Para o Direito, dois anos é pouco tempo. Toda nova lei demora bem mais que isso para se consolidar e não está sendo diferente com o novo Código Civil, promulgado em 2003. Ainda mais porque há uma série de conflitos entre o que diz o Código e as determinações da Lei. 4.591/64, a Lei dos Condomínios. De lá para cá, muitos administradores condominiais ficaram em dúvida sobre quais diretrizes seguir, principalmente no que diz respeito a um assunto delicado para todos: a inadimplência.
No último sábado, o desembargador Américo Isidore Angélico, do Tribunal de Justiça de São Paulo, veio a Curitiba ajudar a esclarecer as principais dúvidas de quem vive estes conflitos no dia-a-dia. "Hoje está claro que a Lei 4.591 está tacitamente revogada. Anteriormente, não se sabia se essa lei poderia ser usada ou não, mas agora se sabe que ela só vale para o que não estiver explicitado no Código Civil", explica. Ou seja, a Lei dos Condomínios passou a ser um instrumento de apoio, cobrindo apenas os pontos que não estão previstos pelo Código.
Tome-se o caso da multa por atraso no pagamento da taxa de condomínio. A Lei 4.591, que foi editada em 1964, previa 20%, mas o Código Civil estabeleceu 2%. Nesse caso, não há dúvidas: o que vale é a regra mais recente, ainda que o próprio juiz, que é presidente da 7.ª Câmara do Tribunal de Justiça de São Paulo, reconheça que dificulta o trabalho dos administradores. "Esse ponto trouxe uma briga terrível e o ideal era que permanecessem os 20%", afirma Angélico. Segundo ele, o fato de os outros condôminos terem de arcar com as despesas devidas pelo inadimplente inclui o condomínio em uma condição de "originalidade" para ele, forte o suficiente para justificar a exclusão da regra dos 2%.
Tratamento
Outro tema que mereceu a atenção do magistrado tem causado muita discussão no meio. Como tratar os condôminos inadimplentes? "A primeira restrição é a proibição de participar das assembléias e de votar", explica Angélico. Além disso, o desembargador lembra que o condomínio perdeu por um lado com a redução da multa por atraso de 20% para 2%, mas, por outro, ganhou o poder de aplicar multas extraordinárias ao devedor recorrente, que podem chegar a cinco vezes o valor da taxa condominial. Para isso, basta ter quórum de dois terços dos moradores na assembléia convocada para decidir a punição.
Adaptação
Para o vice-presidente de Condomínios do Sindicato da Habitação e Condomínios do Paraná (Secovi-PR), Dirceu Jarenko, a palestra foi uma ótima oportunidade para esclarecer pontos que ainda permaneciam envoltos em dúvida. "Ficou bem claro para nós, por exemplo, que a multa de 2%, mesmo sendo inadequada, deve ser cumprida", destaca. Jarenko diz acreditar que a solução para os administradores é se adaptar à nova realidade. Principalmente porque muitas vezes os números de inadimplência misturam dois tipos de condôminos. "A multa baixa estimula principalmente os atrasos. São pessoas que não ficam inadimplentes, mas simplesmente passaram a adiar o pagamento da taxa", analisa. Gente que não pode, na sua opinião, ser confundida com os inadimplentes contumazes.