"Acho que em qualquer época eu teria amado a liberdade; mas na época em que vivemos, sinto-me propenso a idolatrá-la"
(Tocqueville)
Entenda como funcionou a fixação do salário mínimo por Bolsonaro
Conforme noticiou a Gazeta do Povo, em seu primeiro dia de governo, “o presidente Jair Bolsonaro assinou (…) decreto que reajusta o salário mínimo de R$ 954 para R$ 998“.
Para os que recebem o salário mínimo, houve um avanço, sendo o primeiro ano após o fim da crise econômica, em que houve ganhos reais (ou seja, acima da inflação), em cerca de 1,07%.
O valor, no entanto, ficou abaixo do autorizado pelo Congresso, em R$ 1006,00, pelos motivos que detalharemos abaixo.
O candidato petista derrotado nas últimas eleições tentou explorar o fato politicamente. Ele publicou em suas redes sociais: “Povo começou a se libertar do socialismo: salário mínimo previsto de R$ 1006,00 foi fixado em R$ 998,00. Sem coitadismo. Selva!”
Alguns grupos ligados ao petismo passaram a disparar mensagens, dando a entender que a redução seria uma escolha do Presidente eleito Jair Messias Bolsonaro. Alguns memes afirmavam que era o menor aumento da série do real.
Ambas as afirmações são falsas. Apenas mais uma fake news dos grupos de esquerda, os quais têm ficado cada vez mais caracterizados pelo uso de mensagens falsas e desinformação como arma política.
Vejamos como, na verdade, foi fixado o salário mínimo de 2019.
COMO É FIXADO O VALOR DO SALÁRIO MÍNIMO?
Primeira coisa a saber: Bolsonaro não escolheu o valor do salário mínimo. Aliás, nem poderia fazê-lo.
Isso porque o mais alto mecanismo normativo à disposição do Presidente da República é o “decreto”. Foi esse o expediente utilizado por Bolsonaro.
Todavia, por ordem expressa da Constituição, o salário mínimo não pode ser determinado mediante decreto. Segundo o art. 7º, inciso IV, da Constituição, está entre os “direitos dos trabalhadores (…) salário mínimo, fixado EM LEI”.
Ora, a lei é um instrumento exclusivo do Congresso Nacional (art. 59 da Constituição).
Agora você deve estar se perguntando: se o salário mínimo deve ser fixado em lei, como Bolsonaro o fixou mediante Decreto? Simples. O decreto apenas concretizou para o ano de 2019 o que a lei previa.
Com efeito, o valor do salário mínimo tem sido fixado desde 2011 da seguinte forma: uma lei (chamada de Lei da Política de Valorização do Salário Mínimo) determina o modo como o salário mínimo será atualizado. Após, a cada ano o Presidente publica um decreto aplicando aquele cálculo já previsto na legislação.
A primeira lei a fazer isso foi a de nº 12.382/11, do governo Dilma. Ele valeu para os salários mínimos dos anos entre 2012 e 2015.
Em 2015 a mesma sistemática foi mantida, por meio da Lei 13.152/15, também criada pelo Governo Dilma, vigorando até 2019 (este ano).
A norma em vigor durante esses anos determinou que o salário mínimo fosse reajustado pela inflação do ano anterior (segundo o INPC) mais o crescimento do PIB de dois anos atrás. Por exemplo: para o ano de 2019 utilizou-se a inflação estimada de 2018 mais o crescimento do PIB de 2017.
Portanto, a fixação do valor por Bolsonaro apenas atendeu a uma lei do governo Dilma Rousseff, de modo que quando petistas reclamam da norma, criticam seu próprio trabalho.
Como essa política valia até o presente ano, o Governo agora terá duas opções: 1ª) poderá criar uma lei que preveja uma sistemática a ser aplicada pela Presidência ano a ano repetindo o modelo atual (anda que com alguma variação na fórmula); 2ª) poderá todo ano enviar um projeto ao Congresso para fixar o salário mínimo do ano seguinte.
