Os norte-americanos consideram já há muito tempo que ninguém pode cuidar melhor dos filhos do que os próprios pais. O Estado só deveria intervir na família quando houvesse provas claras de abuso ou negligência.
Isso está firmado há muito tempo em nossas leis. Mas, agora, a ideologia transgênero está calando os médicos e questionando a forma como os tribunais definem abuso e negligência parental.
Ano passado, em Ohio, um juiz tirou a custódia de uma menina biológica de seus pais depois que eles se recusaram a ajudá-la em sua “transição” para se tornar menino com suplementos de testosterona. A Clínica de Tratamento de Transgêneros do Hospital Pediátrico de Cincinnati recomendava esse tratamento para disforia de gênero (condição caracterizada por uma não-identificação com o próprio sexo biológico).
Como os pais da menina quiseram tratá-la com terapia, o Serviço Social do Condado de Hamilton os acusou de abuso e negligência, enquanto ativistas transgêneros e médicos pró-transgêneros compararam a decisão dos pais da menina a negar tratamento contra a asma e até mesmo contra o câncer. Tudo isso aconteceu sem uma legislação federal a respeito do assunto.
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Agora, porém, uma das principais prioridades legislativas da deputada federal democrata Nancy Pelosi, a Lei de Igualdade, pode dar à comunidade transgênero poder sobre os médicos. O texto pode dar vazão a uma enxurrada de processos contra médicos que não ajam de acordo com a ideologia transgênero.
A politização do tratamento médico da disforia de gênero pode levar a mais perseguições contra pais que se recusem a ajudar na esterilização dos filhos. Enquanto mais e mais médicos recomendam que crianças tomem bloqueadores de puberdade aos 11 anos, hormônios do sexo oposto aos 16 e se submetam a cirurgias de “redesignação sexual” aos 18, pais que resistem a isso podem ter de responder a acusações de abuso infantil e perder a custódia dos filhos.
A tragédia em Ohio pode se repetir em famílias de todo o país.
Transformando a lei numa arma contra os médicos
O movimento transgênero quer dominar a medicina e, para tanto, está ameaçando os médicos e hospitais.
Alguns estados já aprovaram leis semelhantes à Lei de Igualdade de Pelosi. Em Nova Jersey, ativistas transgêneros processaram hospitais católicos por “discriminação” com base na identidade de gênero porque eles não queriam realizar cirurgias de mudança de sexo em pacientes com disforia de gênero.
Esses processos podem parecer um absurdo, mas eles foram incentivados por leis estaduais antidiscriminação que tratam a orientação sexual e a identidade de gênero como temas protegidos e as instalações de saúde como acomodações públicas. O texto da Lei de Igualdade faz o mesmo.
O projeto apresentado por Pelosi pretende acrescentar a orientação sexual e a identidade de gênero à Lei dos Direitos Civis de 1964, deixando hospitais e médicos de todo o país vulneráveis a custosos processos na Justiça se não seguirem as recomendações médicas do movimento transgênero. Ele transformaria a lei antidiscriminação – elaborada para proteger grupos minoritários sem direito a voto – numa arma de coerção para ameaçar médicos e levá-los a se submeter à ideologia transgênero.
A ideologia transgênero contribui para a boa medicina?
Em parte, alguns médicos resistem à ideologia transgênero por ela ser incompatível com a boa medicina e por mais prejudicar do que ajudar os pacientes.
O manual de transtornos mentais da Associação Psicológica Norte-Americana classifica a disforia de gênero como uma doença mental. Pesquisas mostram que 75% a 95% das crianças com disforia de gênero que passam pela puberdade sem qualquer tratamento na verdade acabam, no fim, ficando à vontade com seus corpos.
Mas o movimento transgênero ignora essas estatísticas, fazendo uma pressão agressiva para que crianças com disforia de gênero sejam tratadas com drogas não aprovadas pela FDA (Food and Drug Administration, órgão similar à Anvisa), apesar de elas apresentarem efeitos colaterais como perda da densidade óssea, declínio das capacidades cognitivas e infertilidade.
A doutora Michelle Cretella, diretora-executiva do Colégio Norte-Americano de Pediatria, descreve a situação como “abuso infantil institucionalizado”.
