Nesta terça-feira (18), cerca de 1.150 procuradores da república votam para compor a lista tríplice da Procuradoria-Geral da República. Organizada a cada dois anos desde 2001, a disputa desta vez conta com um recorde de inscritos: dez nomes disputam a chefia do Ministério Público Federal (MPF). O presidente Jair Bolsonaro (PSL) não é obrigado a escolher entre os nomes, mas desde 2003 todos os PGRs foram escolhidos a partir da lista.
Além de ser a mais concorrida, a disputa é a mais incerta em muitos anos, porque o presidente ainda não se comprometeu a seguir o resultado da lista. Com isso, interlocutores começaram a se movimentar para conseguir a recondução da atual PGR, Raquel Dodge, mesmo não tendo se inscrito para concorrer. O subprocurador-geral Augusto Aras se lançou candidato “fora da lista”.
Entre os candidatos, alguns têm boas chances entre os colegas de carreira, mas têm um perfil que pode dificultar a escolha por Bolsonaro. Outros podem agradar a Bolsonaro e ao entorno, mas talvez não figurem entre os três mais votados. E, depois de vencer na lista e conseguir a indicação, ainda precisam ser aprovados pela maioria do Senado.
O PGR chefia, além do Ministério Público Federal (MPF), o Ministério Público Militar (MPM), Ministério Público do Trabalho (MPT) e Ministério Público do Distrito Federal e Territórios (MPDFT).
São candidatos à lista tríplice, organizada pela Associação Nacional dos Procuradores da República (ANPR), os procuradores regionais Blal Dalloul, José Robalinho Cavalcanti, Vladimir Aras e Lauro Cardoso, e os subprocuradores-gerais Luiza Frischeisen, José Bonifácio de Andrada, Paulo Eduardo Bueno, Antonio Carlos Fonseca Silva, Nívio de Freitas e Mário Bonsaglia.
A Gazeta do Povo entrevistou oito deles. Em ordem alfabética, confira abaixo quem são os candidatos:
Antonio Carlos Fonseca Silva
Subprocurador-geral da República desde 2004, Fonseca ingressou no MPF em 1984 e, antes, atuou na iniciativa privada. Especializado em temas econômicos, coordenou a 3ª Câmara de Coordenação e Revisão (Consumidor e Ordem Econômica) da instituição e, atualmente, é membro da 5ª Câmara de Coordenação e Revisão do Ministério Público Federal (Combate à Corrupção).
Foi conselheiro do Conselho Administrativo de Defesa Econômica (CADE) entre 1996 e 1998. Ph.D. em Direito Econômico, é nascido no estado de Alagoas. De fala truncada, Fonseca aproveita sua experiência no direito empresarial para trazer à campanha o discurso da liderança na iniciativa privada. O candidato não respondeu aos pedidos de entrevista da Gazeta do Povo.
Blal Dalloul
Procurador regional da República desde 2010, Blal (lê-se “Blêu”) Dalloul ingressou na carreira em 1996, mas, antes disso, atuou por 11 anos como servidor do MPF. Foi secretário-geral do MPU na segunda gestão de Rodrigo Janot (2016-2017) e secretário-geral do Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP) entre 2013 e 2016. Nascido no Mato Grosso do Sul, atualmente exerce o ofício criminal na Procuradoria Regional da República da 2ª Região (Rio de Janeiro e Espírito Santo).
Em entrevista à Gazeta do Povo, Blal evitou entrar em bolas divididas e comentar temas em que colegas, exercendo sua função, já tivessem se manifestado, como no o caso da reforma trabalhista. Em outros, preferiu jogar a bola para o Congresso Nacional: foi o caso do aborto e da discussão sobre o Escola sem Partido. As respostas seguiram o perfil afável do candidato, que deu ênfase à necessidade de diálogo e respeito no MPF. Leia a entrevista completa aqui.
José Bonifácio de Andrada
Subprocurador-geral da República desde 2009, José Bonifácio de Andrada integra a carreira desde 1984. Descendente do patriarca da independência, José Bonifácio de Andrada e Silva, e de uma família de parlamentares mineiros, Andrada coordenou, entre 2014 e 2016, a 2ª Câmara de Coordenação e Revisão (Criminal) do MPF, e foi membro do Conselho Superior do MPF de 2014 a 2018. Entre 2016 e 2017, foi vice-procurador-geral da República, indicado pelo titular Rodrigo Janot.