MAS POR QUE HOUVE A DISCREPÂNCIA ENTRE O FIXADO PELO LEGISLATIVO E O EXECUTIVO?
Ao enviar o Projeto de Lei Orçamentária ao Congresso, o Executivo estimou o crescimento da inflação de 2018 em 4,2%, o que resultaria num salário mínimo de R$ 1.006,00.
Naquele momento o governo também imaginava que teria mais espaço fiscal, visto que “conforme a estimativa dos técnicos de orçamento do governo, cada real a mais no salário mínimo eleva em R$ 303,9 milhões os gastos anuais da União” e o Governo esperava adiar o reajuste do funcionalismo para 2020, o que geraria uma economia de 6,9 bilhões em 2019. Esse adiamento foi impedido por uma liminar do ministro Ricardo Lewandowski (a nosso juízo, infundada e autoritária). Veja mais sobre o impacto fiscal do salário mínimo aqui.
Todavia, houve retração do INPC e aquela estimativa foi reduzida. No mês de novembro, por exemplo, o INPC registrou deflação de 0,25%, resultando num acumulado durante o ano de 3,3%. Há expectativa de que o índice permaneça estagnado em dezembro, consolidando um INPC de 3,3% para 2018. Foi esse o índice utilizado pela Presidência para edição do decreto.
Ou seja: o Legislativo aprovou estimando uma inflação de 4,2%, enquanto o Executivo atualizou estimando uma inflação de 3,3%. Daí a diferença de valores.
A influenciadora digital e articulista Renata Barreto, esclareceu o fato em texto que viralizou nas redes sociais e que inclusive foi repercutido pelo Presidente em sua conta no Twitter:
Aliás, o mesmo fato aconteceu com Dilma Rousseff em 2015, quando ela também fixou um salário mínimo abaixo do autorizado pelo Poder Legislativo, por conta da variação nas estimativas de inflação. Desde 2011 quando a sistemática descrita foi introduzida, apenas no ano de 2014 houve coincidência entre o valor aprovado pelo Congresso e o devidamente aplicado pelo Executivo (vide aqui).
Por fim, convém esclarecer que a lei prevê que, caso a inflação fique subestimada num ano, esse montante seja compensado no seguinte. Por exemplo: digamos que após o fechamento da inflação de 2018 (não mais trabalhando com a projeção, mas com o resultado devidamente apurado pelo IBGE), verifique-se que o mês de dezembro registrou alta de preços, de modo que o INPC fique acima de 3,3%. Na contagem no salário mínimo para 2020 essa diferença seria levada em conta.
Aliás, foi exatamente o que aconteceu neste ano. Em 2018, Michel Temer utilizou a estimativa do INPC para 2017 de 1,81%, mas ela acabou fechando acima disso, em 2,08%. Isso deu uma diferença de R$ 1,78 no salário mínimo, que foi reposta neste ano.
Assim, o decreto do Presidente Bolsonaro aplica um reajuste nominal de 4,61%: 3,3% da inflação de 2018 mais 1% do crescimento do PIB de 2017 mais a diferença do ano passado.
De um modo ou de outro: quais são os benefícios reais do aumento do salário mínimo? Seria ele a panaceia que se imagina para resolver os graves problemas sociais brasileiros, de pobreza e injusta desigualdade?
No post acima citado de Renata Barreto, ela afirma que: “Todo liberal sabe ainda que não adianta aumentar o salário mínimo na canetada, o que gera mais desemprego. É preciso melhorar as condições gerais da economia, de empregabilidade e educação. Muitos países desenvolvidos não têm nem mínimo estipulado, mas ganham muito mais que os brasileiros.”
Afinal de contas, quais os efeitos do aumento do salário mínimo?
Esse será o tema de nosso próximo post.
deixe sua opinião