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O Brasil tem se empenhado em trazer à luz falhas e desvios cometidos no âmbito da gestão pública. Não passa um só dia sem que se tenha notícia de novas denúncias ou do andamento de investigações de casos já revelados. Nesse cenário, o instituto do compliance surge como uma forma de evitar que práticas inadequadas se repitam. 

A expressão, de origem inglesa, indica o esforço dos gestores em dar conformidade aos atos administrativos. Com a Lei 12.846/13, a chamada "Lei anticorrupção", a prática chegou ao setor privado. Na esfera pública, o assunto é tratado pela Lei 13.303/2016, que dispõe sobre o estatuto jurídico da empresa pública, da sociedade de economia mista e de suas subsidiárias. 

Embora seja um mecanismo de controle interno fundamental para a administração pública, o compliance, no Brasil, ganhou força como resposta a episódios de desvios de dinheiro público e de condutas irregulares por parte de agentes públicos. Nessa condição, passou a ser adotado com dois vieses que lhe retiram a força: ora como uma medida burocrática que se destina apenas a prestar contas à sociedade, ora como uma solução milagrosa, como se sua mera existência resolvesse todas as práticas entranhadas na cultura administrativa brasileira. 

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Apesar de sua importância, deve ser visto como uma ferramenta para o aperfeiçoamento da administração pública, mas não como um recurso a ser adotado isoladamente. Mais do que regras, é de uma cultura renovada que precisamos para que a administração pública cumpra seu papel de promover o bem comum, sempre fundamentada nos princípios consagrados na Constituição Federal – legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência. 

A criação formal das estruturas de compliance não leva a resultados efetivos. Cada órgão ou entidade deve pensar a condução ética do processo e o controle dos resultados de acordo com suas especificidades, mesmo porque não existe uma fórmula única. 

Outra questão a ser enfrentada quando se fala no assunto é a da imobilidade. No âmbito do Direito Administrativo, é praticamente unânime a visão de que as duras regras do compliance estão colocando o servidor público entre o medo e a omissão. Há quem chegue a dizer que o administrador público que dorme bem é aquele que indefere, omitindo-se das responsabilidades assumidas pelo exercício do cargo. 

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Deve-se ter em mente que o compliance não é um ponto de chegada, mas um processo de aprimoramento contínuo. Assim, a criação da cultura do compliance demanda a instituição de programas de capacitação e sensibilização dos servidores públicos, em todos os níveis da Administração Pública, principalmente naqueles afetos à alta e média gestão. É necessário instruí-los sobre as alterações legais e o impacto destas nas suas atribuições, pois apenas o conhecimento das regras de conformidade é apto a afastar as inquietações dos servidores. 

Somente com um grande esforço de aprimoramento desse mecanismo e com grandes doses de informação sobre o tema é que esse cenário pode mudar. Com esclarecimento será possível, de um lado, mostrar que a inação pode ser tão maléfica quanto uma conduta inadequada e, de outro, aparar as arestas para afastar o medo que ora recai sobre os gestores públicos que querem agir bem, mas temem ser apanhados pelo cipoal de regras. 

De que adiantam duríssimas regras de compliance que acabam ineficazes por caírem nos extremos do desrespeito ou do imobilismo. Certamente não é esse o espírito das leis adotadas nos últimos anos. Entre a nefasta zona de conforto do “vale tudo” e a zona congelada do “medo de agir”, precisamos encontrar a justa medida, a zona de segurança cujo foco seja a solução dos problemas. É por esse caminho que as regras de compliance podem nos levar ao desejável cenário de uma gestão pública, responsável, ativa e relevante para a promoção da paz social.

*Camila Cotovicz Ferreira é advogada sócia e head do Consultivo Administrativo da Bonini Guedes Advocacia. Colaboradora da Revista Zênite – Informativo de Licitações e Contratos (ILC) e do Blog Zênite.

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