No começo do mês, o colunista de humor do Washington Post, Gene Weingarten, escreveu uma coluna intitulada “Você não pode me obrigar a comer essas coisas”, sobre o fato de ele não gostar de vários tipos de culinária, produtos e temperos, como vinagre balsâmico, anchovas e pickles. Weingarten escreveu sua coluna usando um tom autodepreciativo, pondo-se no lugar de um chato troglodita.
Uma das culinárias da qual Weingarten zombou foi a indiana, elogiando o subcontinente por suas gloriosas contribuições ao mundo, mas brincando com o fato de não gostar de curry.
Ele descreveu a comida indiana como “única culinária étnica do mundo baseada insanamente num único tempero” e brincou, dizendo que gostar de comida indiana se resume a gostar ou não de curry: “Se você acha que o curry tem gosto de carne podre, você não gosta de comida indiana”.
Sei por experiência própria que a comida indiana usa vários ingredientes e temperos. Curry é um termo genérico e ocidental para uma mistura de temperos que se aproximam do sabor indiano – e é delicioso. Assim que li o texto na edição dominical do Washington Post, discordei em silêncio – afinal, o gosto é subjetivo – e segui com a minha vida.
Talvez eu pudesse entender alguém que mandasse um e-mail ou escrevesse um tuíte reclamando do texto ou defendendo a honra da culinária indiana. Mas a repercussão desse texto de apenas 125 palavras assumiu a forma da mais preguiçosa das críticas contemporâneas: uma absurda acusação de racismo.
A primeira a acusar foi a apresentadora e recém-proclamada porta-voz de todos os indianos Padma Lakshmi, que, “em nome de 1,3 bilhão de pessoas”, disse “vá se ferrar!”. Ela se perguntava se esse era o tipo de “piada colonizadora” que o Post permitia. Uma piada “ridicularizando o curry como tempero único no qual toda a culinária indiana se baseia”.
Antes de mais nada, é improvável que todos os indianos gostem da culinária de sua terra natal. Sou judeu e prefiro comer chouriço a comer arenque com pepino. Boa parte da culinária judaica norte-americana é lixo, e você não é antissemita por dizer o óbvio. Também é extremamente improvável que a maioria dos indianos que vivem nos Estados Unidos, uma minoria bem-sucedida e confiante, se sentisse mortalmente ofendida por uma piada sobre curry.
Além disso, quem é que fala assim? Não conheço Weingarten pessoalmente, mas o perfil dele na Wikipedia me diz que ele cresceu no Bronx, filho de um contador e uma professora. A única coisa que ele “colonizou” foi um subúrbio de Washington. Será que Lakshmi acredita que os Weingarten do Bronx são descendentes do vice-rei britânico? Ou será que ela está acusando os Weingarten do Bronx de terem colonizado os Estados Unidos, onde ela também vive? Ou será ainda que todo branco norte-americano é um colonizador histórico? A mim me parece que esse tipo de retórica genérica é mais ofensivo do que rir de um tempero.
A parte mais preocupante do incidente, porém, foi quando o Post publicou um “erramos” no alto da coluna, para o caso de alguém se revoltar pelo curry: “Uma versão anterior deste artigo afirmava incorretamente que a culinária indiana se baseia apenas num tempero, o curry, e que a comida indiana é composta apenas por ensopados temperados com curry. Na verdade, a diversificada cozinha indiana usa muitos tipos de temperos e inclui outros pratos. O artigo foi corrigido”.
Peço desculpas a Weingarten, mas a verdade é que o esclarecimento é muito mais engraçado (ainda que não intencionalmente) do que o texto original. Afinal, os editores do Post corrigiram uma piada.
Weingarten também escreveu um tuíte penitente, dizendo que “a coluna era sobre o reclamão infantil e ignorante que sou. Deveria ter citado um único prato indiano, não toda a culinária, e agora entendo como essa generalização foi ofensiva. Peço desculpas. Aliás, curries são misturas, não temperos”. Meu Deus! Como ele poderia escrever um texto de humor sem usar de hipérbole sem um objeto para zombar?
Como Tim Carney mostrou em 2011, Weingarten já chamou os donos de armas de “caipirões que gostam de achar que estão protegendo seus lares contra ladrões desesperados por roubarem seus sofás pulguentos”. É uma generalização estúpida que jamais seria corrigida, e nem deveria. Escritores, sobretudo os de humor, usam caricaturas e generalizações o tempo todo.
Se é possível zombar das dezenas de milhões de donos de armas de fogo, deveria ser possível rir de quem gosta de chana masala. Os norte-americanos não deveriam ser divididos entre os risíveis e não-risíveis. Mas se a imprensa continuar cedendo a reprimendas mal-humoradas como a de Padma Lakshmi, este será o nosso futuro.
David Harsanyi é redator da National Review.
©2021 National Review. Publicado com permissão. Original em inglês
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