O Judiciário é cheio de liturgias. Faz parte de seu modo de ser o uso da toga para os atos formais. Nos julgamentos, é obrigatório o seu uso pelos magistrados. Mesmo os advogados, para dirigirem-se à Corte, devem usar becas. Enfim, há um protocolo a ser seguido. O símbolo carrega um valor. O ritual é expressão de um valor. Não um fim em si mesmo.
Aquele que enverga a toga representa a Justiça. A ideia abstrata que mora em nosso imaginário coletivo precisa de uma representação humana. A toga faz a transição entre o homem e o ideal. Usar a toga é tomar parte da comunidade daqueles que devem dizer o que é justo.
Essa lembrança é oportuna nesse instante. Há tempos o Supremo Tribunal Federal (STF) tem se notabilizado não só pelos seus julgamentos polêmicos, mas também pelas escaramuças entre seus ministros. Tudo televisionado. Tudo nas redes sociais. Se antes os ministros se permitiam pitadas de ironia, hoje se chegou ao ataque desabrido da pessoa. Há quem goste. O clima de auditório é estimulado. Rapidamente criam-se vencedores e vencidos no imaginário popular. Uns sentem-se vingados; outros, aviltados.
Confira: O bate-boca entre Gilmar Mendes e Barroso
Particularmente, quem perde é a Justiça. Aquela solenidade que se espera se desmancha no altar das vaidades. O uso dos “data venia” e dos “Sua Excelência” são só um tributo que o vício presta à virtude.
Juízes, quando do exercício de seu ofício, não são pessoas comuns. Eles representam a Justiça. Quando emitem juízos de valor envergando a toga, não falam por si, mas sim pelas instituições que representam. As instituições exigem comedimento. Ao se permitirem ir muito além do que recomenda a liturgia do cargo, os que tomam parte nesses bate-bocas depreciam a instituição que representam. E a instituição é maior, tem que ser maior que os indivíduos que a integram. Se os ministros da nossa mais alta Corte se permitem a isso, que há de se esperar dos demais? O caminho é uma espiral de degradação institucional.
É necessário que os ministros respeitem as suas togas e a de seus pares. Se não têm respeito pelo homem que usa a toga, devem ao menos respeito pelo cargo que ele ocupa. Todos são humanos. A cólera é demasiadamente humana. Todavia, é preciso deixar o sentimento de lado e conter-se. Ser Ministro exige a capacidade de sublimar os próprios sentimentos e colocar em primeiro lugar a instituição. A toga representa exatamente isso.
*Bernardo Strobel Guimarães é mestre e doutor em Direito pela USP, advogado e professor da PUCPR.
Deixe sua opinião