Um indivíduo que se identifica socialmente como mulher, ainda que nascido num corpo masculino, está amparado pela Lei Maria da Penha (Lei 11.340/2006). Foi o que entendeu um desembargador da Quarta Câmara Criminal do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro (TJ-RJ), ao conceder medidas protetivas a uma mulher transexual agredida pelo companheiro, um homem transgênero - ou seja, nascido mulher.
Segundo consta no processo, a autora da ação, 48 horas após ser agredida pelo namorado, requereu medidas protetivas de proibição de aproximação do agressor. Ela chegou a ser encaminhada a exame de corpo de delito. O pedido, contudo, foi negado pelo juizado de violência contra a mulher.
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O namorado, em contrapartida, também procurou a polícia como se fosse ele o agredido, apresentando os documentos em que ainda constam nome e gênero feminino e omitindo o fato de que ele e a companheira são transexuais. Ele conseguiu a proteção com base na Lei Maria da Penha. Inconformada, a autora recorreu, sob a alegação de que o juiz de primeiro grau levou em consideração somente o critério biológico para proferir a sentença.
A defensora pública Leticia Oliveira Furtado, que representou a mulher trans na ação, anotou que o intuito da Lei Maria da Penha é promover a ampla e irrestrita proteção às mulheres vítima de violência de gênero, “sem fazer qualquer tipo de discriminação entre elas, seja com relação à raça, idade, orientação sexual, classe social ou identidade de gênero”. Pelo raciocínio da defensora, mulheres transexuais e travestis também estariam amparados pelo texto legal.
O desembargador João Ziraldo Maia, relator do processo no TJ-RJ, afirmou que o Judiciário, enquanto instituição que preza pelo zelo dos cidadãos, não pode deixar de promover o bem social a todos os indivíduos, inclusive aquele nascido com sexo biológico masculino, mas que “socialmente vivencia a inadequação no papel social do gênero de nascença, e de forma ativa a identificação ostensiva correlata ao gênero oposto ao de nascimento”.
Relação entre mulheres
Recentemente, a Justiça também reconheceu que a Lei Maria da Penha pode ser aplicada em relações entre mulheres. Em decisão publicada no fim de setembro, o magistrado do Juizado de Violência Doméstica da comarca de Rio Verde (GO), ao analisar o caso de uma mulher agredida fisicamente com tapas e socos por sua ex-companheira, entendeu que a violência praticada estava baseada no gênero, e que isso independe da orientação sexual.
A determinação diverge da manifestação do Ministério Público (MP), que se posicionou de forma contrária a essa interpretação.
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