"Acho que em qualquer época eu teria amado a liberdade; mas na época em que vivemos, sinto-me propenso a idolatrá-la"
(Tocqueville)
Não basta Lula cumprir 1/6 da pena para progredir para o regime semiaberto
A progressão prisional é o instituto da execução penal que permite que o preso avance de um regime mais severo para outro mais brando (do fechado para o semiaberto, ou do semiaberto para o aberto).
A concessão desse benefício depende do preenchimento dos requisitos expressamente previstos em lei.
Em regra, a lei exige dois requisitos básicos:
- primeiramente, o cumprimento de determinada fração da pena. Essa fração varia de acordo com a espécie de delito que motivou a condenação (vide art. 112 da Lei de Execuções Penais – LEP, e art. 2º, § 2º, da Lei de Crimes Hediondos); ou de acordo com condições pessoais da pessoa condenada (por exemplo, “de mulher gestante ou que for mãe ou responsável por crianças ou pessoas com deficiência”, conforme previsão do § 3º do art. 112 da LEP).
- Em segundo lugar, a lei exige que o postulante à progressão ostente “bom comportamento carcerário“.
Esses são os requisitos básicos. Contudo, para crimes especiais a lei pode exigir requisitos específicos.
É o que ocorre com os delitos praticados contra a Administração Pública. Nesse caso, segundo o art. 33, § 4º, do Código Penal: “O condenado por crime contra a administração pública terá a progressão de regime do cumprimento da pena condicionada à reparação do dano que causou, ou à devolução do produto do ilícito praticado, com os acréscimos legais.”
Ou seja, aquele que comete delito contra a Administração Pública só poderá progredir de regime prisional se cumulativamente: cumprir a fração da pena exigida segundo a espécie delitiva e sua condição pessoal; ostentar bom comportamento carcerário e reparar o dano causado à Administração ou devolver tudo o que lucrou com o ilício.
Pois bem. No que toca ao caso de Lula, segundo manifestação de membro do MPF atuante perante o STJ, o condenado já teria atendido ao requisito temporal e à exigência de bom comportamento carcerário.
Contudo, a última regra mencionada, a princípio, segue impedindo a progressão de regime do ex-Presidente, visto que inexiste notícia de que tenha ressarcido o prejuízo ou devolvido o lucro obtido com o delito.
De fato, a decisão que resultou em sua prisão, condenou-o pela prática do crime de corrupção passiva (art. 317 do Código Penal), delito previsto no Título XI do Código Penal, exatamente onde estão arroladas as infração penais contra a Administração Pública.
Logo, incide para sua progressão a regra que exige a reparação do dano. A sentença, inclusive, previu expressamente essa condicionante, no ponto 948, nos seguintes termos: “Considerando as regras do art. 33 do Código Penal, fixo o regime fechado para o início de cumprimento da pena. A progressão de regime fica, em princípio, condicionada à reparação do dano no termos do art. 33, §4o, do CP.”
O TRF4 manteve a decisão nesse ponto, consoante ponto 43 da Ementa do acórdão. Da mesma maneira procedeu o STJ, segundo item XXXIX da ementa. O valor fixado pelo STJ como “produto do crime” foi de “R$ 2.424.991,00 (dois milhões, quatrocentos e vinte e quatro mil, novecentos e noventa e um reais)”, montante que deverá, segundo trecho não modificado da sentença, ser “corrigido monetariamente e agregado de 0,5% de juros simples ao mês a partir de 10/12/2009”. O STJ determinou, ainda, que os valores decorrentes da venda do imóvel não podem ser abatidos da indenização mínima a ser paga pelo condenado.
Caso Lula cumpra todos esses requisitos, como se daria o cumprimento da pena no regime semiaberto? Conforme matéria da Gazeta do Povo que entrevistou o advogado Marcelo Lebre:
“em Curitiba, o regime semiaberto é cumprido na Colônia Penal Agrícola, que pertence ao complexo de Piraquara (cidade da região de Curitiba), mas a aceitação de um apenado depende de vaga no estabelecimento, de acordo com manifestação do diretor da colônia.
‘Não havendo vagas, a defesa pode pleitear o que a gente chama de regime semiaberto harmonizado. Nos casos da Lava Jato, como do Delúbio Soares, foi concedido a ele o direito de permanecer fora da colônia penal, mas com monitoramento eletrônico’, afirma.”
Ainda: “para nenhum dos presos da Lava Jato de que Lebre tem conhecimento foi concedido o direito de voltar para casa nesses casos, salvo se conseguem algum outro benefício, como o livramento condicional. ‘Todos eles ainda estão em Curitiba, mas tiveram de encontrar um local na cidade para poder cumprir esse regime semiaberto harmonizado’, diz.”
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