o emprego) e sabendo que certamente alguém perderá a cabeça e os acusará de misoginia. É mais fácil, portanto, fingir que se trata de um bom filme, que bela carreira você tem aí, criticozinho. Seria uma pena se algo acontecesse a ela.

Como esses outros filmes com mulheres, o filme precisa de um gancho sócio-político feminista para que “Viúva Negra” seja considerado socialmente relevante. No caso, o gancho é o de que as Viúvas são na verdade meninas sequestradas ou acolhidas depois de abandonadas, e posteriormente treinadas para serem agentes secretos letais por um mestre masculino. A mensagem é a de que as meninas são uma classe cruelmente vitimizada, embora também sejam fortes, sagazes e capazes de chutar traseiros. Queria que os roteiristas se esforçassem mais criando histórias e personagens interessantes, em vez de trabalharem em tramas tão comerciais, mas acho que neste tipo de produção a fronteira entre o roteirista e o marqueteiro não é das mais claras.

As Viúvas, portanto, são essencialmente um exército de fembots, mas sem a graça de “Austin Powers”. O sinistro senhor delas, Dreykov (Ray Winstone), que elas conhecem só no fim do filme, se orgulha de poder ativá-las quando quiser. Mas os inimigos dele têm acesso a um pó vermelho que as liberta da lavagem cerebral. Imagino que, depois de livres para alcançarem todo o seu potencial, as Viúvas entrem para um exército zumbi totalmente diferente controlado por outro poder sinistro: o TikTok.

O filme mostra a família de agentes russos de Natasha como heróis porque há algo ainda pior lá fora, mas isso cria um problema do tipo Irã-Iraque para a plateia: quem se importa com o lado vencedor se os dois lados são maus? O único elemento divertido do filme é a atuação de Pugh como Yelena, que luta e briga com a irmã mais velha em várias cenas cômicas. Yelena ao menos arranca risos ao tirar sarro da pose que Natasha (e a maioria dos outros heróis da Marvel) faz quando quer entrar chamando a atenção.

Enquanto isso, Harbour consome muito do filme tentando servir de saída cômica no papel de Alexei, cuja identidade heroica é a versão russa do Capitão América, o Guardião Vermelho. Abandonado numa prisão russa, o Guardião Vermelho deixou a barriga crescer e mal cabe em seu velho uniforme. Muitas cenas tentam arrancar risos por causa dessa vaidade dele, mas as piadas de tiozão parecem velhas. Quanto a Rachel Weisz, num papel comum de mãe de sitcom, ela está velha demais para vestir seu uniforme de couro preto. É algo que está abaixo da dignidade dela, ou ao menos eu queria que estivesse.

Assim como as cenas de comédia não são engraçadas, as cenas de ação não são emocionantes. Natasha nunca parece correr perigo. Ela tampouco parece estar se divertindo, graças ao olhar frio de Johansson. Para uma superespiã, ela é insuportavelmente tola e, ao longo do filme toda, há vários exemplos dessa tolice.

As cenas de perseguição em locações aleatórias (Ei, estamos no Marrocos! Ei, agora estamos na Finlândia!) que uma hora você não sabe mais quem está atrás de quem e por quê. E isso importa? Não. Simplesmente aproveite as batidas e explosões, se puder. Afinal, ao menos são batidas e explosões feministas!

O filme tem um adversário disfarçado que vem e vai, o que leva a uma reviravolta surpreendente que não é nada surpreendente. E tem ainda um papo sobre uma caixa com tubos de ensaio que todos querem. A julgar pela intermitência das referências a esses frascos, acho que os roteiristas não estavam dando bola para eles. Se bem que eu também não.

A verdade é que nada parece muito certo desde que o Homem de Ferro morreu, não é mesmo? Desde “Vingadores: Ultimato”, tudo o que a Marvel nos deu têm um quê de show menor. Hoje em dia, a Marvel privilegia a quantidade e nem tanto a qualidade. A série milagrosamente nos tornou emocionalmente ligados a vários personagens interessantes, mas hoje em dia está se transformando numa mera fábrica que produz coisas.

A Marvel fazia com que sentíssemos que não podíamos perder um único episódio da saga. Hoje ela promove horas de um entretenimento cada vez menos interessante por mês. É difícil acompanhar tudo e não há um motivo para tanto.

Kyle Smith é membro do National Review Institute e critico cultural da National Review.

©2021 National Review. Publicado com permissão. Original em inglês 

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