"Acho que em qualquer época eu teria amado a liberdade; mas na época em que vivemos, sinto-me propenso a idolatrá-la"
(Tocqueville)

Pesquisadores publicam monografia sobre “Os Custos Sociais da Pornografia”

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Segundo estimativas da professora de sociologia da Universidade do Novo Méximo, Kassia Wosick, a gigantesca indústria da pornografia hoje alcança um valor de quase 100 bilhões de dólares (algo como 20 programas do Bolsa Família, que atende cerca 14 milhões de lares). Sua produção supera em números a de Hollywood, assim com seus lucros, calculados em cerca de U$ 15 bilhões de dólares anuais.

Apenas um site de compartilhamento de material pornográfico recebe mais de 30 bilhões de visitas anuais. A influência e poder econômico da indústria pornográfica hoje supera gigantes Netflix, NBA ou NFL. Confira no gráfico a seguir:

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Gráfico disponível em: <https://finance.yahoo.com/news/porn-could-bigger-economic-influence-121524565.html>

Pois bem, como é comum ocorrer, máquinas de ganhar dinheiro também se tornam máquinas de propaganda. Há anos, pois, essa gigantesca indústria tenta defender que o uso da pornografia é inofensivo ou mesmo benéfico.

Contudo, dados que vêm sendo levantados por pesquisadores das mais prestigiadas instituições mostram uma realidade muito diferente.

Em 2014, um estudo levado a cabo pela Universidade de Cambridge, monitorou o cérebro de 19 homens enquanto assistiam pornografia. Os dados mostram que ela aciona os mesmos centros de recompensa que são ativados no cérebro de viciados em drogas, por exemplo, ao terem contato com a substância. A conclusão é de que a pornografia deflagra mecanismos de comportamento compulsivo. Aliás, dois dos participantes da pesquisa haviam perdido o emprego, por acessar conteúdo pornográfico no ambiente de trabalho e outros afirmaram ter pensamento obsessivo por sexo. Mais: o mesmo estudo diz que quanto mais jovem a pessoa, maior e mais potente é a resposta cerebral a esse tipo de estímulo. Esse fato revela os riscos da cultura da pornografia em tempos de internet, em que tais conteúdos estão ao alcance de usuários cada vez mais jovens.

Nesse sentido, a especialista Paula Hall, presidente da Associação para o Tratamento da Dependência e Compulsividade Sexual, disse à BBC News britânica que “a internet agora oferece novidades sexuais ininterruptas.” E ainda: “O que estou vendo é um número crescente de jovens que não conseguem manter uma ereção porque destruíram seu apetite sexual com pornografia. Seu limiar de excitação foi elevado pelo estímulo pornográfico a um ponto que pessoas reais são incapazes de atingir”. Ela afirma também que “o dano ao relacionamento de um casal pode ser enorme, as mentiras e enganos, não fazer sexo com o parceiro, pois eles parecem apresentar um baixo desejo sexual, visto que estão na internet o tempo todo”.

A profissional Angela Gregory, que trabalha no Sistema Nacional de Saúde inglês, afirmou em entrevista à mesma emissora que tem deparado com número crescente de jovens com problemas de disfunção erétil, o que ela atribui ao aumento do consumo de pornografia na internet.

Inclusive, tem crescido a popularidade de plataformas que visam a auxiliar pessoas na abstenção de consumo de pornografia ou comportamento sexual compulsivo.

Matéria do jornal britânico The Telegraph indica várias pesquisas que apontam a relação entre pornografia e infidelidade, comportamento sexual imprudente, desvalorização da mulher e até mesmo condutas agressivas.

Especificamente sobre o impacto da pornografia sobre as mulheres, a pesquisadora e especialista em atender pessoas ou casais com problemas em virtude do consumo de pornografia, Drª. Jill Manning, escreveu o importante paper: “The Impact of Pornography on Womensocial science findings and clinical observations“.

Em suma, podemos concluir que as pesquisas apontam para o fato de que a pornografia tem impactos significativos no cérebro e nos afetos e, consequentemente, na formação da personalidade. Inclusive, foi lançado pela entidade especializada no debate sobre a pornografia Fight the New Drug um recente documentário, Brain, Heart, World“, que entrevista inúmeros especialistas e pesquisadores, explicando de modo extremamente didático e interessante os efeitos da pornografia sobre o cérebro.

