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A França não autoriza o sexo com crianças. O ato continua sendo classificado como crime | Reprodução/Janko Ferlic/Unsplash
A França não autoriza o sexo com crianças. O ato continua sendo classificado como crime| Foto: Reprodução/Janko Ferlic/Unsplash

“O governo do presidente [Emmanuel] Macron votou contra a idade de consentimento na França, tornando-se (sic) a mais recente nação a ceder à pressão de uma rede internacional de ativistas determinados a normalizar a pedofilia e descriminalizar o sexo com crianças em todo o mundo”. 

Desde o início de agosto, quando a França aprovou a Lei 2018-703, textos contendo o trecho acima, ou com conteúdo similar, circulam em vários sites e nas redes sociais. Vídeos sobre o assunto também foram publicados no YouTube. A legislação ficou conhecida como Lei Schiappa, em referência a Marlène Schiappa, secretária francesa para a Igualdade de Gênero, e foi elaborada com o objetivo de recrudescer as punições em relação a atos de violência sexual. Como, então, ela “normaliza” a pedofilia? A verdade é que ela não o faz. 

A má-interpretação da legislação ocorreu porque, originalmente, o texto trazia, de forma inédita na França, uma idade para o consentimento sexual. O projeto que originou a Lei Schiappa previa que sexo de maiores de idade (18 anos) com menores de 15 anos seria considerado estupro no país, independentemente da anuência da vítima. 

A inexistência da previsão legal para uma idade para o consentimento sexual no país abriu brechas para casos polêmicos que correram na Justiça do país. No início de 2018, por exemplo, um homem de 29 anos foi processado por “abuso sexual de menor de 15 anos”, e não por estupro, após manter relações sexuais com uma menina de 11. Os promotores responsáveis pelo caso avaliaram que o réu não fez uso de violência, coerção ou surpresa, características previstas pela lei francesa (artigo 222-22 do Códe Penal) para a configuração de um estupro, punível com até 20 anos de reclusão. 

A Lei Schiappa deveria colocar uma pá de cal sobre o assunto, mas o Conselho de Estado francês advertiu os legisladores que definir uma idade legal de consentimento “poderia violar a presunção de inocência do adulto e, portanto, ser declarada inconstitucional”. O conselho citou como exemplo, para mostrar como o assunto é sensível, o caso de dois menores, com 14 e 17 anos, que fazem sexo de forma consentida. Assim que o mais velho fizesse 18 anos, cometeria automaticamente um estupro.

Optou-se, no fim das contas, por classificar a relação sexual com menores de 15 anos como estupro somente se o menor “não tiver o discernimento necessário para o consentimento” (artigo 2 da Lei 2018-703). 

Isso não significa, contudo, que a França autoriza o sexo com crianças. O ato continua sendo classificado como crime (“abuso sexual de menor de 15 anos”), sendo que a Lei Schiappa aumentou a punição para esse tipo de delito. Se antes o infrator poderia ser condenado a cinco anos de prisão, além de pagar uma multa de 75 mil euros, o tempo de reclusão aumentou para sete anos e a multa para 100 mil euros. 

Os legisladores franceses podem ter falhado ao não definir, de forma clara, uma idade legal para o consentimento sexual, mas isso não quer dizer que tenham “validado” a pedofilia. 

Lei brasileira 

No Brasil, “ter conjunção carnal ou praticar outro ato libidinoso” com menores de 14 anos, ainda que a vítima tenha consentido com o ato, é crime. Trata-se do chamado “estupro de vulnerável”, acrescentado ao Código Penal pela Lei de Crimes Sexuais, de 2009. 

Ocorre que mesmo antes do advento da legislação já existia a presunção de violência em relações sexuais envolvendo menores de 14 anos, entendimento chancelado por diversas decisões do Supremo Tribunal Federal (STF).

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