A notícia de que 159 pessoas foram presas em uma festa no bairro Santa Cruz, Zona Oeste do Rio de Janeiro, ainda é polêmica. De um lado, a Polícia Civil comemorou o que considerou ser um ataque certeiro contra participantes da milícia da região, uma organização armada de criminosos. De outro, parentes e amigos da maioria dessas pessoas pediram a libertação do grupo, apontando que grande parte das pessoas detidas não tinha relações com a milícia, possuía bons antecedentes, sem nenhuma passagem pela polícia.
No último dia 24, duas semanas depois da prisão, o Ministério Público do Rio de Janeiro (MP-RJ) ouviu o apelo das famílias e pediu a revogação da prisão preventiva de 138 pessoas, o que ainda deve ser analisado pela Justiça. Mas, afinal de contas, é crime participar de uma festa com pessoas armadas, consumo de drogas ou outros ilícitos, como o atentado violento ao pudor?
Confira: O presídio sem armas nem algemas que dá certo no Brasil
A realidade é que ninguém poderia ser preso simplesmente por frequentar um ambiente. “A responsabilidade criminal é sempre pessoal”, afirma Bruno Fernandes, professor da Escola de Magistratura do Rio de Janeiro.
Ainda que o visitante esteja em uma festa com pessoas que portem armas ilegalmente, trafiquem drogas ou façam parte de associação criminosa, o vínculo com as atividades ilícitas não é automático. Da mesma maneira, a ausência de carteira assinada não pode servir como prova de ilícito, uma vez que mesmo as estatísticas de emprego reconhecem a existência do trabalho informal.
Antônio Santoro, professor de Direito Penal da Faculdade Nacional de Direito no Rio de Janeiro, também reforça a necessidade de provas para prender alguém. “O crime depende de conduta”, enfatiza.
Para ele, a presença em uma festa suspeita não inverte o ônus da prova, ou seja, não é o acusado que precisa provar sua inocência. Ele também lembra as peculiaridades da capital fluminense.
“Infelizmente, o Rio de Janeiro é um lugar de pessoas armadas. A população já aprendeu a conviver com isso, mas esse cenário não liga ninguém a uma associação criminosa. Se fosse assim, todas as comunidades seriam criminosas”, avalia Antônio Santoro, professor de Direito Penal.
O advogado Breno Melaragno, professor de Direito Penal da Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro (PUC-RJ), explica que ainda que seja provado que um grupo miliciano seja o responsável pela organização do evento, isso não justifica a prisão indiscriminada dos presentes, nem que estejam fazendo apologia à organização criminosa. Para traçar um paralelo carioca, ninguém pode ser preso por frequentar os bailes funk em locais controlados pelo tráfico.
Se a detenção não pode ser determinada pelo lugar que se frequenta, em quais situações a ação policial é legal?
Leia também: Por que Gregório Duvivier ainda não foi preso se ele quer tanto isso?
Uso de drogas
A Lei de Drogas (Lei 11.343/2006) faz uma distinção entre porte para consumo próprio e tráfico, sem especificar os limites de quantidade. Quem for considerado usuário e pego em flagrante não é preso, mas encaminhado para a delegacia, onde deverá assinar um termo circunstanciado em que se compromete a comparecer a uma audiência e é liberado. De acordo com o artigo 28 da lei, o crime só pode ser punido com advertência sobre os efeitos das drogas; prestação de serviços à comunidade; ou medida educativa de comparecimento a programa ou curso educativo.
No caso de drogas permitidas como cerveja, destilados e bebidas alcoólicas em geral, aquele que fizer a venda para menores de 18 anos deverá ser responsabilizado criminalmente.
Brigas e crimes sexuais
Nas redes sociais, não é difícil encontrar relatos de agressões ou abusos cometidos no interior de casas noturnas. Não raras vezes, esses textos relatam a dificuldade de obter auxílio para sair do local, sendo algumas pessoas forçadas a permanecer nele até o pagamento da conta.
Para o professor da Escola de Magistratura, essas situações, muitas vezes contra mulheres, são reflexo do machismo da sociedade e as casas nem sempre estão preparadas para lidar com as situações recorrentes.
Leia também: STF vai analisar crime de ato obsceno em público
Atos que envolvem violência física, como beijos à força e puxadas de cabelo, podem ser enquadrados como estupro, conforme a redação do artigo 213 do Código Penal, alterada em 2009. Ainda, segundo a Súmula 593 do Superior Tribunal de Justiça (STJ) e o artigo 217-A do Código Penal, qualquer relação sexual com menores de 14 anos, ainda que consentida pela vítima, é considerada estupro – o chamado “estupro de vulnerável”.
Pessoas e grupos mais exaltados – baderneiros, briguentos, vândalos, etc. – também podem acabar na delegacia ou na prisão. O que determinará a pena é a gravidade da lesão causada, analisada em cada caso concreto.
Para lesões leves, o procedimento é o mesmo do porte de drogas para consumo próprio e importunação sexual, por serem considerados situações de menor gravidade. A pena pode ser agravada caso a situação envolva mais de três participantes e associada ao crime de rixa, previsto pelo artigo 137 do Código Penal.
Como a eleição de Trump afeta Lula, STF e parceria com a China
Moraes não tem condições de julgar suposto plano golpista, diz Rogério Marinho
Policial federal preso diz que foi cooptado por agente da cúpula da Abin para espionar Lula
Rússia lança pela 1ª vez míssil balístico intercontinental contra a Ucrânia
Deixe sua opinião