"Acho que em qualquer época eu teria amado a liberdade; mas na época em que vivemos, sinto-me propenso a idolatrá-la"
(Tocqueville)
Tudo o que você precisa saber sobre o caso da extradição de Cesare Battisti
Conforme noticiou a Gazeta do Povo, “foragido há quase um mês, o terrorista Cesare Battisti – condenado na Itália à prisão perpétua por quatro assassinatos cometidos na década de 1970 – foi preso no sábado (12), por volta das 19 horas (horário de Brasília), em Santa Cruz de la Sierra, na Bolívia.” As autoridades do Brasil, da Bolivia e da Itália estão trabalhando juntas para executar sua extradição. “Segundo o governo brasileiro, o terrorista será buscado por um avião da PF e fará escala no Brasil antes de seguir à Itália”.
Para mais informações sobre sua captura, leia aqui.
Nossa intenção com esse post é mostrar tudo o que você precisa saber para entender o caso da extradição de Cesare Battisti.
O que Cesare Battisti aprontou na Itália?
Os crimes de Cesare Battisti estão ligados à sua militância política ligada à extrema-esquerda. Como militante, o italiano participou da organização clandestina revolucionária PAC – “Proletários Armados pelo Comunismo”, na qual praticou 4 brutais homicídios, todos em seu país de origem.
O site da Itália Libero Reporter, em artigo intitulado “Eis os crimes pelos quais Cesare Battisti ainda não pagou”, descreve os ilícitos:
1) o primeiro, o assassinato premeditado de um agente penitenciário, o senhor Antônio Santoro. O crime foi praticado à queima-roupa pelas costas da vítima próxima da mulher e três filhos, numa emboscada tramada por Cesare Battisti e outro cúmplice;
2) o segundo, o homicídio planejado de Pierluigi Torregiani, em virtude de Torregiani ter reagido em legítima defesa a um assalto, no qual desferiu um disparo que acabou por matar o assaltante. O grupo terrorista do qual Battisti fazia parte, dizia estar vingando o ladrão;
3) terceiro, assassinou de forma igualmente premeditada Lino Sabbadin, por situação semelhante à acima narrada;
4) por último, o covarde homicídio do agente de Polícia Andrea Campagna, jovem de apenas 25 anos, em visita a sua noiva.
A Gazeta do Povo fez duas matérias, explicando pormenorizadamente os crimes de Battisti e seu contexto: aqui e aqui. As excelentes reportagens também trazem declarações de parentes das vítimas.
Em matéria especial, a Gazeta do Povo informou que “para italianos, Battisti é terrorista”. E que “políticos de direita e de esquerda e a população da Itália são praticamente unânimes em afirmar que ex-ativista preso no Brasil deveria ser extraditado”. Em 2011, o Parlamento Europeu aprovou uma moção pela extradição de Battisti.
Em virtude dos delitos acima narrados, o caso Battisti teve a seguinte trajetória fora do Brasil:
“- Battisti é preso na Itália em 1979 e foge da cadeia em 1981. Passou um ano na França e depois se mudou para o México.
– Em 1985, o ex-presidente francês François Mitterrand cria a doutrina que a França não irá extraditar ex-guerrilheiros que largaram a luta armada e constituíram família em território francês. Por volta de 1990, Battisti vai para a França.
– Em 1991, Battisti é preso na França, pelo pedido de extradição que havia sido feito da Itália, que acaba negado por causa da doutrina Mitterrand. Ele havia sido condenado na Itália pela participação em quatro homicídios e outros crimes, com pena de prisão perpétua.
– No início dos anos 2000, Silvio Berlusconi, primeiro-ministro italiano, faz novo pedido de extradição. Com a guinada à direita no governo francês, comandado por Jacques Chirac, o pedido começa a ser analisado. E, em 2004, a Justiça francesa autoriza a extradição. Battisti recorre à Corte de Cassação da França, mas não obtém sucesso. Ele foge novamente, enquanto seus advogados recorrem à Corte Europeia de Direitos Humanos.
– Em 2006, a Corte Europeia não acata a argumentação de Battisti, que afirmou que foi julgado à revelia na Itália e não teve chance de se defender. Ele continuava foragido.”
O que aconteceu no Brasil?
Com o cerco fechado na Europa, Battisti fugiu para o Brasil. Preso em 2007 usando documentos falsos, seu paradeiro foi descoberto. No mesmo ano, a Itália requereu sua extradição. O processo foi autuado perante o STF sob o nº 1.085, tendo sido relatado pelo ministro Cezar Peluso, após o relator inicial, o ministro Celso de Mello, declarar-se suspeito por motivos de foro íntimo.
