Os Estados Unidos ficaram paralisados com a história de Jack Phillips, proprietário da loja Masterpiece Cakeshop, no Colorado, e como a Suprema Corte vai lidar com seu processo, um marco em relação à Primeira Emenda da Constituição norte-americana. Mas a história do confeiteiro não começou na Suprema Corte. Isso nunca acontece.
De forma resumida, Phillips foi parar no tribunal após se negar, embasado nas liberdades de expressão e de religião, a produzir um bolo de casamento para uma união homoafetiva. Saiba mais detalhes do caso.
Uma vez que se trata do mais alto tribunal de apelação do país, cabe à Suprema Corte revisar fatos e questões de direito. Normalmente, isso significa que algum juiz já tomou uma decisão prévia, talvez no contexto de um júri ou por meio da análise de questões preliminares. Mas o caso de Philips não começou assim. Ele nunca ficou diante de um juiz no Colorado, tampouco teve a oportunidade de exigir um júri.
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No atual sistema do estado, as reivindicações de discriminação em locais públicos, relacionadas à orientação sexual do ofendido, passam pela Comissão de Direitos Civis do Colorado, ligada ao Departamento de Agências Reguladoras do Colorado.
Não se exige que seus sete membros sejam advogados ou tenham qualquer tipo de formação legal. Ao menos quatro deles (a maioria), devem ser “membros de grupos que já sofreram ou podem sofrer discriminação”. Os procedimentos, de acordo com o próprio site da organização, são “confidenciais” – o que significa que há pouquíssima transparência ou supervisão acerca de como a comissão realmente investiga os fatos para chegar a uma conclusão.
No caso de Phillips, foi apresentada uma queixa à comissão, que conduziu investigações e audiências secretas até determinar que o confeiteiro violara a lei anti-discriminação do Colorado. Seguiu-se, então, um processo fechado, que pode ter sido tendencioso.
Na realidade, durante os debates na Suprema Corte, em 5 de dezembro do ano passado, os juízes Anthony Kennedy, Stephen Breyer e Sonia Sotomayor questionaram a hostilidade com que a comissão do Colorado tratou o caso de Phillips, além das observações feitas por alguns de seus integrantes. Isso levanta a questão: o que mais acontece na Comissão de Direitos Civis do Colorado e em comissões similares por todo os EUA?
Segundo a União Americana pelas Liberdades Civis (Aclu, na sigla em inglês), o Colorado é um dos 21 estados norte-americanos que em 2017 incluiu a questão da orientação sexual em suas leis anti-discriminação. Todos os estados contemplam comissões similares à do Colorado, ou alguma agência governamental responsável pela aplicação dos direitos civis – que incluem as leis estaduais anti-discriminação.
O que é particularmente alarmante em casos como o do Colorado é o fato de que a Comissão de Direitos Civis não realiza nenhum tipo de prestação de contas, sem preocupar-se com a transparência. As pessoas acusadas de violar a lei não passam por um processo no qual podem se defender perante um juiz ou um júri. Elas precisam, contudo, apresentar-se obrigatoriamente à agência, que tem natureza totalmente administrativa – ou seja, não judicial.
Em sessão recente da Suprema Corte, o juiz Neil Gorsuch ressaltou que o direito administrativo comumente é imprevisível e arbitrário, o que influencia diretamente na noção fundamental de lealdade para com os litigantes. Nesse sentido, as agências administrativas também atuam de forma imprevisível e arbitrária. Afinal, a composição da comissão do Colorado pode variar ao longo dos anos – a de hoje, por exemplo, pode ser muito diferente da que analisou o caso de Phillips e o ouviu em 2012. Não há consistência sobre os requisitos necessários para os indicados a compor o grupo e nenhuma forma de supervisão sobre o processo. Então, o que pode ser feito?
O Legislativo do Colorado avalia a questão no contexto de uma revisão legal sobre a formação da comissão no estado. Tal processo de revisão deveria conter uma avaliação relacionada ao desempenho de seus integrantes, procurando responder ao questionamento: a comissão tem cumprido o papel para o qual foi criada? Ela poderia ser mais eficaz? O que poderia ser melhorado? Que tal a transparência? Ela poderia desenvolver mais confiança perante a sociedade se for dotada de maior legitimidade?
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Obviamente, nenhuma dessas questões deve ser respondida de forma partidária, e todos os lados envolvidos devem estar preocupados com a legitimidade no processo de, arbitrariamente, apontar casos de discriminação.
E isso vai além do ocorrido no Masterpiece Cakeshop. Os sete membros da comissão são designados a uma população de 5,2 milhões de pessoas. É um membro para 800 mil cidadãos, que representam, coletivamente, uma variedade enorme de pontos de vista, e confiam que eles mesmos não serão discriminados pelo governo.
Inicialmente, os membros do Partido Republicano que fazem parte do Senado do Colorado apresentaram diversas emendas ao projeto de lei que é alvo de análise pelos legisladores do estado. Essas emendas tocam em pontos como a necessidade de mudanças substanciais no processo de nomeação dos integrantes da Comissão de Direitos Civis, além de sua transparência, formulação de relatórios e até a permissão para que as partes envolvidas em um caso analisado possam “recusar” a jurisdição da comissão.
Esse aprimoramento na comissão faz todo o sentido. Nem todas as queixas que chegam até ela são apropriadas – a comissão deveria poder recusar determinados casos –, e as partes envolvidas teriam que poder escolher se reportar a um foro judicial tradicional, se assim desejarem. Caso optem por continuar o caso com a comissão, o grupo deve ser o mais preparado possível para realizar seu trabalho. Grupos LGBT do Colorado se opõem a qualquer mudança no modo de composição da comissão.
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No início de maio, os republicanos desistiram das emendas em prol de um acordo bipartidário com os democratas a fim de aprimorar a comissão substancialmente em dois pontos: primeiro, a comissão aumentaria em tamanho – de sete passaria para nove membros; em segundo lugar, a comissão estaria sujeita a uma auditoria legislativa para fins de transparência e prestação de contas. Ambos os partidos parecem esperançosos quanto à possibilidade de esse acordo aumentar a legitimidade da comissão.
Os estados norte-americanos precisam dar uma boa olhada em suas agências administrativas que analisam denúncias de discriminação. Imparcialidade, legitimidade e devido processo legal são requisitos previstos constitucionalmente.
Espera-se que o Colorado abra caminho para que outros estados revejam, de forma legislativa, a legitimidade de suas comissões, a fim de demonstrar que a proteção legal igualitária é um direito de todos, e não apenas de alguns.
*Jenna Ellis é advogada especializada em Direito Penal e Direito Constitucional, professora do curso de Direito da Colorado Christian University e autora do livro The Legal Basis for a Moral Constitution.
©2018 The Daily Signal. Publicado com permissão. Original em inglês.
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