A velha pergunta sobre que autoridade legal possuem padrastos e madrastas sobre seus enteados tem suscitado dúvidas diversas, nos últimos tempos. Tudo porque, ao contrário do que se imagina, esta não se trata de uma questão que envolva “afeto” entre enteados e padrastos e sim “substituição” dos padrastos e madrastas pelos pais no cuidado e atenção com os enteados.
O entendimento é de advogados especializados em Direito de Família, que têm chamado a atenção para o fato de serem observadas confusões sobre resolução publicada pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ) que autoriza duas pessoas do mesmo sexo a terem direito sobre o menor.
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O CNJ permite o registro de um filho com o nome de mais de um pai, mas a intenção do órgão, quando criou esta possibilidade, foi permitir que pais homossexuais pudessem dar o nome ao do filho. Como a regra é válida para outras situações de casais heterossexuais que assim desejem também, começou a surgir no país uma dúvida sobre se os padrastos e madrastas passariam a ter mais poderes, a partir desta resolução. O que os profissionais do Direito descartam.
Segundo a advogada em Direito de Família Regina Beatriz Tavares da Silva, ao contrário do que se pensa, a questão da responsabilidade legal do padrasto ou da madrasta para com os enteados está relacionada à substituição dos pais. “Padrasto não é pai. Madrasta não é mãe. Se não houver a substituição, no plano dos fatos, do pai pelo padrasto ou da mãe pela madrasta, ou então, o ato de vontade do registro civil realizado com o consentimento de todas as partes (pai,mãe, padrasto e/ou madrasta), eles devem continuar sendo chamados de padrasto e madrasta, não de pais”, afirma.
A advogada chama a atenção para o fato de que mesmo em relação ao vínculo de parentesco por afinidade, padrastos e madrastas não são pais, porque embora possuam ligação afetiva, não têm os deveres nem os direitos dos pais, portanto não possuem poder familiar.
“Hoje em dia se tenta distorcer as situações, dizendo que porque casou com uma pessoa, vai ser pai ou mãe dos seus filhos. Isto só acontece caso o pai ou mãe biológicos não estejam presentes, não tenham proximidade com os filhos ou os tenham abandonado. Aí sim, é possível pedir a desconstituição da paternidade para adotar a criança ou, se for o caso, assumir uma relação sócio afetiva (com as devidas responsabilidades sobre os enteados)”, ressalta Regina.
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Responsabilidade sócio afetiva
O artigo 1.637 do Código Civil estabelece que se o pai ou a mãe abusarem de sua autoridade, faltando aos deveres a eles inerentes ou arruinando os bens dos filhos, cabe ao juiz, requerendo a algum parente ou ao padrasto, adotar a medida que lhe pareça reclamada pela segurança do menor e seus haveres, até mesmo suspendendo o poder familiar, quando convier.
Mas essa desconstituição não é necessária para que seja considerada a responsabilidade sócio afetiva de um padrasto sobre o enteado. A exigência é apenas que o pai ou mãe seja omisso ou ausente.
“Para ser configurado legalmente um caso de substituição não é preciso desconstituir o poder paterno ou materno. Basta uma omissão ou distanciamento do pai ou da mãe”, explica o advogado Alexandre Fernandes, também especializado em Direito de Família.
Segundo ele, o STF já considerou a possibilidade de coexistência de um pai biológico com o pai sócio afetivo, desde que haja a distância do pai biológico. “O pai sócio afetivo também tem deveres, como o de pagar pensão alimentícia aos enteados em caso de separação da esposa e vice-versa. Ele será obrigado a prestar essa assistência material aos enteados, mesmo em caso de fim do casamento”, explica.
Regina Beatriz lembra que existe um projeto de lei em tramitação no Senado, denominado Estatuto das Famílias, que estabelece, caso venha a ser aprovado, a quem casou com homem ou mulher que tenha filhos, que esta pessoa passe a ser pai ou mãe sócio afetivo deles, independentemente da relação existente e da ausência do pai ou da mãe. A proposta, na visão dos juristas, é tão absurda que a matéria está parada – e tem poucas possibilidades de vir a prosperar. Até porque implicaria, em caso de separação do casal, que o padrasto ou madrasta continue tendo responsabilidade legal sobre o enteado obrigatoriamente, inclusive com dever de pagar pensão alimentícia.
“Se uma mãe ou pai cria, educa, está sempre com os filhos, a madrasta ou o padrasto jamais terão o poder familiar. Esse ponto é importante destacar para que todos fiquem atentos às diferenças”, alerta Regina Beatriz.
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“Padrasto e madrasta não têm que ser pai e mãe, só se exercerem amplamente esta função. Sempre a visão deve ser feita levando em conta o fato de eles estarem, de fato, substituindo os verdadeiros pais em suas obrigações”, acrescenta a advogada.
“Um padrasto ou madrasta, independentemente do grande afeto que tenha pela criança ou adolescente, no caso desta ter pais presentes, não será pai e mãe de jeito algum. As pessoas precisam entender isso e colocar as coisas no seu devido lugar”, ressalta ainda Alexandre Fernandes. “Há mulheres que acham que porque outra mulher casou com o ex-marido passará a ser sua concorrente. Isso não existe legalmente”.
Regina Beatriz lembra que existe um projeto de lei em tramitação no Congresso Nacional que estabelece, caso venha a ser aprovado, a quem casou com homem ou mulher que tenha filhos, que esta pessoa passe a ser pai ou mãe sócio afetivo, independente da distância ou não dos pais. A proposta, na visão dos juristas, é tão absurda que a matéria está parada – e tem poucas possibilidades de vir a prosperar. Até porque implicaria, em caso de separação do casal, que o padrasto ou madrasta continue tendo responsabilidade legal sobre o enteado obrigatoriamente, não por vontade expressa judicialmente.
Sobrenome dos padrastos
Desde 2009, a Lei de Registros Públicos (Lei 6.015/73) passou a autorizar que enteados adotem o nome de família do padrasto ou da madrasta. A legislação, conforme o entendimento de vários tribunais, não exige que o pai ou mãe biológicos concordem com tal acréscimo. Num destes casos, em maio passado, a 8ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul manteve sentença que julgou procedente uma ação de retificação de registro civil.
O pai considerou o pedido descabido e recorreu contra a decisão, afirmando que não se trata apenas de retificação do registro original de um menor, mas de caso de alienação parental.
A avaliação do desembargador Rui Portanova, do TJRS, entretanto, foi de que não existe legitimidade do pai registral para figurar no processo, já que os autos não discutem a exclusão do sobrenome dele.
‘‘A lei não fala e nem cogita na necessidade de concordância do pai biológico com tal acréscimo, advindo daí a projeção de que a ele faltaria legitimidade para figurar neste processo, inclusive para recorrer contra a sentença. Também não se pode falar em cerceamento da defesa, já que a pretensão do autor é apenas acrescentar ao nome do apelado o sobrenome do padrasto. E essa possibilidade vem expressa no artigo 57 da Lei de Registros Públicos (Lei 6.015/1973), desde 2009, por mudança fixada pela Lei 11.924”, afirmou.
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