Um dia depois de o presidente Jair Bolsonaro sinalizar que pode discutir o fim da Justiça do Trabalho, o presidente da Associação Nacional dos Magistrados da Justiça do Trabalho (Anamatra), Guilherme Feliciano, divulgou nesta sexta-feira (4) nota em que afirma que “tese” de extinção da Justiça do Trabalho é um equívoco e poderia abrir precedente para a proposta de suprimir até o Supremo Tribunal Federal (STF).
“A se admitir que o presidente da República ou qualquer parlamentar, por sua livre iniciativa e sem discutir a questão com o presidente do Supremo Tribunal Federal, possa enviar ao Congresso Nacional uma proposta de extinção da Justiça do Trabalho, suprimindo os correspondentes incisos do art. 92 da Constituição, poder-se-ia admitir também o absurdo de poderem apresentar e aprovar emenda constitucional que suprima o próprio Supremo Tribunal Federal”, alertou Feliciano.
Em entrevista exibida na última quinta-feira (3) no SBT, o presidente Jair Bolsonaro sinalizou que pode vir a discutir o fim da Justiça do Trabalho – e também afirmou que quer aprofundar a reforma da legislação trabalhista.
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Na primeira entrevista após a posse, Bolsonaro usou exemplos do exterior e disse que os processos trabalhistas têm de tramitar na Justiça comum. Para o presidente, há um “excesso de proteção” aos trabalhadores.
Feliciano afirmou que a proposta de Bolsonaro seria um “gravíssimo abalo” entre o equilíbrio dos três poderes, que fundamenta o sistema de freios e contrapesos. “O raciocínio demonstra como a proposta ventilada por S.Ex.a oculta gravíssimo abalo no sistema de freios e contrapesos sobre o qual se assentam as fundações republicanas. Qualquer iniciativa tendente a alterar a estrutura constitucional do Poder Judiciário brasileiro compete originária e privativamente ao Supremo Tribunal Federal, excluídos os demais poderes da República”, concluiu o presidente da Anamatra.
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“No que toca à gestão pública, se o problema que o presidente da República identifica é o de uma legislação trabalhista excessivamente protecionista, a gerar mais litígios trabalhistas do que os necessários – tese a se discutir com profundidade junto à sociedade civil e ao Parlamento brasileiro –, a proposta de suprimir a jurisdição trabalhista especializada simplesmente não condiz com o diagnóstico feito. Há um claro equívoco na relação entre causa e consequência, em que se busca culpar a janela pela paisagem”, afirmou Feliciano.
Legislação
Na nota, o presidente da Anamatra ressaltou ainda que os juízes do Trabalho “têm competência constitucional para conhecer e julgar os litígios trabalhistas que chegam a eles, na medida e do modo que possam chegar, à luz da legislação trabalhista em vigor e em função das condições econômicas do país”.
“Transferir essa competência para a Justiça comum, absolutamente, não muda este quadro. A litigiosidade trabalhista continuará rigorosamente a mesma, sob o manto da mesma legislação trabalhista e com os mesmos obstáculos no campo econômico”, observou.
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*** Leia a nota da Anamatra na íntegra:
Nota à imprensa - “tese” de supressão da Justiça do Trabalho
A Associação Nacional dos Magistrados da Justiça do Trabalho (Anamatra) vem a público manifestar-se, com respeito sobre às declarações feitas pelo presidente da República, Jair Bolsonaro, em entrevista divulgada nesta quinta p.p. (3/1), nos seguintes termos .
1. No que toca à gestão pública, se o problema que o presidente da República identifica é o de uma legislação trabalhista excessivamente protecionista, a gerar mais litígios trabalhistas do que os necessários - tese a se discutir com profundidade junto à sociedade civil e ao Parlamento brasileiro -, a proposta de suprimir a jurisdição trabalhista especializada simplesmente não condiz com o diagnóstico feito. Há um claro equívoco na relação entre causa e consequência, em que se busca culpar a janela pela paisagem.
2. Os juízes do Trabalho têm competência constitucional para conhecer e julgar os litígios trabalhistas que chegam a eles, na medida e do modo que possam chegar , à luz da legislação trabalhista em vigor e em função das condições econômicas do país. Transferir essa competência para a Justiça comum, absolutamente, não muda este quadro. A litigiosidade trabalhista continuará rigorosamente a mesma, sob o manto da mesma legislação trabalhista e com os mesmos obstáculos no campo econômico.
3. Do ponto de vista jurídico-constitucional, por outro lado, vale registrar que a Justiça do Trabalho, desde o Tribunal Superior do Trabalho até os juízes do Trabalho de primeiro e segundo graus, tem previsão no art. 92 da Constituição da República (mesmo artigo que acolhe, no inciso I, o Supremo Tribunal Federal, encabeçando o sistema judiciário brasileiro). A se admitir que o presidente da República ou qualquer parlamentar, por sua livre iniciativa e sem discutir a questão com o presidente do Supremo Tribunal Federal, possa enviar ao Congresso Nacional uma proposta de extinção da Justiça do Trabalho, suprimindo os correspondentes incisos do art. 92 da Constituição, poder-se-ia admitir também o absurdo de poderem apresentar e aprovar emenda constitucional que suprima o próprio Supremo Tribunal Federal.
4. O raciocínio demonstra como a proposta ventilada por S.Ex.a oculta gravíssimo abalo no sistema de freios e contrapesos sobre o qual se assentam as fundações republicanas. Qualquer iniciativa tendente a alterar a estrutura constitucional do Poder Judiciário brasileiro compete originária e privativamente ao Supremo Tribunal Federal, excluídos os demais poderes da República.
5. Na temática em questão, nenhum açodamento será bem-vindo. A Magistratura do Trabalho está, como sempre esteve, aberta ao diálogo democrático, o que sempre exclui, por definição, qualquer alternativa que não seja coletivamente construída.
Brasília, 3 de janeiro de 2019.
Guilherme Guimarães Feliciano
Presidente
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