Pode até parecer invenção – nesse caso, é história mesmo -, mas o provável processo mais antigo em andamento do Brasil foi ajuizado há mais de 120 anos, por ninguém menos que a princesa Isabel. É que desde 1895 a Família Real briga na Justiça contra a União pelo Palácio Guanabara, atual sede do Governo do Rio de Janeiro e que um dia foi lar da monarca com seu marido, Gastão de Orléans, o Conde d’Eu.
A construção, anterior ao casamento e localizada no bairro de Laranjeiras, zona sul carioca, foi adquirida com o dote da princesa e reformada. O casal, inclusive, comprou terrenos limítrofes que foram anexados à residência. Na época, o local era conhecido como Paço Isabel.
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Ainda que em dezembro de 1889 um decreto tenha banido a Família Real do Brasil, o advogado Dirceu Alves Pinto afirma que a tomada do palácio ocorreu somente durante a Revolta da Armada, que perdurou entre 1893 e 1894. Na ocasião, unidades da Marinha brasileira – que, dizem, estavam amparadas por monarquistas - rebelaram-se contra o governo de Marechal Floriano Peixoto. Segundo o jurista, uma das providências tomadas pelo Ministério da Guerra do então presidente foi a invasão do palácio, “que foi saqueado, inclusive”, guardado na época por um representante da princesa Isabel no Brasil, pois os Bragança estavam exilados na Europa.
Alves Pinto atua em dois processos que envolvem o Palácio Guanabara e os herdeiros da Família Real, representando o Ramo de Petrópolis, descendentes de Dom Pedro de Alcântara de Orléans e Bragança, primogênito da princesa Isabel. Os integrantes do Ramo de Vassouras, herdeiros de Dom Luís Maria Filipe de Orléans e Bragança, também são parte.
A primeira ação, do século XIX, em que Conselheiro Ferreira Viana atuou como advogado da princesa Isabel, foi julgada improcedente em 1897. O juiz responsável era Godofredo Xavier da Cunha, genro de Quintino Bocaiúva. Para quem o nome não passa de logradouro, é preciso lembrar que Bocaiúva foi um dos civis mais importantes no processo de instauração da República no Brasil. Ainda que tenha sido interposto recurso, o processo ficou parado durante muitos anos e foi considerado desaparecido.
Em 1955, os netos da princesa Isabel ajuizaram uma ação reivindicatória. Se a primeira se tratava de uma ação possessória – num jeito simples de falar, pedia somente o direito de uso do palácio –, a segunda trata da propriedade do imóvel. Em primeira instância, a Justiça entendeu pela prescrição, que é a perda da proteção jurídica em relação ao direito pelo decurso do tempo. O já extinto Tribunal Federal de Recursos (TRF), porém, acolheu recurso da Família Real e deu seguimento ao imbróglio.
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Alves Pinto conta que alguns anos depois do ajuizamento da segunda ação, o primeiro processo, lá de 1895, foi encontrado nas entranhas do Supremo Tribunal Federal (STF), arquivado indevidamente, e acabou sendo reaberto. Depois de muitos caminhos percorridos, atualmente ambos aguardam o julgamento de Recurso Especial no Superior Tribunal de Justiça (STJ).
“Depois de cento e tantos anos, não consigo lhe dizer qual é a expectativa [de tempo] para que as ações sejam julgadas”, afirma o advogado, aos risos, emendando que mesmo que os processos estejam muito bem fundamentados, em sua visão, a matéria toda é muito complexa. “Trata-se de uma legislação que vem dos tempos do Império, e os julgadores às vezes têm dificuldade de remontar às leis da época. Tem havido muita controvérsia”, afirma.
Volte ou não a monarquia, como muitos querem, certo é que não se pode afirmar, de fato, quando a situação será resolvida – e quem comandará o país quando isso acontecer. Afinal, são 122 anos de espera.
Colaborou: Mariana Balan.
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