Para entender a situação atual de Cesare Battisti é preciso saber o que foi decidido pelo STF nesse processo original.
Eis, pois, algumas informações necessárias.
O que é uma extradição?
A extradição é um instituto de cooperação jurídica internacional. Ela serve para evitar o chamado conflito negativo de competência internacional, especificamente em matéria penal.
A necessidade desse instituto decorre do fato de que as nações soberanas, em vista da gravidade da punição penal, que envolve privação da liberdade, não cumprem decisões de países estrangeiros. Ou seja, ninguém é preso no Brasil, por ter sido criminalmente condenado em outro país. Isso está previsto em nosso ordenamento no artigo 9º do Código Penal, interpretado a contrario sensu, o qual expõe o rol de fins para os quais se admite a homologação de sentença penal estrangeira, não prevendo a imposição de pena privativa de liberdade.
Ao mesmo tempo, regra geral, a jurisdição penal é guiada pelo princípio da territorialidade. Isto quer dizer que os países punem apenas os crimes cometidos dentro de seu território. No Brasil há algumas exceções a esse princípio, em que delitos mesmo que cometidos no estrangeiro podem ser processados e punidos no Brasil. Todavia, essas exceções são irrelevantes para análise do caso Césare Battisti, visto que não alcançam os homicídios praticados pelo terrorista italiano.
Pois bem, o fato é que a soma desses dois institutos – o princípio da territorialidade mais a não homologação de sentença penal estrangeira para fins de aplicação de pena – abre margem para a impunidade: se um criminoso pratica delito fora do Brasil fica fora do alcance da jurisdição brasileira (ao menos em regra). E se for condenado no outro país, essa sentença não pode ser executada para fins de privação da liberdade aqui. Conclusão: autor de crime no estrangeiro, caso conseguisse fugir, ficaria impune.
Para esses casos, então, serve o instituto da extradição: o criminoso não será julgado no Brasil, por falta de competência de nossa justiça; e a sentença não será executada aqui; mas o Brasil, preenchidos os requisitos, compromete-se a entregar o criminoso para o país no qual poderá ser responsabilizado.
Como funciona o processo de extradição?
O procedimento de extradição no Brasil segue o chamado sistema judiciário. O nome decorre do fato de que o Poder Judiciário tem de averiguar a presença dos requisitos legais e autorizar a extradição.
Contudo, o Judiciário não é o único poder a intervir no procedimento extradicional nem o responsável por executá-lo (entregar fisicamente o extraditando ao país requerente).
Na verdade, nosso sistema possui três fases:
1ª) uma fase administrativa, em que o Ministério das Relações Exteriores, órgão do Poder Executivo (ou, segundo a nova Lei de Migração, alguma autoridade constituída para esse fim em tratado específico, chamada de “Autoridade Central”) recebe o pedido do país estrangeiro e o encaminha ao Supremo Tribunal Federal, deflagrando a fase propriamente judicial;
2ª) fase judicial: esta etapa do procedimento, por força do art. 102, I, “g”, da Constituição, passa-se perante o Supremo Tribunal Federal. Após aquela Corte receber o pedido extradicional, o ministro relator determina a prisão do extraditando, dando seguimento ao processo. Ao final, o STF verifica se estão presentes os requisitos para a extradição. Caso os requisitos não estejam presentes, o STF recusa a extradição, ficando vedada a entrega do extraditando. Por outro lado, caso o STF reconheça a presença dos requisitos ele autoriza (não ordena) o Presidente da República a promover a extradição, devolvendo o caso para sua última fase, a qual também se passa dentro do Poder Executivo;
3ª) nesta derradeira secção do procedimento, competirá ao Presidente da República decidir se executa ou não a extradição. Inexistindo tratado com o país requerente, o Chefe nacional do Poder Executivo é absolutamente livre para decidir. Caso exista tratado, o Presidente está obrigado a cumprir o tratado. Quanto a este último ponto, o STF decidiu no caso Battisti, em julgamento da petição avulsa relatada pelo Ministro Luiz Fux que, apesar de estar obrigado a respeitar o tratado e motivar sua decisão com base nele caso decida pela não extradição, seria ato de soberania do Presidente julgar a interpretação que concederá aos dispositivos do tratado. Eventual irresignação do país requerente, poderia ser resolvida apenas internacionalmente sob o prisma da responsabilidade jurídica internacional (violação de tratado no plano internacional, não de lei ou da Constituição no plano interno), de modo que não caberia ao STF revisar essa decisão.
