A Justiça do Rio Grande do Sul liberou novamente, na noite desta quinta-feira (21), a exibição da peça “O Evangelho Segundo Jesus, Rainha do Céu” em Porto Alegre. No enredo, Jesus volta aos dias atuais como uma mulher transsexual. O Tribunal de Justiça do estado (TJ-RS) anulou, por questões processuais, uma primeira decisão que autorizava a exibição. Agora, o juiz Ângelo Furlanetto Ponzoni tampouco viu crime de ultraje a culto, apologia a crime ou discriminação religiosa na encenação de Jesus Cristo por uma transsexual. Na semana passada, um juiz de Jundiaí, interior de São Paulo, proibiu a exibição da peça.
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“Não há vilipêndio público a ato ou objeto de culto religioso, não há prática de discriminação ou preconceito religioso etc. - a não ser que se reconheça uma pessoa travesti como indigna de ser filho de Deus”, escreveu Ponzoni, que negou o pedido de liminar para suspender a peça. O advogado Pedro Geraldo Cancian Lagomarcino Gomes, autor da ação, alegava a ocorrência dos crimes previstos pelos artigos 208 e 287 do Código Penal e pelo artigo 20 da Lei 7.116/1989.
Código Penal
Art. 208 - Escarnecer de alguém publicamente, por motivo de crença ou função religiosa; impedir ou perturbar cerimônia ou prática de culto religioso; vilipendiar publicamente ato ou objeto de culto religioso
Art. 287 - Fazer, publicamente, apologia de fato criminoso ou de autor de crime
Lei 7.116/1989
Art. 20 – Praticar, induzir ou incitar a discriminação ou preconceito de raça, cor, etnia, religião ou procedência nacional
“Não há, reiterando a vênia, a prática de ilícito no fato de uma peça teatral propor que ‘Jesus volte nos dias de hoje como travesti’, como quer a inicial [do advogado]. A própria inicial [...] descreve: ‘...o autor faz questão de deixar registrado na presente ação, que nada tem contra aos integrantes do movimento LGBT. (sic). Muito pelo contrário, tem, por cada integrante, destacamos, na condição de seres humanos, total respeito’. Assim, se a própria inicial reconhece a condição de ser humano aos integrantes do movimento LGBT, como assevera, merecedores de total respeito, não há crime presente”, escreveu o juiz em sua decisão.
Procurado pela reportagem, o autor da ação, Pedro Geraldo Cancian Lagomarcino Gomes, não quis enviar sua petição inicial.
Divergências
O juiz Luiz Antonio de Campos Júnior, da 1ª vara cível da comarca de Jundiaí, concedeu, na sexta-feira (15), uma decisão liminar para suspender a exibição da peça “O Evangelho Segundo Jesus, Rainha do Céu” no SESC Jundiaí. De acordo com o juiz, uma advogada entrou com a ação argumentando que a exibição “vai de encontro à dignidade cristã, posto apresentar JESUS CRISTO como um transgênero, expondo ao ridículo os símbolos como a cruz e a religiosidade que ela representa” [destaque no original].
O magistrado aceitou conceder a tutela de urgência, afirmando que não se pode expor figuras religiosas e sagradas ao ridículo e que a peça é de “indiscutível mau gosto”. Ponderou ainda: “não se olvide da crença religiosa em nosso Estado, que tem JESUS CRISTO como o filho de DEUS, e em se permitindo uma peça em que este HOMEM SAGRADO seja encenado como um travesti, a toda evidência, caracteriza-se ofensa a um sem número de pessoas” [destaques no original].
Campos Júnior disse que levou em conta a liberdade de expressão, mas que ela “não se confunde com agressão e falta de respeito”. “Não se pode admitir a exibição de uma peça com um baixíssimo nível intelectual que chega até mesmo a invadir a existência do senso comum, que deve sempre permear por toda a sociedade”, argumentou na liminar.
Nesta segunda-feira (19), o juiz José Antonio Coitinho, 2ª Vara da Fazenda Pública da Comarca de Porto Alegre, negou um pedido semelhante, feito pelo advogado Pedro Geraldo Cancian Lagomarcino Gomes, para impedir a exibição da peça em Porto Alegre. Gomes alegou ultraje a culto e discriminação religiosa.
“Não há falar em agressão à cultura ou à formação do caráter de quem quer que seja. No popular, diríamos, irá quem quiser ver. E, sem citar um único artigo de lei, vamos garantir a liberdade de expressão dos homens, das mulheres, da dramaturga transgênero e da travesti atriz, pelo mais simples e verdadeiro motivo: porque somos todos iguais. Je suis Charlie”, escreveu o magistrado na sentença, fazendo referência ao caso dos jornalistas da revista Charlie Hebdo, assassinados por radicais islâmicos em janeiro de 2015.
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