Obrigada a rezar e anotar versículos da Bíblia em sala de aula, uma aluna de escola pública de Campinas deve ser indenizada por danos morais pelo estado de São Paulo. A decisão é da 5ª Câmara de Direito Público do Tribunal de Justiça de São Paulo (TJ-SP), que considerou que o princípio constitucional da liberdade religiosa não foi respeitado no caso. As informações são da assessoria do tribunal.
Estudante do terceiro ano do ensino fundamental quando ocorrido o episódio, a menina e seus pais são seguidores do candomblé. Segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), à época da coleta de dados para o Censo de 2010 0,3% da população era praticante de religiões de matriz africana.
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De acordo com os autos, a professora da garota, com o conhecimento da direção e coordenação do colégio, tinha o hábito de interromper as atividades da classe para realizar orações coletivas. Ao se recusar a participar, a menina, que foi representada pela mãe no processo, acabou sendo alvo de bullying dos outros estudantes.
“O Estado, especialmente a instituição de ensino pública, não deve promover uma determinada religião ou vertente religiosa de forma institucional e não facultativa, ainda que não oficialmente, notadamente quando aqueles que optam por não rezar ou não se sentem representados tenham que se submeter à prática da oração, o que pode ocasionar em segregações religiosas, separatismos, discórdias e preconceitos”, escreveu a desembargadora Maria Laura Tavares, relatora da ação no TJ-SP, no acórdão.
Importante ressaltar que as aulas em questão não tinham cunho religioso. Escolas públicas podem ofertar classes de ensino religioso confessional, em caráter facultativo — ou seja, sem a obrigatoriedade de participação de todos os alunos. O tema foi, inclusive, alvo de ação no Supremo Tribunal Federal (STF), julgada em 2017. Para a Corte, esse tipo de aula não fere a laicidade do Estado. Como a Gazeta do Povo já esclareceu, o fato de um Estado ser laico não pressupõe que as questões religiosas devem ser estritamente privadas, mas apenas que não se deve coibir ou privilegiar determinada religião em suas políticas públicas.
Nossas convicções: Liberdade de expressão e Estado laico
“O desrespeito à liberdade religiosa e a imposição de prática de cunho religioso de forma institucional e obrigatória em instituição de ensino pública violam o direito da personalidade das autoras [mãe e aluna], notadamente quanto à liberdade de pensamento, identidade pessoal e familiar”, complementou a magistrada, cujo entendimento foi seguido pelos colegas da 5ª Câmara, desembargadores Fermino Magnani Filho e Francisco Bianco.
A família também processou a professora da garota. O entendimento do STF, entretanto, é que o Estado responde de forma objetiva — ou seja, sem a necessidade de comprovação de dolo ou culpa — pelos atos de seus agentes. A Administração Pública, entretanto, poderá apurar eventual dolo ou culpa da funcionária pelos danos causados e, se for o caso, cobrar o devido ressarcimento em regresso. O valor da indenização foi arbitrado em R$ 8 mil.
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