Quais os requisitos necessários para o deferimento do pedido de extradição?
Quando o STF examina um pedido de refúgio, o Tribunal não verifica o suposto “acerto ou erro da condenação”, mas simplesmente a presença dos requisitos legais. Isso decorre do chamado “princípio da contenciosidade limitada”, também intitulado de “sistema belga”.
São os seguintes os pressupostos legais para extradição:
i) existência de tratado com o país requerente ou compromisso de reciprocidade, ou seja, que o país requerente sendo atendido também atenderá o Brasil em pleitos futuros;
ii) que o extraditando fosse estrangeiro ao tempo do crime (o Brasil, por mandamento constitucional, não extradita brasileiro nato ou naturalizado antes do delito que motiva o pleito extradicional);
iii) que o fato constitua crime também no Brasil (requisito chamado de dupla tipicidade);
iv) que o Brasil não esteja processando ou já tenha processado o indivíduo pelo mesmo crime, nem tenha competência jurisdicional para conhecer do caso;
v) que ao delito seja no Brasil cominada uma pena igual ou superior a dois anos de prisão (ao tempo do julgamento do caso Césare Battisti exigia-se apenas sanção superior a um ano, nos moldes do antigo Estatuto do Estrangeiro);
vi) que a punibilidade não esteja extinta pela prescrição em quaisquer dos países;
vii) que o extraditando não responda no país requerente perante tribunal ou juízo de exceção (um órgão jurisdicional criado após o fato apenas para julgá-lo);
viii) que o fato não constitua crime político ou de opinião;
ix) que o extraditando não seja beneficiário de refúgio, nos termos da Lei no 9.474, de 22 de julho de 1997, ou de asilo territorial.
Qual foi a decisão do STF sobre o pedido de extradição?
No final de 2009, o STF julgou o caso: reconheceu que estavam presentes todos os requisitos expostos acima e, por conseguinte, deferiu a extradição.
Dois pontos, no entanto, causaram polêmica: primeiramente, a condição de refugiado ilegalmente concedida ao terrorista; em segundo lugar, o alegado caráter político dos delitos por ele cometidos.
Vejamos cada um desses pontos.
O refúgio ilegal que o PT concedeu a Cesare Battisti
Após o início do processo de extradição perante o STF, a defesa de Césare Battisti entrou com requerimento de refúgio perante o órgão competente, o “Comitê Nacional para os Refugiados – CONARE”.
Com o pedido, seu processo de extradição foi imediatamente suspenso, conforme determina o art. 34 da Lei do Refúgio.
O instituto está regulado, no Brasil, pela Lei 9.474/97. Lá se prevê seu cabimento para as seguintes hipóteses:
I – devido a fundados temores de perseguição por motivos de raça, religião, nacionalidade, grupo social ou opiniões políticas encontre-se fora de seu país de nacionalidade e não possa ou não queira acolher-se à proteção de tal país;
II – não tendo nacionalidade e estando fora do país onde antes teve sua residência habitual, não possa ou não queira regressar a ele, em função das circunstâncias descritas no inciso anterior;
III – devido a grave e generalizada violação de direitos humanos, é obrigado a deixar seu país de nacionalidade para buscar refúgio em outro país.
Cesare Battisti não se enquadrava em quaisquer dessas situações, motivo pela qual em decisão de caráter técnico, o CONARE rejeitou o pleito de refúgio.
Todavia, ele recorreu ao Ministro da Justiça, na época o político petista Tarso Genro, que por razões ideológicas deferiu o pleito, com base no inciso I acima citado, isto é, alegando que haveria fundado temor de perseguição política a Cesare Battisti na Itália. Com o reconhecimento do status de refugiado, restaria inviabilizada a extradição.
O STF, no entanto, em caráter preliminar (ou seja, antes de examinar a presença dos requisitos para extradição), examinou a (i)legalidade da concessão do refúgio, ou seja, se o extraditando se encontrava ou não em algumas daquelas condições em que a lei autoriza a concessão do status de refugiado.
Nesse juízo, o tribunal afirmou inexistir qualquer fundado temor atual de perseguição, visto que a Itália é uma democracia consolidada, ciosa das liberdade públicas de seus cidadãos.
