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Perante o aumento das condutas suicidas entre os jovens nos últimos anos, tornou-se ainda mais urgente encontrar iniciativas eficazes de prevenção. Em vários países da Europa, uma iniciativa deu resultados muito bons. É conhecida como YAM, e em breve chegará à Espanha.
Segundo um relatório recente da Unicef, a cada ano, em todo o mundo, cerca de 45.000 jovens entre dez e 19 anos tiram a vida. A grande maioria (35.000) depois de fazer 15 anos.
Na Espanha, tanto a ideação suicida como os suicídios consumados são menos frequentes, em relação à sua população, do que a média europeia. Ainda assim, os dados dos últimos anos são preocupantes. O Instituto Nacional de Estatística publicou recentemente os dados referentes a 2021. Nesse ano, tiraram a vida 22 menores de 15 anos, a cifra mais alta da série. Os suicídios também aumentaram na faixa dos 15 aos 29 anos: foram 16 mortes a mais que em 2020, o que também implica um aumento significativo, ainda que menor em relação ao total.
Outra fonte interessante de dados é a Fundación ANAR, que conta com o principal telefone de assistência para esses casos. De acordo com seu último relatório, as chamadas de jovens com ideação suicida ou tentativa de suicídio se multiplicaram por 25 na última década. Cada vez mais, predominam as realizadas por meninas, especialmente entre os 13 e os 17 anos.
Uma abordagem nova
Os especialistas no assunto reforçam a necessidade de contar com estratégias de prevenção avalizadas pela experiência e, se possível, replicáveis em grande escala. Em 2015, o SEYLE (Saving and Empowering Young Lives in Europe), um projeto de doze países europeus para reduzir as condutas suicidas através de intervenções no âmbito escolar, publicou um estudo no qual se comparava a eficácia de três abordagens. Ao todo, participaram mais de 11.000 alunos escolares de distintos países, os quais foram divididos em quatro grupos: um para cada abordagem, mais um grupo de controle.
Das estratégias de prevenção testadas numa pesquisa europeia, só a YAM conseguiu melhoras significativas
Uma das abordagens testadas foi a QPR (sigla de Question, Persuade and Refer, ou Questionar, Persuadir e Encaminhar), que consiste em formar adultos para poderem detectar sintomas de ideação suicida, conscientizar do risco a quem os sofre e encaminhá-los para um especialista. O segundo modelo foi a atenção clínica "tradicional", levada a cabo por psiquiatras profissionais. Embora ambas as estratégias tenham conseguido reduzir ligeiramente as condutas ou as ideações suicidas, as diferenças com respeito ao grupo de controle não foram relevantes.
Por outro lado, a terceira abordagem de fato conseguiu uma melhoria significativa. Essa estratégia, conhecida como YAM (Youth Aware of Mental Health, Consciência Jovem da Saúde Mental) e desenvolvida pelo Instituto Karolinska da Suécia, consiste em juntar vários jovens de uma mesma escola para que conversem sobre temas relacionados à saúde mental durante cinco sessões de 50 minutos. Dois adultos formados no método guiam a reunião, mas deixam uma grande margem de atuação para os próprios estudantes, porque se trata de criar um contexto deliberadamente informal de maneira que se sintam relaxados e confiantes para se expressarem sem medos. Nalgumas sessões se utiliza a metodologia do "jogo de papéis"; noutras, a conversa parte de materiais compartilhados pelos adultos: slides, cartazes ou textos.
Menos condutas suicidas, mais pedidos de ajuda
Segundo os dados publicados no estudo, doze meses depois da intervenção, as taxas de tentativa de suicídio e de ideação suicida severa entre os participantes dessa estrategia foram 50% menores do que as do grupo de controle. A prevalência de quadros depressivos também se reduziu em 30%.
Embora seja verdade que essa investigação conta com algumas limitações estatísticas – a principal, não levar em conta as condutas suicidas prévias dos participantes –, outras características (o tamanho da amostra, o sorteio dos estudantes para cada grupo, ou o controle de múltiplos fatores demográficos) fazem dela uma fonte de informação muito relevante. Desde a sua publicação, o método YAM foi aplicado em muitos países. Na Europa, a Suécia é a mais adiantada; mas também se desenvolveu na Noruega, Reino Unido e Áustria. Não obstante, ainda não foram publicados os resultados desses programas nacionais.
Mas os dos Estados Unidos (2020) e da Austrália (2021) foram. A amostra dos participantes foi muito menos numerosa do que no estudo europeu (uns 500 estudantes em cada estudo). Por outro lado, diferentemente deste, a eficácia do programa YAM não foi medida nos experimentos norte-americano e australiano com relação a um grupo de controle, que não existia, mas sim em comparação ao histórico psiquiátrico prévio dos estudantes, que agora os pesquisadores levaram em conta.
