Envoltos em um clima de crise política e estagnação econômica e embalados pelas posturas extremistas, os brasileiros aspiram por renovação. Mas são inúmeros os fatores que conspiram para que as eleições de outubro não correspondam a esse desejo de mudança, que sempre surge em ano eleitoral como necessário.
A Copa do Mundo já não ganha os corações e, portanto, não pode ser apontada como vilã dos finais infelizes no campo eleitoral, independentemente de que lado esteja o torcedor eleitor. O quadro de continuísmo é contornado por aspectos do que se convencionou chamar de “reforma eleitoral” e que dão conta de manter o eleitor o mais longe possível dos conteúdos programáticos, sobretudo para as novas candidaturas.
Comecemos pelo próprio calendário: ineditamente, teremos os dois turnos em outubro: o primeiro no dia 7 e o segundo no dia 28. Apenas três semanas separam um do outro. Não parece o bastante para convencer eleitores indecisos e para promover o desejável e salutar debate de ideias que sustenta a democracia representativa.
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A redução do período de campanha é uma das marcas das eleições gerais deste ano no Brasil, conforme traçou o Legislativo na minirreforma de 2015, que fez o tempo de campanha encurtar de 90 para 45 dias no primeiro turno e o tempo de propaganda eleitoral gratuita na TV e no rádio de 45 para 35 dias. Com menos tempo, saem na frente os nomes e rostos já conhecidos.
Há quem maldiga o horário eleitoral gratuito, condenando seu alto custo e seu caráter obrigatório. Todavia, para o eleitor, a quem interessa conhecer o mais amplo leque de propostas, o horário eleitoral pode ser fonte de informação, ao menos a respeito de quem são os postulantes. Se há distorções, e sem dúvida há, temos de buscar sua correção sem nos iludir com a ideia de que a conta de outros meios de publicidade não acaba, por via retas ou tortuosas, impactando o bolso do eleitor.
As postagens impulsionadas nas redes sociais, também liberadas para a eleição de 2018, são uma novidade cuja efetividade ainda é incerta. Não há clareza sobre o algoritmo de distribuição de informações pelas redes nem estudos sólidos o suficiente para garantir que o meio seja adequado à mensagem.
Portanto, o que parece um mecanismo barato e ágil de fazer campanha pode revelar-se como uma ferramenta de impacto pouco tangível. Estarão os seguidores dispostos a ver suas timelines repletas de postagens políticas? Conseguirão as campanhas separar o joio das fake news do trigo programático? São desafios que se colocam e que parecem favorecer os mais experientes e mais bem assessorados.
No que diz respeito ao financiamento público é ainda mais nítida a constatação de que o modelo atual foi minuciosamente pensado para fortalecer os partidos (e os caciques) já estabelecidos, pois há um vínculo (proposital) entre o tamanho das bancadas e recursos públicos recebidos do Tesouro. E, como temos ouvido repetidamente desde a recente greve dos caminhoneiros, em assustadora simplificação do quadro tributário, “o Tesouro somos nós”.
Dia 18 de junho, o Tribunal Superior Eleitoral vai divulgar o montante de recursos desse Tesouro, dinheiro esse destinado ao Fundo Especial de Financiamento de Campanha (FEFC), criado com o Projeto de Lei 8.703/17, aprovado pelo Congresso.
Se no ano passado, na altura da aprovação da proposta, parecia desperdício separar aproximadamente R$ 1,7 bilhão para atender os que já estão no poder, depois da crise nos transportes, diluída com sobrecarga para o Tesouro, a criação do Fundo pode ser interpretada como verdadeira afronta aos cidadãos, sobretudo para os que contavam com uma ampla reforma política e eleitoral.
Esses e outros fatores indicam o que soa óbvio: teremos uma eleição com baixo índice de renovação. O pacto eleitoral consolidado pela “reforma” concorre a favor da reeleição ou, no máximo, dos nomes indicados por quem já está no poder. É pequena a viabilidade para as candidaturas alternativas, fora da polarização que se instalou no país.
Outros desafios no campo eleitoral nos inquietam, como as inelegibilidades, a participação feminina na política, o combate às notícias falsas e à compra de votos e ainda o papel do STF em matéria eleitoral. Debater essas questões é cuidar da democracia duramente conquistada e trabalhar pelo aprimoramento da representação. É discutir o Estado Democrático de Direito e suas garantias mais basilares.
* Moisés Pessuti é advogado, é presidente do Instituo Paranaense de Direito Eleitoral.
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