Ativistas transgêneros já tentaram calar os médicos que alertavam os pacientes quanto a esses perigos. A Human Rights Campaign – um importante grupo LGBT – dedica um site inteiro a tentar desmoralizar o doutor Paul McHugh, ex-psiquiatra-chefe do hospital da Universidade Johns Hopkins que interrompeu a oferta de cirurgias de redesignação sexual na instituição. McHugh diz que as cirurgias estavam “essencialmente cooperando com uma doença mental”.
Ativistas trans estão colocando a responsabilidade nas crianças e nos médicos
Ativistas transgêneros e médicos favoráveis à causa geralmente tentam excluir os pais do processo de decisão médica. A Clínica de Tratamento de Transgêneros do Hospital Pediátrico de Cincinnati diz que pais podem ser excluídos de entrevistas porque acredita-se que a presenta deles pode fazer com que as crianças não se sintam à vontade para responder às perguntas.
O mais incrível é que essa clínica considerou 100% dos pacientes que buscaram tratamento como “candidatos propícios para a continuidade do tratamento de gênero”. Até mesmo o juiz de Ohio que cassou os direitos parentais de um casal expressou “preocupação” com essa incrível taxa de aprovação.
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Defensores da causa ignoram tais preocupações dizendo que crianças que sofrem de disforia de gênero correm um risco maior de cometer suicídio se não receberem tratamento com hormônios.
Mas as provas sugerem que são os tratamentos de mudança de sexo que podem aumentar a probabilidade de suicídio. Um estudo sueco em adultos que se submeteram a cirurgias de redesignação sexual mostrou que eles tinham uma probabilidade 19 vezes maior do que a população em geral de cometerem suicídio depois da operação. Isso é relevante porque, na Suécia, o apoio cultural aos que se identificam como transgêneros é muito forte, então o estigma social provavelmente não tem a ver com os suicídios.
Temos que ter uma cautela especial com tratamentos experimentais em crianças porque os efeitos a longo prazo dos tratamentos em transgêneros ainda são desconhecidos. Até mesmo centros de saúde pública durante a administração Obama afirmaram que “a taxa de mortalidade dessa população não se manifesta a não ser após uma década”.
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O endocrinologista Michael Laidlaw também alerta que os efeitos a longo prazo em crianças só aparecem quando, na juventude, surge a pergunta “por que não posso mais ter filhos?”. A resposta:“Bom, é porque a fertilidade deles foi destruída por uma combinação qualquer de bloqueadores de puberdade, hormônios sexuais e cirurgia”, responde o doutor.
E o doutor Stephen B. Levine, professor de Psiquiatria da Faculdade de Medicina da Case Western Reserve University, faz uma pergunta bastante pertinente: as crianças são realmente capazes de entender o modo como o tratamento hormonal vai mudar suas vidas e deixá-las inférteis? Há um motivo para termos leis de consentimento informado: para impedir que se tire vantagem das pessoas, incluindo das crianças.
Incentivando uma má tendência
Neste clima político e cultural, médicos e tribunais tendem cada vez mais a excluir os pais de decisões capazes de mudar a vida de seus filhos.
Os Estados Unidos têm testemunhado um aumento drástico na quantidade de “clínicas de gênero” e diagnósticos de “disforia de gênero” nos últimos anos. Em 2013, havia apenas três clínicas desse tipo nos Estados Unidos. Hoje há mais de 41. Essas clínicas registram um aumento de 400% no número de crianças e adolescentes identificados como trans.
A Lei de Igualdade incentivaria essa tendência ao dar ao movimento transgênero uma importante arma jurídica para direcionar o consenso médico a ponto de tirar os direitos dos pais.
Enquanto mais e mais pais lutam para encontrar as soluções mais úteis e carinhosas para seus filhos que sofrem com disforia de gênero, o governo deveria lhes dar apoio – em vez de prejudicá-los. Os pais devem continuar sendo os entes fundamentais no processo de tomada de decisão quando se trata da saúde de crianças que sofrem de disforia de gênero.
* Emilie Kao é diretora do Richard and Helen DeVos Center for Religion & Civil Society da Heritage Foundation.
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