"Acho que em qualquer época eu teria amado a liberdade; mas na época em que vivemos, sinto-me propenso a idolatrá-la"
(Tocqueville)
Entenda por que o aumento de gastos com BPC pelo Congresso foi feito de modo inconstitucional
Conforme noticiou a Gazeta do Povo:
“O Congresso derrubou na tarde desta quarta-feira (11) o veto do presidente Jair Bolsonaro ao projeto que aumenta o limite de renda familiar per capita para acesso ao Benefício de Prestação Continuada (BPC), que é pago a idosos e pessoas com deficiência. Com isso, o limite de renda para receber o BPC passa de um quarto de salário mínimo (R$ 261,21) para meio salário mínimo (R$ 522,50).
O impacto nas contas públicas será de R$ 217 bilhões em dez anos, segundo o secretário especial de Previdência e Trabalho, Bruno Bianco Leal, sendo R$ 20,1 bilhões neste ano e R$ 20,5 bilhões em 2021.”
Segundo outra matéria que comentou as consequências da manobra do Congresso:
“Se o governo não conseguir derrubar a medida na Justiça, a equipe econômica diz que terá de fazer um corte expressivo de verbas destinadas a investimento e custeio da máquina pública. O tamanho do contingenciamento pode chegar a R$ 37 bilhões, segundo a Instituição Fiscal Independente (IFI) do Senado Federal.
E o teto de gastos – mecanismo que impede que as despesas cresçam acima da inflação – pode ser rompido em 2021, quando o governo projeta que a despesa extra com o BPC vai aumentar em R$ 20,5 bilhões. A manutenção do teto é defendida com “unhas e dentes” pela equipe econômica e a sua quebra pode impactar na confiança nos investidores, aumentando o risco-país e trazendo outras consequências negativas para o ajuste fiscal em curso.”
A notícia da derrubada do veto caiu como uma bomba sobre a equipe econômica e Paulo Guedes afirmou que a economia irá se ressentir das disputas políticas. Ele afirmou: “Nós mesmos vamos derrubar nosso avião. Nosso avião estava começando a decolar, estava subindo. A economia mundial está em um outro evento, está em queda. O nosso está decolando. Já ficamos anos cá embaixo. Agora que começamos a decolar, nós mesmos vamos brigar a bordo para derrubar o avião.” A forma de atuação do Congresso, no caso concreto, foi brutalmente antipatriótica e descomprometida com o futuro do país.
O governo, no entanto, já afirmou que irá questionar a medida no STF. Ele tem toda a razão.
Confira conosco por que a ampliação de gastos pelos Congresso foi, realmente, feita de forma inconstitucional.
Constituição veda ampliação de gastos da assistência social sem a indicação da fonte de custeio
O benefício atingido pela decisão do Congresso Nacional foi o chamado “benefício de prestação continuada da assistência social”, em geral indicado pelo sigla BPC.
Ele está previsto no art. 203, inciso V, da Constituição, que cuida da assistência social:
Art. 203. A assistência social será prestada a quem dela necessitar, independentemente de contribuição à seguridade social, e tem por objetivos: (…)
V – a garantia de um salário mínimo de benefício mensal à pessoa portadora de deficiência e ao idoso que comprovem não possuir meios de prover à própria manutenção ou de tê-la provida por sua família, conforme dispuser a lei.
A assistência social é uma política inserida num gênero maior: a seguridade social. De fato, a seguridade social é um conjunto de políticas amplas que abrangem: a assistência, a previdência e a saúde. É o que prevê expressamente o art. 194 da Constituição:
Art. 194. A seguridade social compreende um conjunto integrado de ações de iniciativa dos Poderes Públicos e da sociedade, destinadas a assegurar os direitos relativos à saúde, à previdência e à assistência social.
Pois bem. O art. 195 da Constituição prevê uma série de regras sobre a forma de custeio da seguridade social como um todo. Assim, suas regras se aplicam a todos os ramos da seguridade, inclusive, à assistência.
Ocorre que o § 5º do art. 195 veda a criação ou qualquer forma de majoração de qualquer benefício da seguridade sem que se indique a respectiva fonte de custeio.
Confira:
§ 5º Nenhum benefício ou serviço da seguridade social poderá ser criado, majorado ou estendido sem a correspondente fonte de custeio total.
O dispositivo é cristalino. Um benefício, como é o BPC, pertencente à assistência e, portanto, à seguridade social, não poderia ter sido estendido a novos beneficiários sem que o ato de sua extensão indicasse a respectiva fonte de custeio. E essa fonte de custeio teria de ser total, ou seja, capaz de fazer frente à totalidade da expansão do gasto.
Ou seja, o Congresso no ato que resultou na ampliação de despesas teria de ter elevado algum tributo ou cortado alguma outra despesa, a fim de permitir a extensão do benefício.
No entanto, no caso, isso não foi atendido.
Logo, a medida do Congresso é inconstitucional e deverá ser derrubada pelo STF, inclusive, liminarmente, tendo em vista seus graves impactos para as contas públicas e, em consequência, para higidez financeira e econômica do país.
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