Obra
Construção em escala compromete qualidade
O boom pelo qual passou o mercado imobiliário nos últimos anos é um dos aspectos que interfere na qualidade final dos imóveis. Euclésio Finatti, vice-presidente de área técnica do Sindicato da Indústria da Construção Civil no Paraná (Sinduscon-PR), explica que o aumento da demanda fez com que novas empresas e terceiros, muitas vezes sem conhecimento técnico, investissem no setor. "Não tem como exigir qualidade de trabalhadores não qualificados para tal. Nesse grupo da informalidade há um número razoável de obras mal feitas", diz.
Para Lincoln Fedato, engenheiro civil e diretor técnico da Engevita, o excesso de terceirização adotado pelos grandes empreendimentos é outro ponto a ser destacado. "No que se refere à execução, por exemplo, é preciso integrar e treinar melhor a mão de obra básica para que ela possa aplicar os materiais de forma correta ", afirma.
Atrasos no cronograma também interferem na qualidade, principalmente nas questões relacionadas ao acabamento. Finatti explica que, como os financiamentos têm relação com as fases executadas, no final da construção as empresas podem acelerar alguns processos, como pinturas realizadas antes que o reboco esteja seco, por exemplo, o que traz prejuízos para o resultado final.
Para minimizar os incômodos que podem surgir com a aquisição do imóvel é pesquisar o histórico da empresa responsável pela obra para verificar sua idoneidade e há quanto tempo atua no mercado. O proprietário precisa estar atento e conhecer os detalhes do memorial descritivo, que deve corresponder ao produto entregue pela empresa. "O cliente não pode contatar a construtora só quando tiver uma reclamação. É preciso que ele tenha uma participação ativa e permanente ao longo da obra", acrescenta Fedato.
Uma parcela considerável de pessoas que compraram um apartamento novo na capital está insatisfeita com a qualidade final do produto. A constatação é resultado de uma pesquisa de mestrado desenvolvida na Universidade Tecnológica Federal do Paraná (UTFPR) entre os meses de março e novembro de 2013. Numa escala de 1 a 5 na qual 5 significa muito satisfeito e 1 muito insatisfeito , a satisfação média dos entrevistados ficou em 3,2, segundo Rebecca Borba Cavassin, mestre em engenheira civil e autora do estudo.
Outro dado que chama a atenção na pesquisa é o grau de satisfação dos compradores, que é maior em relação às empresas que não contam com um sistema de gestão de qualidade, como o ISO 9001, do que entre aquelas que possuem a certificação. "Isso não significa que o sistema de gestão da qualidade é falho. As empresas precisam perceber, entretanto, que ele tem que estar na essência da organização, fazer parte dela como um todo", explica Rebecca.
Indicadores
Entre os itens em que há mais descontentamento estão a comunicação com a incorporadora ou construtora e a qualidade do produto final, que tiveram médias globais de 2,58 e 2,84, respectivamente. No primeiro quesito, a confiança no rápido atendimento das reclamações é o que mais pesa na avaliação dos clientes 49% dos entrevistados se disseram insatisfeitos com esse aspecto. A qualidade da execução técnica, que também incluiu as questões de acabamento do imóvel, gera descontentamento para 59% dos compradores ouvidos na pesquisa. "Percebe-se que o grau de insatisfação cresce de acordo com o tempo em que a pessoa adquiriu o imóvel; 62% dos que compraram há mais de três anos estão insatisfeitos, enquanto 55% dos que realizaram a compra há menos de seis meses estão satisfeitos", diz Rebecca.
Problemas
A experiência de Ana Claudia Krone comprova o fato mencionado pela pesquisadora. Desde que pegou as chaves do apartamento onde mora há dois anos e adquirido há quatro com o marido e dois filhos pequenos, Ana diz vivenciar uma sucessão de problemas.
A falta de impermeabilização das paredes e do piso do apartamento garden faz com que o mofo e a umidade apareçam em praticamente todos os cômodos, e nem a substituição da grama pela calçada na parte externa e as três pinturas realizadas com tinta antimofo resolveram a questão. "Na medida em que este e outros problemas surgiram, contratamos a vistoria de um engenheiro. Ele apontou falhas construtivas gravíssimas, que fazem com que estas ocorrências sejam crônicas", conta.
Ana acrescenta ainda que, apesar de a empresa custear parte dos reparos realizados, a comunicação entre as partes sempre foi complicada devido, inclusive, ao grande número de chamados emitidos para a construtora, já que os problemas também se repetiram em outras unidades do condomínio.
Opinião - Direitos e deveres dos compradores e construtoras
Gabriel Schulman, advogado e coordenador da pós-graduação em Direito Imobiliário da Universidade Positivo
Para evitar dor de cabeça, o primeiro passo é o cuidado na vistoria. Dependendo do imóvel, é recomendável que ela seja feita por um profissional habilitado, que tem o conhecimento técnico para identificar possíveis problemas.
Todos nós podemos verificar azulejos, piso, escoamento da água nas áreas molhadas e box. Orienta-se que o comprador teste os pontos de luz, interruptores, tomadas e interfones e acione descargas e chuveiros. Vale conferir também a abertura das portas e janelas.
Outra sugestão é guardar o material publicitário, o contrato e, principalmente, conhecer o memorial descritivo, que traz as especificações do imóvel (como produtos utilizados e metragens). Igualmente, é preciso ler o manual do imóvel para saber usar a casa nova.
A construtora é responsável por entregar o imóvel no prazo e nas condições combinadas. Encontrando um defeito, tire fotos e comunique a empresa por escrito (com protocolo ou e-mail) o comprador pode recusar o imóvel até que sejam solucionados os problemas. As falhas aparentes têm garantia de 90 dias, mas preferencialmente devem ser reclamadas antes da entrega das chaves. Quando não resolvidas de forma amigável, as questões podem ser levadas à Justiça.
Uma última dica: problemas relacionados a segurança e a solidez do imóvel tem 5 anos de garantia, mas a ação deve ser ajuizada em 180 dias após a descoberta.