Frise-se que a irresignação de Cesare Battisti em relação ao pleito extradicional italiano foi, inclusive, conhecida pela Corte Europeia de Direitos Humanos (uma das mais protetivas às liberdades individuais no mundo). Battisti afirmava que seu processo foi injusto, visto que por estar foragido não acompanhou presencialmente o feito. Essa alegação foi rejeitada pelo Tribunal europeu de Direitos Humanos, sob as seguintes constatações:
“O recorrente, patentemente, foi informado da acusação que lhe foi imputada e do andamento do processo perante os tribunais italianos, apesar de ter fugido. Além disso, o recorrente, que deliberadamente optou por permanecer foragido depois de escapar da prisão, recebeu assistência jurídica eficaz durante o processo, efetuada por advogados escolhidos para o seu caso. Por conseguinte, as autoridades italianas e, posteriormente, francesas podiam licitamente concluir que o requerente renunciara inequivocamente ao seu direito de comparecer e de ser julgado em sua presença. Por conseguinte, as autoridades francesas tiveram em devida conta todas as circunstâncias do caso e a jurisprudência do Tribunal de Justiça para conceder o pedido de extradição formulado pelas autoridades italianas. (https://web.archive.org/web/20070609171954/http://www.echr.coe.int/Eng/InformationNotes/INFONOTENo92.htm)
Ante o exposto, o STF julgou absolutamente nulo o ato que concedeu o refúgio, retirando a condição de refugiado do extraditando, com o que permaneceu aberta a possibilidade de seu envio à Itália.
O caráter comum (não político) dos crimes cometidos por Césare Battisti
A Constituição afirma que crimes políticos são impassíveis de extradição. Contudo, a Constituição não define o que são crimes políticos, cabendo ao STF examinar no caso concreto se se está ou não diante de um delito dessa natureza.
O que se entende, consoante expressa disposição legal, é que se veda a extradição apenas dos delitos chamados “puramente políticos”, como crimes de opinião em países autoritários, ou atos praticados em resistência a regimes tirânicos.
Todavia, quando o delito é o que chamamos de “crime misto“, ou seja, um crime preponderantemente comum, ainda que com motivação remotamente política, não fica vedada a extradição.
Com efeito, o estatuto que trata do instituto deixa claro que não se veda “a extradição quando o fato constituir, principalmente, infração à lei penal comum ou quando o crime comum, conexo ao delito político, constituir o fato principal”.
É o que ocorre no caso Battisti, em que os delitos imputados – múltiplos homicídios brutais e qualificados contra pessoas comuns, fora do contexto imediato de resistência a qualquer regime tirânico –, são crimes primordialmente comuns, os quais autorizam a extradição.
Foi essa posição do STF.
O que o Presidente da República fez diante da autorização do STF?
Como já expusemos acima, o STF em sua decisão, firmou que cabe à Corte apenas autorizar a extradição. Após, caberá ao Presidente decidir se a executará ou não. Inexistindo tratado internacional, o julgamento do Chefe do Executivo é livre; do contrário, cabe a ele motivar sua decisão segundo o tratado, podendo de todo modo recusar a entrega do extraditando.
Esse ponto foi julgado por maioria pelo Tribunal. Participaram do julgamento 9 ministros. Quatro deles afirmaram que o Presidente estaria obrigado a proceder à extradição, e um decidiu que teria apenas de haver observância do tratado, julgando-se que o voto médio vencedor seria como exposto acima.
À vista desse entendimento, o ex-Presidente da República – atualmente preso e condenado por corrupção e lavagem de dinheiro –, o petista Luiz Inácio Lula da Silva, no último dia de seu último mandato (31 de dezembro de 2010), decidiu por recusar a entrega do terrorista à Itália.
O ex-Presidente fundamentou, formalmente, sua decisão no tratado sobre extradição entre Brasil e Itália, utilizando-se do equivocado argumento – já superado pelo STF – de que o crime de Cesare Battisti seria um delito político e que haveria temor de perseguição ao extraditando, motivos cujo tratado entre Brasil e Itália admite que ensejem recusa à extradição.
Em vista da posição da Presidência, o governo italiano apresentou petição avulsa ao STF, o qual decidiu, em 8 de junho de 2011, em decisão relatada pelo Ministro Luiz Fux, por reiterar que no sistema brasileiro caberia ao STF apenas autorizar a extradição. Então, cabe ao Presidente, num ato de soberania nacional executado no plano internacional, decidir sobre a entrega efetiva do extraditando. A partir daí, se o governo estrangeiro discordar da interpretação concedida pelo Presidente ao tratado, haveria uma lide entre governos soberanos a ser decidida no plano internacional, pelos respectivos meios, como a Corte Internacional de Justiça em Haia, sendo vedado ao Supremo imiscuir-se no tema.
