Sofrer discriminação social dos vizinhos devido à renda soa como algo ultrapassado, mas é a realidade de muita gente como Luiza.A dona de casa, que pede para não ser identificada para não sofrer represálias, relata seu dia a dia no condomínio onde vive há seis anos com o marido e três filhos: ela diz que a família tem sido destratada pelos outros moradores e que, mesmo requisitando, não consegue ter acesso às contas do condomínio.
No prédio antigo, de poucos apartamentos, todos são proprietários há muitos anos e somente a família de Luiza tem o imóvel financiado. Aparentemente, os vizinhos têm renda mais alta do que a família da dona de casa.
"Meus filhos estudam em colégio público. Nós optamos por adquirir um apartamento usado e bem localizado em vez de comprar carro", explica. "Financiamos nosso apartamento, mas acredito que isso não nos torna ´menos moradores´, nem com menos direito do que os outros", afirma.
Questionamentos
Luiza sente que, nas reuniões de condomínio, suas opiniões e questionamentos são rechaçados ou ignorados. A dona de casa afirma que ouviu comentários preconceituosos mais de uma vez.
"Sempre que pergunto sobre algum gasto que não estava previsto, ou peço nota fiscal e recibos, falam que eu deveria estar morando em outro lugar, já que acho o condomínio caro", conta Luiza. "Consigo pagar a taxa, mas questiono as despesas que fogem à regra e que não estão bem explicadas".
Ela diz que o que a incomoda são as despesas eventuais e inesperadas do condomínio, que acabam aumentando o valor da taxa, com muitas variações mensais. "O cargo de síndico é ocupado sempre pelas mesmas pessoas", observa.
Desconfiança
Luiza afirma que, quando pede mais de um orçamento para obra ou reparo no prédio, se sente tratada com desconfiança. Quando falou sobre a contratação de uma empresa administradora para profissionalizar a gestão do condomínio, relembra, a sugestão foi rechaçada.
Julio Cesar Herold, gerente de condomínios da Auxiliadora Predial, diz que focos de discriminação ou situação vexatória devem ser evitados e eliminados pelos síndicos.
No entanto, na vida em condomínio, que exige uma série de ajustes entre vizinhos, esse tipo de situação ainda é vista como normal, comenta. "Infelizmente, vemos muitas situações como essa. Mas é papel do síndico evitar esse tipo de ocorrência, conversando com os envolvidos, sem alarde e sem expor ninguém".
Repercussão
Para que uma situação desagradável no condomínio passe às vias judiciais, é preciso que gere grave repercussão psicológica no indivíduo, explica a advogada Vanessa Ponciano.
"Não basta um simples aborrecimento ou abalo para configurar o direito a indenizações. É preciso que se caracterize um vexame ou humilhação que fuja da normalidade, que gere grave repercussão psicológica no indivíduo. É assim que os tribunais têm decidido", observa a especialista em direito imobiliário.
Síndico tem que apresentar despesas
Quem mora em condomínio tem o direito de acompanhar as contas do prédio. "Se aparecem gastos excessivos, não comprovados nem aprovados, os condôminos devem se reunir e tomar medidas para que o síndico preste esclarecimentos e apresente modificações", explica Leonardo Oliveira, da Administradora Manager.
Por outro lado, é importante que síndicos e administradores respeitem os princípios individuais garantidos constitucionalmente. "O síndico jamais deve utilizar expedientes vexatórios ou constrangedores, como afixar um rol de inadimplentes com o nome dos devedores ou proibir a utilização de determinados serviços do condomínio", aponta o administrador. A pessoa prejudicada poderá tomar medidas judiciais contra o condomínio.
Antes de adquirir um imóvel, é fundamental que o comprador se informe sobre a vida do condomínio. Solicitar os documentos que regem o convívio, falar com o síndico sobre o dia a dia entre vizinhos e também conhecer as formas de rateio do condomínio são iniciativas recomendáveis.
"Dessa forma pode-se evitar surpresas desagradáveis, lembrando que é muito importante a participação dos condôminos em assembleia, principalmente quando os itens da pauta se referem à aprovação de alguma despesa", ressalta Oliveira. Depois de aprovadas, as despesas geram responsabilidades a todos os condôminos, independente de sua participação na assembleia, diz o administrador.
Despesas
Há dois tipos de despesas nos condomínios. As ordinárias são, normalmente, as despesas fixas, destinadas à manutenção e conservação do dia a dia do condomínio e das áreas comuns. Elas estão no orçamento e são aprovadas em assembleia geral ordinária.
As despesas extraordinárias visam suprir algo inesperado ou valorizar o condomínio, embelezando e tornando as áreas comuns mais agradáveis e seguras. Pintura de fachada, indenizações trabalhistas, reformas e ampliações, instalação de sistema de segurança, projetos de paisagismo e decoração e o fundo de obras entram nessa categoria.
Despesas dessa categoriadevem ser previamente aprovadas em assembleia extraordinária com exceção das urgentes, que podem ser realizadas pelo síndico e posteriormente comunicadas e esclarecidas aos condôminos.