O candidato à Presidência Jair Bolsonaro (PSL) lidera o ranking de pedidos de retirada de conteúdos da internet, com 23 ações judiciais, de um total de 250 ações ajuizadas até o momento em 2018. Em seguida, vêm o candidato João Doria (PSDB) ao governo de São Paulo, com 11 ações; Roseana Sarney (MDB), candidata ao governo do Maranhão, com 9 ações; Amazonino Mendes (PDT), governador do Amazonas candidato à reeleição, e o senador Eduardo Braga (MDB-AM), candidato à reeleição, aparecem com 8 ações cada. Depois de Bolsonaro, o próximo candidato à Presidência a aparecer na lista é Ciro Gomes (PDT), com 6 ações. As informações são do projeto Ctrl-X, da Associação Brasileira de Jornalismo Investigativo (Abraji), e continuam sendo atualizadas.
Prevalecem nas ações movidas por Bolsonaro as alegações de difamação e desrespeito à legislação eleitoral. 18 das 23 ações pedem a retirada de páginas ou perfis do Facebook. A lei eleitoral diz que é “livre a manifestação do pensamento, vedado o anonimato durante a campanha eleitoral, por meio da rede mundial de computadores – Internet, assegurado o direito de resposta” e que “a Justiça Eleitoral poderá determinar, por solicitação do ofendido, a retirada de publicações que contenham agressões ou ataques a candidatos em sítios da Internet, inclusive redes sociais.”
Convicção da Gazeta: Liberdade de expressão
A advogada Emma Roberta Bueno, especialista em Direito Eleitoral e Processo Eleitoral, explica que legislação eleitoral prevê a possibilidade de retirada de conteúdo e de direito de resposta em caso de calúnia, difamação, injúria – que são crimes contra a honra – ou conteúdo sabidamente falso, mas ressalta que “a propaganda negativa de um candidato adversário é absolutamente permitida”.
“A Justiça Eleitoral tem entendido que o conceito de honra dentro das disputas eleitorais é mais elástico, sendo que o candidato ao se dispor a desempenhar cargos públicos está sujeito a críticas ao seu trabalho e à sua postura, sendo que suas opções passam a incorporar sua história política para o bem e para o mal”, ressalva a advogada.
“Fake news”
Um dos pedidos de remoção de conteúdo por parte de Bolsonaro, autorizado pela Justiça, fundamenta-se em alegação de notícias falsas, as chamadas “fake news”. “A primeira postagem impugnada traz foto do candidato representante, acompanhada dos seguintes dizeres: ‘não preciso votos de nordestinos’. A segunda, por sua vez, apresenta outra foto do candidato representante, seguida da frase: ‘o nordestino é tão burro que nem sabe falar Haddad e riuuu’”, informa o processo.
Desejo para o Brasil: Política moralmente exemplar
A primeira decisão do Tribunal Superior Eleitoral autorizando a remoção de conteúdo considerado “notícia falsa” ocorreu em junho deste ano, atentando a um pedido da candidata Marina Silva (Rede). O tribunal aplicou § 1° ao artigo 33 da Resolução 23.551/2017, segundo o qual “com o intuito de assegurar a liberdade de expressão e impedir a censura, as ordens judiciais de remoção de conteúdo divulgado na internet serão limitadas às hipóteses em que, mediante decisão fundamentada, sejam constatadas violações às regras eleitorais ou ofensas a direitos de pessoas que participam do processo eleitoral”.
“Observo que as informações não têm comprovação e se limitam a afirmar fatos desprovidos de fonte ou referência, com o único objetivo de criar comoção a respeito da pessoa da pré-candidata”, escreveu o ministro Sérgio Banhos, relator do caso no tribunal.
Censura
Outro dado que chama atenção é que, das 250 ações referentes ao ano de 2018 que estão no levantamento da Abraji, 61 pedem o monitoramento de conteúdo pela Justiça. Em 15 delas, o pedido foi deferido pela Justiça. Nessas ações, os autores pedem não só a retirada do conteúdo, mas que a Justiça determine que os alvos – perfis de redes sociais, mas também jornais ou blogs de jornalistas – se abstenham de postar novamente manifestações do mesmo teor.
Os juízes que atendem a esse tipo de pedido costumam entender que o inciso XXXV ao artigo 5º da Constituição – “a lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito” – garante a competência de impedir de antemão a divulgação de uma informação que seja potencialmente danosa a alguém ou a alguma empresa.
No entanto, várias decisões dessa natureza, classificadas como “censura judicial”, têm sido derrubadas pelo Supremo Tribunal Federal (STF) com base no entendimento que o tribunal firmou no julgamento da Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) 130, que declarou a inconstitucionalidade da Lei de Imprensa, em 2009, e da Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) 4815, em que a corte liberou a publicação de biografias não autorizadas, em 2015.
No entanto, os próprios ministros do Supremo reconhecem em suas decisões que essa proibição não é absoluta e pode ser relativizada em casos graves. A hipótese mais lembrada costuma ser a de pornografia infantil. Mesmo a Suprema Corte dos Estados Unidos, onde a proteção à liberdade de expressão é maior que nas democracias do mundo, já decidiu que “A proteção, mesmo contra a censura prévia, não é absolutamente ilimitada; essa limitação, porém, é reconhecida apenas em casos excepcionais”.
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