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Algoritmo da inteligência artificial do YouTube tem impedido criadores de canais históricos de falarem sobre acontecimentos "sensíveis" como o Holocausto e o genocídio em Ruanda
Algoritmo da inteligência artificial do YouTube tem impedido criadores de canais históricos de falarem sobre acontecimentos “sensíveis” como o Holocausto e o genocídio em Ruanda| Foto:

Vídeos publicados no Youtube e que condenam o Holocausto estão sendo desmonetizados. Alguns deles estão sendo retirados da plataforma. Até mesmo exposições didáticas sobre temas sensíveis, como a Waffen-SS, uma espécie de guarda pessoal ou milícia de Adolf Hitler, estão sendo “censuradas” no site. Ao que tudo indica, trata-se de um erro do algoritmo, mas reclamações neste sentido, feitas por criadores de conteúdo, são frequentes.

A Gazeta do Povo entrevistou dois donos de canais que sofreram e sofrem com o problema.

O primeiro é Marcelo Rios, dono dos canais Hoje na Segunda Guerra Mundial e Hoje no Mundo Militar, com 375 mil e mais de um milhão de inscritos, respectivamente. Desde 2015, ele produz conteúdo sobre eventos históricos com temática militar.

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Todos os vídeos do primeiro canal, além de produções com temas como terrorismo, Israel e Síria no segundo, foram desmonetizados. Isto é, os vídeos não são remunerados na plataforma de acordo com a quantidade de visualizações. “Sou obrigado a pedir sempre uma avaliação manual que leva, em média, de 24 a 72 horas para ser feita”, reclama.

Mas não se trata apenas de uma questão de dinheiro. “Um vídeo que produzi sobre a história da suástica foi proibido pelo YouTube em grande parte dos países europeus. E, recentemente, um vídeo sobre a marcha "Erika", de origem alemã, contando a história de um soldado que sonhava em voltar para casa e reencontrar a sua esposa, foi excluído sob a alegação de difundir ‘discurso de ódio’, conta.

Filipe Figueiredo, colunista da Gazeta do Povo, produz conteúdo sobre política e filosofia para o canal Xadrez Verbal desde 2015, além de roteirizar conteúdo para outros canais, como o Nerdologia, com quase dois milhões e meio de inscritos.

Ele conta que o YouTube desmonetizou quase todos que falam de política e também que tratam de temas históricos sensíveis, como o genocídio em Ruanda e o Holocausto. “Um vídeo em que  busco refutar algumas teorias conspiracionistas que negam a ocorrência do Holocausto foi retirado do ar por duas vezes”, complementa. Figueiredo defende que a plataforma deveria ser menos automatizada e mais transparente.

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Ambos entendem que o trabalho realizado pelo Youtube, de buscar coibir conteúdos nocivos e considerados impróprios, é relevante para a própria sustentabilidade da plataforma, mas que o processo precisa ser melhorado.

“É importante que o YouTube atue de forma ativa para evitar a divulgação de conteúdo deletério, mas não saber diferenciar ‘discurso de ódio’ de ‘conteúdo histórico’ é altamente preocupante, porque pode colocar em risco canais como o Hoje na Segunda Guerra Mundial, que trata de temas vistos como ‘sensíveis’ pelo YouTube, como a guerra, o nazismo e o fascismo”, diz Marcelo.

“Se um vídeo sobre uma marcha popular foi apagado sob a alegação de se tratar de discurso de ódio, o que não poderão fazer com vídeos históricos tratando, por exemplo, das Waffen SS, do Holocausto ou dos massacres cometidos durante aquele conflito? Essa forma de atuação acaba desmotivando criadores sérios de conteúdos históricos, que temem sanções por parte do YouTube”, desabafa.

Desafios para a inteligência artificial

Procurada, a assessoria do Youtube não respondeu o contato da Gazeta do Povo. Contudo, desde o início de 2017 ocorreram diversos casos polêmicos que podem ajudar a explicar os problemas enfrentados pelos criadores de conteúdo no site e as tentativas da plataforma de melhorar o serviço.

O jornal The Times publicou, em fevereiro daquele ano, matéria mostrando que anúncios de grandes marcas estavam aparecendo em vídeos do YouTube com conteúdo sensível e que poderiam ser considerados discursos de ódio. Um dos casos mais notáveis ocorreu com canal com mais inscritos no mundo, o PewDiePie: ele fez um vídeo com piadas de conotação antissemita, para a revolta da comunidade judaica e das marcas que acabaram associadas ao vídeo.

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A partir daí, surgiu um grande debate sobre os limites do YouTube. Agências de publicidade europeias se opuseram à ideia de continuar anunciando na plataforma enquanto ela não criasse mecanismos para impedir a associação de grandes marcas a canais que produzissem conteúdos impróprios. Mais de 250 empresas em todo o mundo, incluindo Toyota e HSBC, encerraram acordos comerciais com o YouTube. Se outras empresas aderissem à iniciativa, o boicote poderia representar uma perda de até US$750 milhões, ou 7,5% da receita bruta do YouTube.

O YouTube, então, anunciou que estava trabalhando na criação de uma inteligência artificial que resolveria esse problema. A nova tecnologia seria capaz de assistir, entender, interpretar e perceber se havia algum discurso de ódio nos vídeos publicados, além de diferenciar piadas de agressões e até mesmo distinguir conteúdo artístico, como um filme, de um registro de um tiroteio em uma favela, por exemplo.

O processo todo, contudo, ainda é bastante imperfeito. Ainda em 2017, ocorreu o episódio que ficou conhecido como “Elsa Gate”. Vídeos com a personagem do filme Frozen, da Disney, foram utilizados em produções pornográficas ou eróticas. Em resposta, as produções relacionadas a Elsa foram desmonetizadas, mesmo as voltadas ao público infantil.

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Apesar dos esforços para evitar a propagação de “discursos de ódio”, em fevereiro de 2019 novas empresas deixaram de anunciar no YouTube depois da denúncia de que havia uma rede de comentaristas pedófilos operando nas seções de comentários de vídeos voltados ao público infantil.

A Era da Informação, com o conhecimento ao alcance de um toque, parece estar diante de novos desafios cada mais vez complexos.

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