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Nuril Maknun foi condenada a seis meses de prisão por gravar uma ligação em que seu chefe a assediava. Ela foi processada por “distribuição de material pornográfico”. | Richard C. Paddock/The New York Times
Nuril Maknun foi condenada a seis meses de prisão por gravar uma ligação em que seu chefe a assediava. Ela foi processada por “distribuição de material pornográfico”.| Foto: Richard C. Paddock/The New York Times

Contadora em uma escola na Indonésia, Nuril Maknun enfrentava assédios constantes do diretor da instituição, seu chefe. No serviço, ele costumava dar detalhes de sua vida sexual à funcionária e a pressionava para que tivessem um caso. Fora do horário do expediente, ligava para Nuril e continuava com seus monólogos obscenos. 

“Aquele tipo de conversa era tão comum que eu não consigo sequer enumerar quantas vezes aconteceram”, afirmou a contadora. “Eu disse a ele ‘você precisa se consultar com um psiquiatra’”. 

Após meses de assédio, ela decidiu gravar uma das ligações do chefe para ter uma prova de seu comportamento. O resultado: além de perder seu emprego, Nuril foi parar na cadeia. Ao mesmo tempo, a carreira do assediador deslanchou. 

O caso de Nuril, que aguarda análise da Suprema Corte da Indonésia, tornou-se um exemplo bastante público de como o país falha em proteger as mulheres de assédio sexual. Ativistas pelos direitos das mulheres afirmam que abordagens indesejadas de cunho sexual e comentários obscenos, de homens para mulheres, infelizmente são comuns nos escritórios indonésios, sendo que as funcionárias não têm muito o que fazer. 

“Nós não temos leis suficientes de proteção às mulheres e que deem conta desse tipo de assédio”, diz a ativista Tunggal Pawestri. 

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Nuril, que tem 40 anos e três filhos, cresceu em Lombok, uma ilha predominantemente muçulmana a Leste de Bali. Em 2010, ela conseguiu um emprego temporário no setor de contabilidade da escola Seven Mataram. Ela conta que os problemas começaram em 2013, com a chegada de Muslim, então o novo diretor da instituição. 

Em abril, ele passou a conversar com Nuril utilizando termos obscenos, tanto pessoalmente quando por telefone. Muslim lhe deu detalhes sobre suas aventuras sexuais com outra funcionária e perseguiu a contadora para que ela tivesse um caso com ele. Ao mesmo tempo, passou a impressão a outras pessoas, incluindo o marido de Nuril, de que eles realmente estavam se encontrando. Para se proteger, ela decidiu gravar uma das ligações que Muslim fez para ela, em agosto de 2013. 

A ligação, segundo Nuril, foi como todas as demais: o chefe lhe deu detalhes sórdidos sobre sua vida sexual. Ela mostrou a ligação para seu marido e uma colega. Meses depois, uma professora que ficara sabendo a respeito da gravação copiou o arquivo do celular de Nuril enquanto ela estava em outra sala. A contadora disse que, inicialmente, menos de 12 pessoas ouviram o áudio. 

Muslim só soube da existência do arquivo mais de um ano depois. Ele ofereceu estender o contrato temporário de trabalho de Nuril se ela deletasse a gravação – o que não impediria a circulação das cópias, mas tornaria mais difícil para ela ajuizar um processo contra ele. Quando a funcionária se recusou, Muslim a demitiu. 

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A reportagem não conseguiu falar com o diretor, mas seu advogado, Asmuni, afirmou que seu cliente foi a verdadeira vítima no caso. Segundo ele, Nuril violou a lei e mereceu o que lhe aconteceu. 

“Homens também precisam ser protegidos”, disse. “Ela é uma ingrata que não sabe qual é seu lugar”. 

Três meses após demitir Nuril, Muslin foi à polícia e acusou a mulher de difamação. Ela foi interrogada mais de uma dúzia de vezes antes de ser presa, em março de 2017. A promotoria acabou processando a contadora por distribuição de material obsceno, e não difamação. Ela passou dois meses em uma prisão de Lombok. No julgamento, professores da escola onde ela trabalhava depuseram no sentido de que eles, e não Nuril, distribuíram a gravação. 

“Ela gravou a ligação para sua própria proteção”, disse o advogado de Nuril, Joko Jumadi. “Ela manteve a gravação em segredo por muito tempo. E mesmo quando o arquivo vazou, não foi ela quem o distribuiu”. Já Muslim alegou que não estava descrevendo sua vida sexual na ligação, mas fantasias com uma atriz pornô americana. 

Processo sem fim

O júri considerou Nuril inocente, mas a saga não acabou aí: na Indonésia, os promotores podem apelar do veredito. E levaram o caso à Suprema Corte, onde os juízes – sem audiência – reverteram a sentença em novembro, considerando Nuril culpada pela distribuição de material pornográfico por meio eletrônico. 

O painel de três juízes a condenou a seis meses de cadeia e ao pagamento de uma multa equivalente a R$ 130 mil, quantia que, para sua família, é uma fortuna. Se o valor não for pago, a pena de prisão aumenta em três meses. 

“Fiquei muito chocada porque todas as testemunhas foram bem claras, dizendo que não fui eu que divulguei o material”, diz Nuril, engolindo o choro. 

O resultado do julgamento gerou uma comoção pública. Tanto que o presidente da Indonésia, Joko Widodo, que concorre à reeleição em abril, deu a entender que pode anistiar Nuril se a Suprema Corte rejeitar sua apelação final, na qual o advogado da contadora acabou de dar entrada. 

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“Se a revisão do caso não se provar justa, ela pode então pedir clemência ao presidente. Uma vez feito o pedido formal, poderei então agir”, afirmou Joko aos repórteres. 

Já o escritório do promotor-geral, Muhammad Prasetyo, deixou claro que qualquer punição ficará em suspenso até a decisão da apelação. 

Por outro lado, Muslim parece ter sofrido consequências profissionais mínimas do episódio. Depois que as gravações vieram a público, ele perdeu o cargo de diretor, é verdade... para ganhar uma posição ainda mais alta no governo de Mataram, a capital da província de Lombok. 

“Ele está saudável, aproveitando a vida. É respeitado pelo governo, que vai mantê-lo no cargo, ou seja, continua no poder”, resume Asmuni, seu advogado.

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