É cada vez maior a importância que parcerias entre a Administração Pública e particulares têm assumido na concretização de projetos essenciais à população. Seja na prestação de serviços como iluminação, saneamento básico e mobilidade urbana; seja na gestão de ativos públicos como praças, parques e museus, as concessões comuns e as parcerias público-privadas (PPPs) têm se mostrado uma alternativa para garantir eficiência e viabilizar investimentos que o erário não teria condições de realizar.
Mas, ante tantas vantagens, por que existem gestores públicos que ainda não se valem de tais ferramentas, capazes de expandir a oferta de serviços públicos e de aprimorar sua qualidade, reduzir gastos públicos e, ainda, aquecer a economia?
Afora o preconceito com o novo, a resposta parece estar na dificuldade para estruturar e desenvolver tais projetos de parceria. Afinal, PPPs não fazem mágica e não são a solução para todas as demandas socioeconômicas (muito embora haja quem assim as apresente). São, sim, projetos de elevada complexidade, que exigem planejamento, conhecimento e maturidade institucional para se consolidar.
Em que pese os administradores públicos poderem identificar espaços propícios a concessões comuns e PPPs, nem sempre dispõem de corpo técnico capaz de elaborar e avaliar estudos de viabilidade – ou de know how para contratar estudos de terceiros. De igual modo, os licenciamentos são dificultosos. Uma opção seria o Procedimento de Manifestação de Interesse (PMI), por meio do qual o particular constrói e apresenta o projeto. Mas, aqui, também se torna aguda a falta de capacitação de alguns parceiros públicos. São dificuldades quase instransponíveis – que, quando enfrentadas por gestores dispostos a assumir os desafios, tendem a esbarrar em posteriores apontamentos por órgãos de controles (e nas consequências daí oriundas). Muito embora a Lei de Geral Concessões Comuns já tenha 22 anos (Lei 8.987/1995) e a Lei de PPP conte com outros 13 (Lei 11.079/2004), fato é que sua aplicação continua a enfrentar desafios.
Assim, muitos projetos morrem antes de nascer e só geram custos públicos e privados, conformando outro problema, a demandar soluções. Razão pela qual, ao que tudo indica, tentativas surgiram neste final de ano: a Lei 13.529/2017 e o Decreto 9.217/2017, publicados no dia 5 de dezembro do corrente.
Em síntese, a Lei 13.529 (oriunda da MP 786/2017), autoriza a União a participar, com até R$ 180 milhões, de fundo que tenha como única finalidade o financiamento de serviços técnicos profissionais especializados voltados à estruturação e ao desenvolvimento de projetos de concessão comuns e PPPs. Tal fundo funcionará sob regime de cotas e será administrado por instituição financeira controlada pela União. Por sua vez, o Decreto 9.217/17 definiu que tal instituição será a Caixa Econômica Federal (CEF), que, em vista de sua abrangência, tende a garantir atendimento a todos os agentes interessados.
A previsão, segundo informações divulgadas pelo Senado Federal, é de que o governo repasse ao fundo, ainda neste ano, R$ 40 milhões, aos quais serão acrescidos R$ 70 milhões em 2018 e outros R$ 70 milhões em 2019. Mas os recursos do fundo tendem a assumir valores ainda mais expressivos, na medida em que seu patrimônio não se restringirá a repasses do erário, mas permitirá integralização de cotas de pessoas de direito público e privado, doações estrangeiras, resultados de aplicações financeiras e outros, alavancando os recursos.
Não só devido aos valores, mas também em razão de sua importância para as políticas públicas, os diplomas exigirão estudo atento. Assim, cabe frisar três pontos centrais desse fundo para financiamento de projetos.
Por um lado, ele não pagará rendimentos aos seus cotistas, disposição que reforça e se harmoniza com seu foco exclusivo na estruturação de projetos (art. 2º, §7º).
Por outro, as atividades orientadas à viabilização de licitação de projetos de concessão comum e PPPs poderão ser contratadas de modo direto (dispensa de licitação) entre entes federativos e instituição financeira, que as desenvolverá com recursos do fundo (art. 5º). Com isso, simplifica-se a etapa de contratação dos estudos e se mitiga o risco de falhas capazes de comprometer o projeto e de incorrer em responsabilização de gestores (não raras vezes bem intencionados, mas mal instruídos).
Por fim, o estatuto do fundo deverá versar sobre “o chamamento público para verificar o interesse dos entes federativos, em regime isolado ou consorciado, em realizar concessões e parcerias público-privadas” (art. 2º, §4º, IV). Tal previsão revela preocupação em organizar a demanda dos entes federados, de modo a possibilitar contratação de estudos que viabilizem, ao mesmo tempo, vários projetos, possibilitando ganhos de escala e redução de custos.
Uma melhor compreensão acerca do fundo dependerá de normativas e diretrizes que ainda ganharão corpo. Contudo, ao que se pode intuir e em linha com o desenho de fundo anteriormente idealizado pela Secretaria de Desenvolvimento da Infraestrutura (e o modelo do BNDES), seu funcionamento perpassará a realização de chamada pública para identificar entes federativos interessados em realizar concessões. Estes contratarão diretamente a instituição financeira que, por sua vez, contará com recursos do fundo para negociar com as empresas que desenvolverão os projetos, coordenando sua elaboração. Finalizados, a instituição financeira os repassará aos entes federativos, para que estes procedam com a licitação. Realizada a licitação e assinado o contrato, os custos com a realização do projeto deverão ser ressarcidos pelo parceiro privado que logrou êxito no certame à instituição financeira, que com esta mediação auferirá lucros e garantirá a sustentabilidade do fundo.
A despeito das críticas à rápida tramitação da MP 786/17, que direcionou as linhas mestras da Lei 13.529/17 e do Decreto 9.217/17, é necessário reconhecer que estas novidades natalinas podem dar resposta a grave problema experimentado por gestores que encontram espaço para concessões comuns e PPPs, mas não dispõem de mecanismos para implementá-los.
A criação do fundo poderá possibilitar o desenvolvimento de expertise em estruturação de projetos, assegurando sua qualidade técnica (em tese, por um menor custo). Demais disso, tende a alavancar recursos destinados à estruturação de projetos e a viabilizar muitas concessões que, de outra forma, não se tornariam realidade. Intensificará, assim, a celebração de contratos entre Administração e parceiros privados, atraindo expressivos e importantes investimentos em infraestrutura e aquecendo a economia. Aguardemos os próximos movimentos.
* Egon Bockmann Moreira é advogado, árbitro e professor de Direito Econômico da UFPR. Rafaella Peçanha Guzela é advogada e administradora de empresas.
Boicote do agro ameaça abastecimento do Carrefour; bares e restaurantes aderem ao protesto
Cidade dos ricos visitada por Elon Musk no Brasil aposta em locações residenciais
Doações dos EUA para o Fundo Amazônia frustram expectativas e afetam política ambiental de Lula
Painéis solares no telhado: distribuidoras recusam conexão de 25% dos novos sistemas
Deixe sua opinião