Por maioria, o Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu, na quarta-feira (27), que o Estado tem responsabilidade civil por um dano causado em cartório, ainda que o erro tenha sido cometido por tabeliães e oficiais de registro. Os ministros ainda assentaram que o Poder Público tem a obrigação de entrar com ação para cobrar na Justiça o agente responsável pelo erro, nos casos em que há dolo ou culpa.
Como o processo tem repercussão geral, a decisão deve ser seguida por todos os juízes do país, e ainda destravar cerca de 70 processos que aguardavam a palavra do STF sobre o assunto. Os ministros fixaram a tese ao julgar um recurso do estado de Santa Catarina, que tentava reverter essa responsabilização na Suprema Corte. O caso envolve um erro de grafia de um tabelião que ocasionou um atraso de cerca de três anos no recebimento do benefício de pensão por morte por um segurado.
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O ocorrido tratado nos autos remonta a 2003, quando Sebastião, em função da morte de sua esposa, entrou com ação previdenciária no Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) a fim de obter a pensão por morte. O benefício, contudo, foi negado porque na certidão de óbito de sua mulher o nome estava com a grafia errada - em vez de Angela, estava escrito Angelina.
O nome foi corrigido por decisão judicial, mas o benefício não foi recebido de imediato devido ao erro. Segundo os advogados de Sebastião, o ocorrido fez com que ele deixasse de receber os valores do benefício por cerca de três anos, de 2003 a 2006. O Tribunal de Justiça de Santa Catarina (TJ-SC), então, condenou o Poder Público catarinense a pagar indenização por danos materiais, no valor de um salário mínimo mensal, entre o período de 26 de julho de 2003 até 21 de junho de 2006, com acréscimo de juros e atualização monetária. Contra essa sentença, Santa Catarina recorreu ao Supremo.
“Não há nenhuma dúvida de que o serviço de registro é um serviço público”, observou o ministro Alexandre de Moraes, ao votar pela responsabilização estatal. O ministro destacou que, mesmo que a atividade seja exercida em caráter privado, isso não exime o Estado de sua responsabilidade direta em torno das funções do cartório.
Divergência
Os ministros Luís Roberto Barroso, Edson Fachin e Marco Aurélio Mello votaram de forma diferente. Fachin, responsável por abrir a divergência, entendeu pela possibilidade de serem simultaneamente demandados na ação tanto o tabelião quanto o Estado. Para Barroso, a pessoa que foi atingida pelo erro deveria entrar com uma ação contra o tabelião envolvido, tendo ainda há possibilidade de incluir o Estado na ação. Ou seja, a responsabilidade primária seria do tabelião ou do registrador, mas o Estado poderia ter de pagar a indenização em caso de insolvência.
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Barroso fez um aparte em seu voto para destacar que o Estado não pode continuar sendo responsabilizado por tudo, partindo de um entendimento falso de que os recursos públicos são “infinitos”. O ministro chamou atenção para o fato de que as receitas do cartório não são destinadas ao governo, e que não faria sentido que, quando alguém precise ser indenizado por um erro no serviço prestado, o Estado tenha que arcar com a indenização. “Essa conta não fecha”, observou o ministro.
“Essa ideia de que o Estado tem de ser responsabilizado por tudo tem de ser revisitada, essa ideia de que se criou no Brasil de que o Estado pode tudo, tem dinheiro para tudo, que o público não é de ninguém e é infinito” disse Barroso, ressaltando ainda que o dinheiro que sai dos cofres públicos para pagar indenizações poderia, no melhor cenário, ser destinado para a educação e a saúde.
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