Enriquecendo o debate: o livro “Os Custos Sociais da Pornografia” aborda novas descobertas

Capa Custos Sociais Pornografia

Para colaborar com o debate acerca dos custos da pornografia para a sociedade, inúmeros pesquisadores de prestigiadas instituições dos Estados Unidos e Inglaterra lançaram a monografia The Social Costs of Pornography: a statement of finding and recommendations. A obra coletiva, fruto de pesquisas levadas a cabo após um primeiro colóquio ocorrido em Princeton, New Jersey, em 2018, financiado pelo Witherspoon Institute e pelo Institute for Psychological Sciences, foi subscrita por profissionais de Oxford, Hoover Institution, Universidade de Chicago, Princeton, Stanford, Texas, Cambridge, Johns Hopkins, Georgetown e King’s College.

A obra, traduzida para o português pela Editora Quadrante, descreve oito descobertas sobre a pornografia e algumas recomendações em termos de políticas públicas.

É interessante perceber que, ao apontar custos sociais, o texto deixa claro que não se está diante de um tema que se restrinja à moralidade sexual privada, mas de um comportamento que apresenta o que se chama em economia de externalidades negativas. Em síntese, parte de seus custos recai sobre pessoas que não fazem uso de material pornográfico, o que torna possível uma abordagem não apenas de ética privada, mas também em termos de políticas públicas.

O texto final da obra coletiva foi compendiado pela pesquisadora Mary Ebersadt da Hoover Institution, Mary Anne Layden da Universidade da Pensilvânia, pelo Witherspoon Institute, sediado em Princeton, e Social Trends Institute de Nova Iorque.

Mary Anne Layden afirma que

“o corpus de pesquisas sobre a pornografia revela várias condutas e atitudes negativas relacionadas com seu uso. A pornografia ensina e permite essas condutas e atitudes negativas, além de servir de gatilho para elas. Seus danos são observáveis em homens mulheres e crianças e em adultos casados e solteiros, acarretando comportamentos patológicos, ilegais ou ambos” (pág. 9 da versão brasileira do obra).

Ela indica como revisão abrangente da pesquisa psicológica sobre pornografia seu artigo “Pornography and violence: a new look at the research.

Com base em ampla bibliografia especializada, o texto apesenta as seguintes oito descobertas:

  1. Pela primeira vez na história, a pornografia é disponibilizada e consumida em larga escala, sobretudo por causa da internet. Ninguém deixa de ser afetado por ela.
  2. Há abundantes evidências empíricas de que a pornografia atual é qualitativamente diferente das anteriores em vários aspectos: onipresença; uso de imagens cada vez mais realistas nas transmissões; e o caráter cada vez mais hardcore do que é consumido.
  3. O atual consumo de pornografia na internet pode ser especialmente prejudicial para as mulheres.
  4. O atual consumo de pornografia na internet pode ser especialmente prejudicial para as crianças.
  5. O atual consumo de pornografia na internet pode ser prejudicial a pessoas que não estão diretamente ligadas aos consumidores de pornografia, como vítimas de exploração sexual, garotas adolescentes, pessoas atingidas por separações familiares etc.
  6. O consumo de pornografia na internet pode ser prejudicial para seus consumidores, dificultando relacionamentos sérios e duradouros, deteriorando o desempenho sexual com parceiras reais, consumo compulsivo e perda do autocontrole etc.
  7. O consumo de pornografia é problemático por questões morais e filosóficas.
  8. O fato de nem todos serem prejudicados pela pornografia não significa que ela não deva ser regulamentada.

Como recomendações finais, de modo resumido, os autores concluem que:

a) influenciadores, como terapeutas, educadores, celebridades pop e profissionais da comunicação devem se debruçar sobre os resultados das pesquisas e buscar difundi-los, combatendo a cultura da pornografia;

b) empresas privadas devem deixar clara sua intolerância com a pornografia no local de trabalho;

c) o governo deve lançar campanhas públicas e abster-se de efetuar publicidade estatal em sites, jornais ou revistas que veiculam material pornográfico;

d) o legislativo deve criar dispositivos que viabilizem ações indenizatórios por danos decorrentes do contato de menores de idade com material pornográfico.

Por derradeiro, cremos que valha chamar a atenção para o fato de que a leitura do presente artigo não dispensa o estudo do livro completo, seja pela maior riqueza de dados, seja pela ampla fonte bibliográfica fornecida.

Enfim, ainda que a pornografia obviamente não seja o único mal da nossa sociedade, acreditamos que é um problema grave e cujos efeitos deletérios relacionados são pouquíssimo conhecidos e debatidos, razão pela qual é devido um esforço nesse sentido. Particularmente, porque os efeitos do amplo acesso à internet somados às novas características da pornografia poderão ter efeitos desconhecidos sobre as futuras gerações.





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