Piadista e bem-humorado, Bonifácio exerceu cargos no Poder Executivo entre 1995 e 2010 nas gestões do PSDB: primeiro no governo federal, depois no governo de Minas Gerais. Em entrevista à Gazeta do Povo, defendeu descentralizar a administração do MPF, dando mais poder às regiões. É a sua versão do mais Brasil, menos Brasília. De perfil conservador, o que poderia agradar as bases de Bolsonaro, o candidato é contra o aborto e o ativismo judicial, mas critica o Escola sem Partido. Pelo perfil, também não deve ter dificuldades no Senado. Leia a entrevista completa aqui.
José Robalinho Cavalcanti
Presidente da ANPR por dois mandatos, entre 2015 e 2019, e vice-presidente da associação entre 2011 e 2015, José Robalinho Cavalcanti é procurador regional da República em Brasília. Antes de ingressar na carreira, em 1999, foi auditor do Tribunal de Contas da União e consultor legislativo da Câmara dos Deputados. De fala articulada e experiência política, Robalinho promete interlocução com os Poderes da República sem descuidar da independência do MPF. Embora quase todos os candidatos venham fazendo críticas a Raquel Dodge, Robalinho foi o que mais se contrapôs à atual PGR durante a campanha.
Em entrevista à Gazeta do Povo, Robalinho, que nasceu em São Paulo mas cresceu em Recife, defendeu as mudanças que sua gestão patrocinou na lista tríplice e rebateu as acusações do atual vice-procurador-geral da República, Luciano Mariz Maia, ligado a Dodge. O candidato também defendeu uma série de mudanças no MPF e fez uma crítica aberta à alíquota progressiva proposta pela reforma da Previdência, que eleva a contribuição previdenciária dos servidores públicos mais bem-remunerados. Leia a entrevista completa aqui.
Lauro Cardoso
Ex-paraquedista do Exército, formando pela Academia das Agulhas Negras (Aman), Lauro Cardoso é procurador regional da República e integra o MPF há 16 anos. Antes disso, foi promotor de Justiça, delegado da Polícia e assessor da ex-ministra Eliana Calmon, do Superior Tribunal de Justiça (STJ), que ficou famosa por suas críticas contundentes à corrupção e ao Judiciário quando era Corregedora-Nacional de Justiça.
Em entrevista à Gazeta do Povo, Cardoso, que tem a experiência administrativa de seis anos à frente da Secretaria-Geral do MPU, durante as gestões de Roberto Gurgel e Rodrigo Janot, propôs uma série de mudanças no MPF para desburocratizar a rotina e aumentar a eficiência dos trabalhos. De voz grave, mas mansa, é contrário à legalização do aborto pelo Judiciário e entende inconstitucional a regra da reforma trabalhista que fixa o valor da indenização por danos morais proporcionalmente ao salário do trabalhador. Leia a entrevista completa aqui.
Luiza Frischeisen
Subprocuradora-geral da República desde 2015, Luiza Frischeisen é a única mulher concorrendo à lista tríplice da PGR este ano. Na carreira desde 1992, Luiza foi conselheira do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) entre 2013 e 2015, e integra o CSMPF desde 2017 – cargo para o qual acaba de ser reeleita, em primeiro lugar, com 575 votos dos colegas. Atualmente coordena também a 2ª Câmara de Coordenação e Revisão (Criminal) do MPF.
De fala rápida, apontada como uma das favoritas, Luiza sempre demonstra um domínio enciclopédico de tudo que ocorre no MPF. Em entrevista à Gazeta do Povo, defendeu que o CNMP deveria seguir o exemplo do CNJ e produzir mais estatísticas sobre o Ministério Público, a fim de aumentar a transparência da carreira. Embora tenha trânsito com a Lava Jato, Luiza é bastante próxima do subprocurador Nicolao Dino. Apresentou sua candidatura um dia após Dino anunciar desistência, e tem uma carreira atuante em temas progressistas, o que pode dificultar o meio de campo com Bolsonaro. Leia a entrevista completa aqui.
