"Acho que em qualquer época eu teria amado a liberdade; mas na época em que vivemos, sinto-me propenso a idolatrá-la"
(Tocqueville)

Sem corte nas despesas do Estado, pleito de redução de tributos está fadado ao fracasso

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Nos últimos dias o Brasil assistiu à paralisação do sistema de transporte do país.

A principal reclamação decorre da alta no preço dos combustíveis, entre outros pleitos satélites que foram surgimento à medida que o movimento ganhava robustez, a fim de tentar pegar uma carona na forte repercussão e grande apoio popular.

Quando o sistema de fornecimento de produtos básicos como gasolina começou a escassear pelo país, o Governo anunciou um corte na CIDE do óleo diesel e, mais tarde, também no PIS/COFINS.

Sendo fato de conhecimento geral que quase metade do preço dos combustíveis provém de tributos estaduais e federais, o fato soou como uma grande vitória popular por uma suposta redução na carga tributária.

Ledo engano.

Não houve qualquer redução da carga tributária. Nem haverá, enquanto as contas do governo permanecerem no atual estado.

De fato, apresentar pleitos ao Governo Federal na atual conjuntura é como exigir pagamento de resgate a um famélico ante o sequestro de uma pessoa que lhe é querida: ele primeiro terá de roubar outrem, para depois pagar você.

Alguns dados sobre as contas do Governo Federal

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A dívida pública só da União é hoje de cerca de 3,5 TRILHÕES. Se somar estados e municípios, a gigantesca soma alcança algo em torno de 5 trilhões.

A União tinha um déficit primário previsto para 2018 de cerca de 140 bilhões. Ou seja: o governo tomaria 140 bilhões emprestados apenas para manter a máquina funcionando. Mas um detalhe: isso era antes da paralisação. Esse número já catastroficamente alto tenderá a crescer.

Depois de tomar esses 140 bilhões, a União terá ainda um gasto de cerca de 400 bilhões em juros (ele não sai do orçamento ao contrário do que alguns alegam; ele sai da poupança que poderia ser utilizada por empresas para tomar empréstimos e fazer investimentos gerando emprego e renda).

Lá se vai mais de meio trilhão.

Mas para equilibrar as contas, o Governo teria de estar realizando um superávit de cerca de 130 bilhões.

Conclusão: o Governo não tem condições de abrir mão de qualquer receita, ao menos não antes de reduzir suas despesas.

E aí está o ponto: nesse contexto, reclamar de tributos mas não apoiar cortes de despesas pelo Estado é como reclamar que seu pai passa muito tempo fora de casa só para ganhar dinheiro, mas viver pressionando-o para comprar roupas caras, comer fora e viajar para Disney todo ano.

Mas se o Governo tem dificuldades de arranjar o dinheiro, a Petrobrás não poderia reduzir os valores do combustível?

E a Petrobrás? Ela não poderia dar uma força e baixar os preços?

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A Petrobrás em virtude das políticas equivocadas feitas até 2015 acumulou uma dívida que chegou a 513 bilhões: a empresa mais endividada da face da terra. Enquanto isso, seu preço de mercado foi a 97 bilhões.

A petrolífera estava simplesmente quebrada.

Hoje a Petrobrás deve algo em torno de 370 bilhões e seu preço de mercado está ainda abaixo disso: até antes da greve, cerca de 360 bilhões. A empresa, no entanto, teve uma forte desvalorização, em razão do atendimento a alguns pleitos para mudança na sua política de preços.

Ou seja: a Petrobrás também não está em condição confortável para abrir mão de receitas.

Sobre o preço dos combustíveis no Brasil, em breve faremos um post desvendando alguns mitos que circulam pelas redes sociais.

O que vai acontecer, então? Simples: você vai pagar a conta!

O que vai acontecer é simplesmente a transferência do custo das demandas atendidas para outros setores. Não haverá redução da carga tributária no médio prazo. E não há como haver, ao menos não enquanto não se resolver o problema das contas públicas.

Uma das medidas compensatórias para os pleitos atendidos dos caminhoneiros já foi anunciada: haverá cessação da política de desoneração da folha de alguns segmentos. Pois bem, os setores em que ocorrer a oneração irão transferir esse custo para os consumidores. Haverá aumento de preços. Com aumento acima da renda, cai o consumo no setor. Haverá demissões.

There is no such thing as a free lunch“, não existe almoço grátis, dizia Milton Friedman com enorme sabedoria e simplicidade.

Enquanto o Brasil não resolver o problema das contas públicas, a guerra será apenas para empurrar a conta para os outros…

E resolver a questão das contas públicas não é algo fácil. Algumas pessoas falam em termos genéricos e abstratos como “cortar regalias” e “privilégios”.

Porém, em 2017 o governo já efetuou inúmeros cortes no orçamento da União. Hoje o Brasil já tem o orçamento mais engessado do mundo, sendo mais de 90% dos gastos obrigatórios. É atualmente o maior deles o da Previdência, com um rombo de centenas de bilhões todos os anos, e uma legislação descompassada com o mundo e com a mudança da composição etária do país em virtude do envelhecimento da população.

Portanto, o Governo já não tem mais espaço em gastos discricionários. E promover mudanças em gastos obrigatórios não é tarefa fácil. Exige planejamento, alteração da legislação e emendas na Constituição, que requerem exigentes maiorias parlamentares.

Sem o apoio necessário para racionalizar as contas, mas sempre pressionado por demandas de desoneração tributária, o Brasil tende a se tornar apenas uma arena de vários grupos lutando para ver quem consegue jogar a conta para cima do outro.

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