Em ambos os casos, os resultados foram muito positivos. Os estudantes australianos que participaram das sessões YAM mostraram uma redução significativa quanto à ideação suicida e às crises depressivas. Os dos Estados Unidos melhoraram muito suas atitudes acerca da saúde mental própria e alheia: estavam mais dispostos a falar dela com amigos e adultos, a buscar ajuda quando precisaram e também melhor preparados para reconhecer os sintomas tanto em si mesmos como nos outros.
Galícia, pioneira na Espanha
Até agora, na Espanha não se havia desenvolvido plenamente um programa YAM (embora alguns jovens tenham sido selecionados para o estudo europeu), mas recentemente a Xunta de Galicia [Junta da Galícia] anunciou sua intenção de aplicá-lo no próximo curso. A implementação se propõe a ser um teste clínico no qual 2.000 alunos do 4º ano da Educação Secundária Obrigatória receberão a intervenção e outros 2.000 formarão o grupo de controle. Se os resultados forem positivos, se estenderá de forma progressiva ao resto dos estudantes do 4º ano da E.S.O., até chegar ao total de 20.000 participantes no ano letivo 2026-27.
Alejandro García Caballero, psiquiatra e coordenador dos programas de promoção da saúde mental na Xunta, será um dos principais líderes do projeto. Conhece em profundidade a estratégia YAM, e seus resultados noutros países.
Segundo García Caballero, implementador do YAM na Espanha, é preciso mudar o ideal de felicidade que a sociedade propõe aos jovens
Em declarações à Aceprensa, García Caballero confirma o aumento de casos de atenção hospitalar por tentativas de suicídio. No Servicio Galego de Saúde, as entradas de menores por essa causa triplicaram em 2021, em relação ao ano anterior. Ademais, dados do Instituto de Medicina Legal de Galicia do mesmo ano confirmam o aumento dos falecimentos (nove, frente a dois e cinco nos anos anteriores) e a mudança no perfil do suicida: agora predominam as meninas entre 16 e 17 anos.
Mudanças sociais na criação
Segundo García Caballero, esses fenômenos têm uma explicação multifatorial. Por um lado, o aumento da desigualdade econômica nas últimas décadas incidiu especialmente na saúde mental dos jovens de famílias desfavorecidas.
Outro fator a levar em conta é a incidência das telas. Sua importância fica clara no estudo recentemente elaborado por Antonio Rial Boubeta para a Unicef, cujo título é Impacto da tecnologia na adolescência. Dos mais de 50.000 adolescentes espanhóis entrevistados, aproximadamente um terço apresenta um uso viciado da internet, e um a cada dez recebeu propostas sexuais de um adulto por esse meio.
Por outro lado, a aceleração das mudanças puberais (início antecipado da adolescência) adianta a "despedida" dos pais e a identificação com o grupo de pares. Nos adolescentes, essa abdicação do referencial adulto é substituída pelos modelos ideológicos e de conduta das redes sociais, que impõem um novo “voluntarismo mágico” resumido no lema da Barbie: “Você pode ser tudo o que quiser.”
Um ideal maduro de felicidade
A isso é preciso acrescentar mudanças as profundas na subjetividade social. Se a adolescência, anos atrás, era um período de transição para a vida adulta, agora representa a etapa de referencia, também para os adultos (adultescentes), que passam a reger suas vidas com chaves como o imediatismo, a inconstância e o hedonismo, que servem aos ditados do consumo.
Esse modelo social que busca a felicidade imediata através do consumo e que promete fantasias que logo não se cumprem, leva os adolescentes a uma fragilidade extrema diante do fracasso, já que por um lado lhes foi prometido tudo e, por outro, a sociedade com frequência lhes lembra que "vão viver pior do que os seus pais", ou que a "mobilidade social" parou. Perante a incerteza quanto ao futuro (pois não se ensinou a postergar a recompensa, ou esta se mostra elusiva e distópica), só resta o agora; e quando este é doloroso (assédio, abuso, rejeição…), aparece a ideação suicida.
Devido à natureza social dessas mudanças, a solução passa por gerar um "contra-consenso" que desafie os consensos estabelecidos sobre a criação e o amadurecimento. Para isso, convém gerar espaços de reflexão grupal, tanto com adolescentes, como com progenitores e docentes. Isto é precisamente o que oferece o modelo YAM, e é a razão do seu êxito.
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