Mário Bonsaglia
Subprocurador-geral da República desde 2014, Mário Bonsaglia ingressou no MPF em 1991. Ex-diretor da ANPR entre 1999 e 2001, conselheiro no CNMP entre 2009 e 2013 e membro do CSMPF entre 2014 e 2018, Bonsaglia coordenou a 7ª Câmara de Coordenação e Revisão do MPF (Controle Externo da Atividade Policial e Sistema Prisional) e hoje integra a 6ª Câmara (Populações Indígenas e Comunidades Tradicionais).
Discreto, visto como técnico e independente de grupos no MPF, Bonsaglia figurou como terceiro colocado nas listas tríplices de 2015 e 2017. Procurado pela Gazeta do Povo, afirmou estar “preferindo reduzir ao máximo as entrevistas” e estar “concentrado na campanha interna”. Pela independência e perfil discreto, é visto como uma boa opção para agradar ministros do STF, parlamentares e, ao mesmo tempo, membros da carreira. É um dos nomes fortes para entrar na lista.
Nívio de Freitas
Subprocurador-geral da República desde 2014, Nívio de Freitas integra o MPF desde 1991. Atualmente, coordena a 4ª Câmara de Coordenação e Revisão (Meio Ambiente e Patrimônio Cultural) e é membro do CSMPF. Como é próximo do grupo de Nicolao Dino, muitos nos bastidores especulam que a candidatura de Nívio serve para dividir votos dos adversários e alavancar o nome de Luiza Frischeisen em uma eventual primeira colocação na lista tríplice.
Em entrevista à Gazeta do Povo, Freitas explicou as inovações que vem patrocinando com os colegas na proteção ao meio ambiente, como o sistema Amazônia Protege – modernização que quer estender a todo o MPF. Risonho, Freitas dá respostas curtas em temas como aborto e reforma trabalhista, e dá sinais de ter ressalvas à reforma da Previdência. Leia a entrevista completa aqui.
Paulo Eduardo Bueno
Único que se reconhece como outsider na disputa, Paulo Eduardo Bueno é subprocurador-geral desde 2018 e integra o MPF desde 1982. Antes disso, era advogado de presos políticos durante a ditadura militar e foi diretor da Associação dos Advogados Latino Americanos pela Defesa dos Direitos Humanos. Tranquilo e de prosa fácil, Bueno diz que foi convencido por colegas a concorrer porque sabe “ouvir melhor que ninguém”.
Em entrevista à Gazeta do Povo, Bueno se disse contra a atual interpretação do STF sobre a prisão em segunda instância, a favor da legalização do aborto – embora seja contrário a essa decisão pelo Judiciário –, criticou o Escola sem Partido e defendeu um maior envolvimento da sociedade civil na educação moral de crianças e jovens. Para o subprocurador, a segurança pública é o maior problema do Brasil hoje. Leia a entrevista completa aqui.
Vladimir Aras
Procurador regional da República desde 2014, Vladimir Aras ingressou no MPF em 2003, depois de dez anos como promotor de Justiça na Bahia. Foi secretário de Cooperação Jurídica Internacional da PGR entre 2013 e 2017, durante a gestão de Rodrigo Janot. Nome forte nas bases da carreira, ativo na internet e no Twitter, Aras integrou a força-tarefa do caso Banestado, no Paraná, e desde então tem interlocução com o ministro da Justiça e Segurança Pública, Sergio Moro.
Em entrevista à Gazeta do Povo, Aras, de fala contida e respostas concisas, defendeu mudanças no MPF, como a institucionalização das forças-tarefas, e mudanças na lei e no regimento interno do STF, para dar mais agilidade às ações penais na corte, criticou o ativismo judicial e colocou ressalvas à alíquota progressiva na reforma da Previdência. É um dos nomes fortes para estar na lista, mas os questionamentos crescentes à Lava Jato podem dificultar a aprovação de seu nome no Senado. Leia a entrevista completa aqui.
Partidos iniciam estratégias para eleições presidenciais de 2026 apesar de cenário turbulento
Congressista americana diz que monitora silenciamento da liberdade de expressão pelo STF
Com Milei na presidência do Mercosul em 2025, vitória da esquerda no Uruguai alivia Lula
China vai chegar a 48 mil km de trilhos de trens de alta velocidade, mas boa parte ficará ociosa
Deixe sua opinião