Com isso, Cesare Battisti foi colocado em liberdade e desde então usufrui plenamente dela, vivendo confortavelmente no Brasil.
O que aconteceu depois disso?
Em 2016 o PT foi retirado da Chefia do Governo brasileiro, por meio do processo de impeachment da Presidente Dilma Rousseff, pelo cometimento de crimes responsabilidade consistentes em fraudes fiscais da ordem de 60 bilhões de reais, com consequências nefastas para o país, como o agravamento do cenário econômico levando à pior recessão da história do país, fato que jogou mais de 8 milhões de pessoas para baixo da linha da miséria e destruiu milhões de empregos. A crise ainda teve como trágico desfecho um lamentável aumento nos índices de mortalidade infantil. A conduta ímproba levou a uma dupla rejeição das contas da ex-Presidente pelo TCU, nos anos de 2014 e 2015, e terá repercussões judiciais por ato de improbidade administrativa.
O fato é que com a mudança de governo, desapareceu o alinhamento ideológico que acobertava Cesare Battisti. A mídia divulgou que passou a haver movimentações internas no Poder Executivo para rever a decisão do Presidente Lula, a fim de entregar o terrorista para a Itália.
À vista desses fatos, Battisti impetrou um habeas corpus perante o Supremo Tribunal Federal (HC 148.408), o qual foi liminarmente deferido pelo Ministro Luiz Fux (relator). Em sua decisão o ministro, na data de 13 de outubro de 2017, deferiu a “liminar para, preventivamente, obstar eventual extradição do paciente, até que esta Corte profira julgamento definitivo”.
Enfim, os novos Presidentes podem ou não extraditar Cesare Battisti?
Ao julgar que cabe ao Presidente decidir sobre a entrega ou não do extraditando, após autorização do STF, aquela Corte firmou que “o juízo referente ao pedido extradicional é conferido ao ‘Presidente da República, com apoio em juízo discricionário, de caráter eminentemente político, fundado em razões de oportunidade, de conveniência e/ou de utilidade (…) na condição de Chefe de Estado‘ (Extradição nº 855, Ministro Relator Celso de Mello, DJ de 1º.7.2006)”.
Pois bem. Juridicamente o ato discricionário é aquele que depende de um juízo de mérito, de modo que o mesmíssimo ato recusado num momento, por ser então reputado inoportuno ou inconveniente, pode mais tarde ser praticado por um juízo em sentido contrário.
Por exemplo: um Presidente pode entender que uma determinada obra não é prioritária e não a executar. Ou que uma política econômica não é adequada e não a adotar. Ou que certa pessoa não é apta para ocupar um cargo de ministro e não a nomear.
O Presidente que o suceder, pelo contrário, pode entender que a obra já era ou se tornou prioritária; que a política econômica é necessária; e que a pessoa é suficientemente preparada: e, então, reverter todas aquelas decisões.
Portanto, exatamente o mesmo ocorre em relação à entrega do extraditando após autorização do STF.
Leia esse trecho do voto relator do caso Battisti:
“Assim, é de se repetir, a decisão de entrega do extraditando é um ato de soberania a ser exercido, em última palavra, pelo Chefe de Estado. No Brasil, assim como em outros países, a atribuição é atrelada, historicamente, ao Presidente da República, responsável pela política internacional, pelas relações com outros Estados soberanos.”
Logo, patente que os novos Presidentes, ao realizarem novos juízos quanto à oportunidade e conveniência, podem efetivar a entrega autorizada pelo Supremo mesmo que ela tenha sido antes recusada por outro Presidente.
Não por outro motivo, na noite dessa quinta-feira, dia 13 de dezembro de 2018, o Ministro Luiz Fux, em decisão proferida no bojo dos autos da Reclamação 29.066, decidiu que é sim possível ao Presidente, no exercício soberano da política externa nacional, decidir agora entregar o terrorista italiano, visto que o STF já autorizou a extradição.
Fux, então, determinou a prisão de Césare Battisti. Após a prisão, o presidente informará o país estrangeiro que terá 60 dias para determinar a remessa do extraditando para a Itália.
O inteiro teor da decisão pode ser acessado aqui.
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